SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A guerra na Faixa de Gaza entrará para os livros de história como um dos capítulos mais horríveis do século 21, afirmou o representante da Palestina, Mahmoud Abbas, nesta quinta-feira (25), durante discurso na Assembleia-Geral da ONU, em Nova York.

“O povo palestino em Gaza encara uma guerra de genocídio, destruição, fome e deslocamento travada pelas forças de ocupação israelenses”, afirmou o líder. “O que Israel está fazendo não é sequer uma agressão. É um crime de guerra e um crime contra a humanidade documentado e monitorado que será lembrado nos livros de história como um dos capítulos mais horríveis do século 21.”

Abbas falou por videoconferência após ter o visto negado pelos Estados Unidos no final de agosto. Como resposta, a Assembleia-Geral da ONU adotou uma resolução na semana passada, aprovada por 145 votos a favor, seis abstenções e cinco votos contra (Israel, Nauru, Palau, Paraguai e EUA) para autorizar o líder a discursar por vídeo.

Washington justificou a medida, criticada por países europeus, afirmando que a AP (Autoridade Palestina) e a OLP (Organização para a Libertação da Palestina), ambas comandadas por Abbas, “contribuíram materialmente para a recusa do Hamas em libertar seus reféns e para o colapso das negociações de cessar-fogo em Gaza”.

“Antes de levá-las a sério como parceiros na paz, a AP e a OLP devem rejeitar completamente o terrorismo e parar de buscar contraproducentemente o reconhecimento unilateral de um estado hipotético”, disse o porta-voz adjunto do Departamento de Estado, Tommy Pigott, na ocasião, aparentemente em referência a nações como França, Austrália, Canadá, Portugal e Reino Unido que reconheceram o Estado da Palestina durante a assembleia.

Nos últimos meses, Abbas tem sido mais incisivo ao falar sobre os ataques do Hamas em 7 de outubro de 2023 no sul de Israel, nos quais o grupo terrorista fez cerca de 250 reféns. Em abril de 2025, por exemplo, o líder disse que a facção “deu desculpas à ocupação criminosa para cometer seus crimes em Gaza, sendo a mais notável a retenção dos reféns”. “Nosso povo está pagando o preço, não Israel. Meus irmãos, entregue-os”, disse ele em Ramallah, sede da Autoridade Palestina na Cisjordânia ocupada.

A decisão dos EUA parece ainda contradizer o Acordo sobre a Sede da ONU, que estabelece os deveres do país anfitrião —entre eles, “não impor quaisquer impedimentos ao trânsito de ou para o distrito da sede” de autoridades estrangeiras, “independentemente das relações existentes” entre os governos dos líderes e os EUA.

Embora a Palestina seja reconhecida por mais de 150 países, o que representa mais de 80% dos Estados-membro da ONU, algumas das nações com mais poder em órgãos internacionais, como os EUA, não tomaram esse passo. Apesar disso, a OLP é reconhecida como observadora nas Nações Unidas e a “única representante legítima do povo palestino” pelo órgão desde 1974, status que foi atualizado em 2012, quando o território passou a ser um Estado observador não membro.

A AP, por sua vez, foi criada nos Acordos de Oslo, firmados entre a OLP e Israel no início da década de 1990, para administrar temporariamente o território ocupado por Israel antes da criação de um Estado palestino independente, o que nunca se concretizou. Controlada pelo Fatah, partido que governa a Cisjordânia, a entidade exclui o Hamas, que governa a Faixa de Gaza desde 2006.

Embora Abbas tenha conseguido discursar no evento, a medida do governo de Donald Trump afetou outros 80 palestinos que poderiam ir ao encontro no momento em que a guerra na Faixa de Gaza passa por um de seus momentos mais críticos.

Há pouco mais de um mês, Israel iniciou uma ofensiva para ocupar a devastada Cidade de Gaza, onde mais da metade da população de mais 2 milhões de pessoas do território vivia antes da guerra e para onde centenas de milhares de deslocados haviam voltando após um cessar-fogo em janeiro.

Até agora, mais de 65 mil palestinos, em sua maioria civis, foram mortos ao longo da guerra, segundo o Ministério da Saúde controlado pelo Hamas —o número, que representa 3% dos mais de 2 milhões dos habitantes de Gaza, é considerado confiável pela ONU. Em setembro, o ex-comandante do Exército de Israel Herzi Halevi confirmou que mais de 200 mil palestinos foram mortos ou feridos desde o início do conflito, o que equivaleria a 10% da população.

Nesta quarta (24), em um evento da Assembleia-Geral, o subsecretário-Geral para Assuntos Humanitários da ONU, Tom Fletcher, criticou o conflito. “Negaram cada grama de humanidade que as regras da guerra foram criadas para preservar. [Os palestinos foram] mortos enquanto dormiam, brincavam, faziam fila para comida e água, buscavam atendimento médico”, afirmou.