SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Morreu Kongjian Yu, importante arquiteto paisagista e urbanista chinês, criador do conceito das cidades-esponja, que prevê a adoção de áreas verdes, como parques arborizados e alagáveis, que deem espaço e tempo para a água ser absorvida pelo solo após as chuvas.

Yu tinha 62 anos e foi uma das vítimas da queda de um avião em Aquidauana, cidade localizada em Mato Grosso do Sul, na região do Pantanal. Ele veio ao país, na semana passada, para uma palestra na abertura da Bienal de Arquitetura de São Paulo, que ocorre no parque Ibirapuera, zona sul da cidade, e onde também estão expostas algumas de suas obras.

Professor da Universidade de Pequim e consultor do governo chinês para projetos em várias cidades, ele defendia que não se podia lutar contra água, então era preciso espaços nas cidades para evitar a devastação com enchentes —indo contra as abordagens tradicionais, de instalação de canos de drenagem, muros de contenção ou de canalização de rios entre diques de concreto. O modelo é visto como uma possível resposta para tragédias como a do Rio Grande do Sul.

Uma das inspirações de Yu foi o fato de ter crescido numa vila na província de Zhejiang, num período próximo ao fim da Revolução Cultural. Na juventude, observou como as gerações mais velhas tinham, nas suas palavras, feito amizade com a água, em vez de combatê-la, com agricultores construindo terraços e lagoas para direcionar e armazenar o excesso de água durante as estações chuvosas.

O programa de implantação das cidades-esponja foi inaugurado oficialmente na China em 2015, a partir de 16 projetos-piloto em cidades pelo país, e depois se expandindo para mais de 600 pontos pela nação.

Com a empresa Turenscape, sediada em Pequim, o chinês supervisionou a construção de diversos parques aquáticos urbanos paisagísticos em sua país. Caso do parque Houtan, que ocupa uma faixa verde de 1,6 quilômetro ao longo do rio Huangpu, em Xangai. Lá, terraços plantados com bambu e gramíneas nativas são divididos por passarelas de madeira entre lagoas e pântanos artificiais —que filtram a água, diminuem o fluxo do rio e ainda funcionam como habitat para diversas espécies de peixes e aves aquáticas.

Em 2023, porém, após Pequim enfrentar uma das maiores chuvas em 140 anos, o modelo foi posto em dúvida, dado que espaços supostamente projetados com os mesmos princípios também sofreram com os impactos naturais.

Caso, por exemplo, do aeroporto de Daxing, com amplo terreno úmido, lago artificial, valas e telhados verdes. O propósito, como no projeto todo, era absorver a água da chuva como uma esponja. Não aconteceu porque, antes de mais nada, choveu acima do teto previsto.

À época, questionado pela Folha de S.Paulo, Yu defendeu que as autoridades chinesas continuassem a usar a técnica e rebateu as críticas dizendo que a implantação estava só no começo na capital. Afirmou que “a campanha de cidades-esponja da China se provou muito bem-sucedida”, citando o exemplo de Sanya, na província de Hainan. “Situada na região das monções, costumava sofrer terríveis inundações urbanas e agora é festejada.”

Na visão do arquiteto, seria possível implementar o conceito de cidades-esponja em municípios gaúchos, já que a topografia local não parece tão complicada. Numa outra visita ao Brasil, sugeriu ainda ao país a elaboração de planos para saber o que pode ser “cedido” para a água no futuro.