BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Copom (Comitê de Política Monetária) disse ter dado início a uma nova fase de sua estratégia, após uma “firme” elevação dos juros, com a taxa básica (Selic) estacionada em 15% ao ano, mostrou ata divulgada pelo Banco Central nesta terça-feira (23).

À frente, prometeu examinar os impactos acumulados da política de juros para avaliar se o plano de conservar a Selic no atual patamar por tempo “bastante prolongado” será suficiente para levar a inflação à meta. Na última quarta-feira (17), o Copom manteve a taxa básica em 15% ao ano pela segunda vez seguida.

“Após uma firme elevação de juros, o Comitê optou por interromper o ciclo e avaliar os impactos acumulados”, afirmou na ata.

“Agora, na medida em o cenário tem se delineado conforme esperado, o Comitê inicia um novo estágio em que opta por manter a taxa inalterada e seguir avaliando se, mantido o nível corrente por período bastante prolongado, tal estratégia será suficiente para a convergência da inflação à meta”, acrescentou.

O objetivo central perseguido pelo Banco Central é de 3%. No modelo de meta contínua, o alvo é considerado descumprido quando a inflação acumulada permanece por seis meses seguidos fora do intervalo de tolerância, que vai de 1,5% (piso) a 4,5% (teto).

Devido aos efeitos defasados da política de juros sobre a economia, o comitê tem hoje na mira a inflação do primeiro trimestre de 2027 –projetada em 3,4% (acima do centro da meta). O próximo encontro está agendado para os dias 4 e 5 de novembro.

Segundo avaliação predominante do colegiado do BC, persiste maior incerteza no cenário externo e, consequentemente, o Copom deve manter a cautela. O comitê chamou a atenção para o início do ciclo de corte de juros pelo Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA) em 0,25 ponto percentual, para o intervalo entre 4% e 4,25% ao ano, e para o ritmo de crescimento norte-americano.

Por outro lado, reconheceu que persistem dúvidas sobre o impacto das tarifas impostas pelo governo de Donald Trump sobre a inflação norte-americana. “De todo modo, os riscos de longo prazo, que inclusive contribuem para tornar o cenário incerto, como a introdução de tarifas e a elevação de gastos fiscais, se mantêm presentes”, disse.

No documento, voltou a dizer que terá como foco os reflexos do cenário externo sobre a inflação doméstica à frente. No debate, mencionou a apreciação do câmbio, relacionada ao diferencial de juros e à depreciação da moeda norte-americana frente a diversas divisas. No último encontro, a cotação do dólar usada pelo Copom em suas projeções foi de R$ 5,40. Em julho, considerou R$ 5,55.

No ambiente doméstico, o colegiado do BC disse ver “moderação gradual” da atividade econômica, “certa diminuição” da inflação corrente e “alguma redução” nas expectativas dos agentes econômicos –tema de desconforto para todos os membros do colegiado.

Ao avaliar o comportamento da atividade econômica, afirmou que os dados mostram uma redução gradual do crescimento econômico e que, até agora, estímulos fiscais ou de crédito não provocaram divergências relevantes em relação ao cenário que o BC esperava.

“O comitê avalia que, apesar dos sinais mistos, os sinais advindos da demanda e da atividade econômica até aqui sugerem que o cenário se desenrola conforme esperado e compatível com a política monetária em curso”, afirmou.

Na ata, reconheceu que o mercado de crédito tem apresentado moderação “mais nítida” do que o mercado de trabalho, com menor volume de concessões.

“Nota-se maior arrefecimento no consumo de bens mais ligados ao crédito em contraposição a bens de consumo mais ligados à renda. Outro exemplo do mercado de crédito é o maior arrefecimento no crédito de maior duração em contraposição ao crédito emergencial”, disse.

Também reforçou a necessidade de esfriar a demanda como parte de seu trabalho para manter a inflação sob controle. Um dos fatores adversos para o equilíbrio dos preços, segundo o comitê, é a permanência das expectativas acima da meta em todo o horizonte de tempo.

Apesar do desconforto, disse observar um “incipiente movimento de queda”, mas ainda concentrado no curto prazo, pela combinação de elementos como os juros altos e os dados mais recentes de inflação.

“O comitê avalia que a reancoragem das expectativas de inflação [convergência à meta] reduz os custos da desinflação e entende que tal processo exige perseverança, firmeza e serenidade”, disse.

Quanto à trajetória da inflação corrente, afirmou ver uma dinâmica mais favorável em comparação ao que previa no início do ano. Citou que o real mais forte e as cotações das commodities mais baixas contribuíram para redução nos preços de bens industrializados e alimentos. No entanto, ponderou que a inflação de serviços segue mais resiliente.

“Os núcleos de inflação têm se mantido acima do valor compatível com o atingimento da meta há meses, corroborando a interpretação de uma inflação pressionada pela demanda e que requer uma política monetária contracionista [que desestimule a economia] por um período bastante prolongado”, reforçou.

Com relação à trajetória das contas públicas, repetiu a mensagem transmitida encontro anterior, em julho, sobre os impactos de curto prazo e os efeitos estruturais quanto à percepção sobre a sustentabilidade da dívida. Reiterou que uma política fiscal que “contribua para a redução do prêmio de risco [rentabilidade adicional cobrada pelos investidores no Brasil] favorece a convergência da inflação à meta.”

“O comitê manteve a firme convicção de que as políticas devem ser previsíveis, críveis e anticíclicas [contrárias ao ciclo econômico]. Em particular, o debate do comitê evidenciou, novamente, a necessidade de políticas fiscal e monetária harmoniosas”, reafirmou.

Para Marco Caruso, economista do Santander, o Copom reconheceu avanços do cenário doméstico, como a perda de fôlego da atividade, mas tomando o devido cuidado para não soar tão otimista. “São as primeiras batalhas sendo vencidas pelo banqueiro central”, disse.

Mas, na visão dele, o tom utilizado pelo colegiado do BC não sugere cortes de juros ainda este ano. Caruso ressaltou que o comitê falou sobre o início de uma nova fase e reforçou o desejo de manter a Selic parada por período bastante prolongado, o que minimizou a possibilidade de queda da taxa básica em dezembro.

Por ora, o economista mantém a expectativa de flexibilização dos juros a partir de janeiro. Essa projeção, contudo, pode mudar em função de uma possível reavaliação do hiato do produto [diferença entre o crescimento potencial da economia e o efetivo] e seus desdobramentos na inflação no próximo relatório de política monetária, que será divulgado pelo BC nesta quinta-feira (25).

Outro que vê o ciclo de cortes de juros como “bastante improvável” neste ano é Caio Megale, economista-chefe da XP. Para ele, há maior chance de um início tardio de alívio, a partir de março de 2026, do que em dezembro.

“O cenário de melhora inflacionária deve se consolidar à frente, permitindo uma política monetária menos restritiva no ano que vem. Continuamos a projetar um ciclo gradual de corte de juros a partir de janeiro”, disse, em nota.

Em relatório, o Itaú Unibanco ressaltou que ata do Copom trouxe atualizações, com tom geral positivo, na avaliação do cenário e do processo de desinflação.

“Em termos líquidos, acreditamos que o documento pende, se alguma coisa, para o lado mais brando. Mas não o suficiente para mudarmos nossa projeção de que o ciclo de afrouxamento começará apenas em janeiro de 2026”, afirmou.