BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O promotor do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado de São Paulo) do Ministério Público de São Paulo Lincoln Gakiya disse nesta terça-feira (23) que São Paulo não fez a lição de casa e precisa fazer a mea culpa pelo crescimento e exportação do PCC (Primeiro Comando da Capital) para fora do estado.

Na avaliação dele, esse crescimento surgiu pela ausência do Estado e a negação da realidade, ou seja, a falta de reconhecimento da dimensão e da importância que o PCC estava ganhando.

O resultado dessa negligência foi que uma pequena facção prisional, surgida em 1993, cresceu de forma desordenada, tornou-se uma das maiores organizações criminosas do mundo e se espalhou por todo o Brasil, América do Sul e outros 28 países.

Dessa forma, ele avaliou que São Paulo não fez a “lição de casa” e que a responsabilidade é compartilhada, incluindo também o Ministério Público de São Paulo, que atua em conjunto com as forças de segurança.

“O Estado de São Paulo não fez sua lição de casa. Inclusive quando faço essas colocações incluo o Ministério Público de São Paulo porque atuamos em conjunto com as forças de segurança. O Estado de São Paulo falhou. Produzimos desde 1993, o surgimento e crescimento de uma grande organização criminosa, que hoje se espalhou por todos Estados do país, toda América do Sul e 28 países pelo mundo.

A declaração foi dada em audiência na Câmara dos Deputados para discutir a PEC da Segurança. Na ocasião, ele criticou parte do texto que aumenta a atribuição da Polícia Federal.

“O Estado de São Paulo precisa realmente fazer sua mea culpa, porque exportamos essa facção para os demais estados do Brasil e nós, de certa maneira, ajudamos a criar a primeira máfia do Brasil. O problema já está instalado.”

O texto da PEC prevê que a PF possa apurar infrações penais contra a ordem política e social, investigar organizações criminosas e milícias privadas em casos de repercussão interestadual ou internacional.

O promotor se posicionou contrário à ideia de atribuir exclusivamente à Polícia Federal o combate a organizações criminosas interestaduais e transnacionais, milícias e crimes de repercussão nacional.

Ele argumenta que a redação da proposta não deixa claro que essa seria uma atribuição concorrente, ou seja, compartilhada com as polícias judiciárias dos estados e com o Ministério Público.

Gakiya ainda alerta para o risco de que, com essa nova redação, advogados poderiam argumentar nos tribunais que qualquer investigação contra facções como o PCC ou o Comando Vermelho seria de competência exclusiva da Polícia Federal, o que poderia anular o trabalho de outras forças de segurança.

Ele ressalta a importância de todos os artigos da legislação, afirmando que “o diabo mora nos detalhes”.

“A Polícia Federal, com cerca de 13 mil policiais, não teria capacidade de assumir sozinha o combate a um fenômeno tão amplo, em comparação com os mais de 700 mil policiais estaduais e guardas-civis metropolitanas disponíveis no país”, disse

A solução, na avaliação do promotor, não é centralizar a responsabilidade em uma única força, mas promover a integração e a cooperação. Ele afirma que as grandes operações de sucesso já comprovaram que a única forma de atuar eficazmente é de maneira integrada e em multiagências.

Nesse modelo, a Polícia Federal atuaria em conjunto com a Polícia Rodoviária Federal, a Receita Federal, as secretarias da fazenda estaduais e os Ministérios Públicos, em um ambiente horizontal onde não há sobreposição das polícias.

Ele disse que a Agência Antimáfia, que estava sendo pensada dentro do projeto Antimáfia do Ministério da Justiça e Segurança Pública, seria uma alternativa eficaz para o combate ao crime organizado em comparação com os modelos atuais.

Apesar de defender a proposta, mencionou que foi “voto vencido” sobre o tema, que saiu da versão final do projeto que tramita dentro do Ministério da Justiça e Segurança Pública. O tema acabou suprimido do texto após pressão da Polícia Federal.

Na sua avaliação, a proposta não seria criar outra força policial, mas teria função de coordenar os trabalhos entre as diversas instituições de segurança e fiscalização, e não estar hierarquicamente acima delas.

A agência promoveria a atuação conjunta e integrada de diversas instituições que são importantes para o combate ao crime organizado, como a Polícia Federal, a Polícia Rodoviária Federal, a Receita Federal, Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), as secretarias da Fazenda e os ministérios públicos.