SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Dois estudos divulgados na última semana afirmam que a Petrobras precisará adotar grandes mudanças em sua forma de operação nos próximos anos para que o Brasil possa alcançar as metas de redução de gases do efeito estufa.
As análises se baseiam na projeção da Agência Internacional de Energia de que a demanda global por petróleo cairá a partir de 2030, em vista da implementação do Acordo de Paris. A queima de combustíveis fósseis é a maior causadora do aquecimento global e outra pesquisa recente associou a atividade de petroleiras, incluindo a brasileira, à ocorrência de ondas de calor.
Os pesquisadores Carlos Eduardo Young e Helder Queiroz Pinto, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), avaliam que a Petrobras deve ser reformulada para desenvolver atividades neutras em carbono, como o combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês). As organizações que fazem parte do Observatório do Clima vão além e afirmam que a estratégia de futuro da petroleira está descolada dos objetivos de descarbonizar a economia brasileira.
Em nota, a empresa afirma que aumenta os investimentos na transição energética, com US$ 16,3 bilhões (R$ 86,4 bilhões) destinados a projetos de baixo carbono em seu plano 2025-2029, e que reduziu suas emissões em 40% de 2015 a 2024, de 78 milhões de toneladas de carbono equivalente para 47 milhões de toneladas.
“A Petrobras, bem como todas as empresas de petróleo e gás natural, face aos imperativos advindos da crise climática, necessita adequar suas estratégias empresariais, especialmente no que concerne aos projetos e posicionamentos de longo prazo”, dizem os especialistas da UFRJ.
Eles reconhecem que as mudanças devem ser feita de modo gradual, sem prejudicar a sustentabilidade financeira da empresa, e afirmam ser necessário se afastar do petróleo e trabalhar com fontes limpas, como SAF, hidrogênio, biogás e biometano, além de investimentos em soluções ainda não maduras, como o sequestro e o armazenamento de carbono .
Para tudo isso se concretizar, os pesquisadores argumentam que o Estado brasileiro precisa definir diretrizes claras para reduzir a demanda por combustíveis fósseis.
“A Petrobras, e o setor de petróleo e gás natural como um todo, não podem ser considerados como meros instrumentos de solução para o problema macroeconômico que abarca a questão fiscal no país”, afirmam.
“Não obstante a importância dos recursos financeiros arrecadados com royalties, impostos e demais participações governamentais, é importante recordar o risco associado à dependência das administrações públicas (federal, estaduais e municipais), posto que a atividade petrolífera é caracterizada pela extração de recursos esgotáveis e cujos preços são extremamente voláteis.”
O perigo, segundo os especialistas, é a empresa ficar com ativos encalhados conforme o mundo fizer a transição para longe do petróleo.
“A alocação crescente de recursos em investimentos para extração destinada ao mercado externo aumenta a exposição ao risco de estouro da bolha de carbono: caso ocorra a retração na demanda global de combustíveis fósseis, conforme os países reiteradamente repetem em cada COP da UNFCCC [as conferências de clima das Nações Unidas], a demanda global será declinante, e não crescente”, afirmam.
O Observatório do Clima diz que não faz sentido econômico a Petrobras continuar com os investimentos em novas refinarias ou planejar a exploração de novas fronteiras de exploração, como em três das bacias da margem equatorial, incluindo a da Foz do Amazonas, e em Pelotas (RS).
As organizações afirmam que a empresa precisa rever suas prioridades de futuro e alinhar o modelo de negócio ao Acordo de Paris, à estratégia nacional de mitigação definida no Plano Clima e à meta de redução de emissões do Brasil, conhecida como NDC (contribuição nacionalmente determinada).
“A companhia deve, para isso, expandir seu portfólio de investimentos para que o petróleo e gás sejam parte cada vez menor do negócio e não o único foco”, dizem.
A Petrobras afirma que tem uma carteira preparada para as rotas da transição energética e destina US$ 5,7 bilhões para fontes energéticas de baixo carbono, como eólica, solar e hidrogênio.
Outro ponto abordado no estudo da UFRJ é a geração de empregos. Conforme dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), as ocupações na extração de petróleo foram reduzidas em cerca de 10% entre 2010 e 2021, apesar do volume extraído ter quase dobrado no mesmo período, passando de 1,6 para 2,9 milhões de barris por dia.
Os pesquisadores simularam o que aconteceria com os postos de trabalho a cada milhão de dólares acrescentado no valor da demanda em três setores: extração de petróleo e gás; refino e fabricação de biocombustíveis.
Os cálculos mostram que a expansão na demanda por biocombustíveis gera 48,9 ocupações por milhão adicional, o triplo da expansão esperada de empregos no refino de petróleo (16).
“Isso demonstra que a transição energética para combustíveis renováveis é também mais justa, tanto
pela expansão do emprego quanto pela melhoria da distribuição funcional da renda”, dizem.