SÃO PAULO, SP E BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Brasil registrou pela primeira vez na história mais alunos em cursos de graduação a distância do que na modalidade presencial. Dos 10,22 milhões de estudantes do ensino superior no país, 5,18 milhões estavam matriculados no EAD em 2024 -50,75% do total.

Mais de 95% dos alunos matriculados em cursos a distância estudam em faculdades particulares.

Os dados são do Censo do Ensino Superior 2024 e foram divulgados na tarde desta segunda-feira (22) pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), órgão do MEC (Ministério da Educação).

Desde 2020 o Brasil já tem mais estudantes ingressando em cursos a distância do que em graduações presenciais, mas é a primeira vez que isso ocorre também no total de matriculados do ensino superior.

Mais de dois terços dos ingressantes no ensino superior (67%) foram para cursos EAD em 2024, o que representa mais de 3,34 milhões de novos alunos. Já as graduações presenciais receberam 1,66 milhões de novas matrículas (33%).

Desde 2014, o número de ingressantes em cursos presenciais diminuiu 30%. Naquele ano, essa modalidade registrou 2,38 milhões de novas matrículas, ou seja, com 720 mil alunos a mais do que em 2024.

Já os cursos a distância tiveram um aumento de 360% no número de ingressantes. Em 2024, eles receberam 727 mil novos alunos.

Segundo Carlos Moreno, diretor de estatísticas educacionais do Inep, o EAD tem levado ao encolhimento de cursos presenciais noturnos. Em 2014, as graduações com aulas à noite tinham mais de 4 milhões de estudantes. Em 2024, elas tinham apenas 2,7 milhões -uma queda de 33,2%.

“Os estudantes estão preferindo estudar no ensino a distância do que frequentar os cursos presenciais noturnos”, comentou Moreno.

O Inep destacou também que, de forma inédita, o país ultrapassou a marca de 10 milhões de estudantes no ensino superior. São 10,22 milhões de matrículas.

Apesar de a modalidade a distância já dominar o ensino superior, o avanço do crescimento do EAD tende a diminuir nos próximos anos. Entre 2023 e 2024, as matrículas nesses cursos cresceram 5,6% -uma desaceleração ao que registrou entre 2022 e 2023, quando cresceram 13,4%.

Além da estabilidade natural no período pós-pandemia, a desaceleração acontece após o Ministério da Educação anunciar uma série de medidas para a modalidade na tentativa de melhorar a qualidade e a regulação desses cursos.

A expansão dos cursos a distância favoreceu sobretudo os grandes grupos educacionais. Segundo os dados do Censo, quatro estados concentram 88% das instituições que oferecem EAD: Paraná, São Paulo, Santa Catarina e Rio de Janeiro.

Em maio deste ano, o governo Lula (PT) assinou um decreto em que limita a oferta do ensino online em graduações da área da saúde e licenciatura, que tiveram o maior aumento de matrícula nos últimos anos. O MEC defende que as mudanças buscam garantir melhor qualidade na formação de profissões que exigem aprendizado prático, como enfermeiros e professores.

O decreto cria uma nova modalidade de cursos, os semipresenciais, elenca cursos vetados para a EAD e também revê limites de atividades remotas nos cursos presenciais.

Também foi vetada a oferta de cursos EAD em medicina, direito, odontologia, enfermagem e psicologia. Demais cursos de saúde e licenciaturas só poderão ser oferecidos nos formatos presencial ou semipresencial.

Manuel Palácios, presidente do Inep, disse que a forte expansão das matrículas em cursos EAD ajudou o país a continuar ampliando o acesso ao ensino superior. “Não se trata de atribuir qualquer tipo de malefício à modalidade em si”, declarou. “Penso que o próprio sistema já estava aguardando que novas normas iriam atingi-lo”, disse.

Em razão das novas regras, os donos de faculdades particulares (principais responsáveis pela oferta do EAD) temem perder novos alunos nos próximos anos. A Abmes (Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior) afirmou nesta segunda-feira que a modalidade “pode ter atingido o seu pico de expansão”.

“Desde 2022, a modalidade não registra aumento expressivo no número de ingressantes e convive com índices de evasão elevados ano após ano”, diz nota da associação.

Rodrigo Capelato, diretor do Semesp (Sindicato das Entidades Mantenedoras de Ensino Superior), avalia que o EAD deve sofrer uma estabilização nos próximos anos. Para ele, esse é um movimento natural de saturação do mercado.

“Quem procura o EAD, em geral, é um público mais velho, com mais de 30 anos, que não teve a chance de estudar assim que terminou a escola. Essas pessoas já trabalham, têm filhos e, por isso, precisam de cursos com maior liberdade de tempo para estudar. Havia uma demanda reprimida desse grupo, que agora foi atendida e houve uma saturação”, diz.

As duas entidades avaliam que, apesar de as novas regras do MEC encarecerem a oferta dos cursos por causa da modalidade semipresencial, pode haver um novo fôlego de crescimento. “Nesse cenário, o modelo semipresencial surge como alternativa estratégica para reaquecer a entrada de novos estudantes e diversificar a oferta”, diz a Abmes.

Os cursos de graduação a distância surgiram no país nos anos 2000, mas a expansão dessa modalidade explodiu a partir de 2018. Um decreto do governo Michel Temer (MDB), que flexibilizou a aberturas de polos de educação a distância, foi uma das principais mudanças que permitiram esse aumento.

O decreto, que atendeu a um pedido dos donos de faculdades particulares, deu autonomia às instituições de ensino para a criação de novos polos, eliminando a exigência de uma visita e análise do MEC para a abertura.

No ano seguinte a essa mudança, houve a maior expansão de novos cursos da modalidade. Eles passaram de 3.177, em 2018, para 4.529, em 2019, um aumento de 43%. Até 2024, o crescimento foi de 256%, chegando a oferta de 11.297 cursos EAD no país.