SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Nos dias 27 e 28 de fevereiro do ano que vem, a Faap (Fundação Armando Alvares Penteado) vai receber um festival de filmes feitos com inteligência artificial. Mais do que uma mostra audiovisual, a proposta é reunir ali discussões sobre os limites criativos, estéticos e éticos do uso da IA nas produções cinematográficas.
A competição reúne filmes e roteiros criados com ferramentas de IA, exibindo obras selecionadas. A programação inclui workshops, mesas e palestras com especialistas em cinema, marketing e direito autoral, além de espaços de networking criativo para aproximar artistas, programadores, produtores e pensadores.
Carlos “Cebola” Guedes, produtor executivo da Ultravioleta, fez um acordo para representar aqui o Waiff World AI Film Festival, que teve sua primeira edição no ano passado, em Nice, na França. Ele procurava modelos para criar algo similar no Brasil. “Dos festivais que eu vi na época, achei esse o mais estruturado.”
Cebola se juntou a Tadeu Jungle, diretor, roteirista, poeta visual e videoartista, muito conhecido como apresentador de programas de TV e internet. Além de aproximar Cebola e o pessoal da Faap, viabilizando o espaço físico para o Waiff Brasil, Jungle conduz um videocast, já em produção, que servirá como preparação ao festival.
Para a dupla, o evento pode colaborar para mitigar o medo que tem dominado as conversas de profissionais do audiovisual, receosos de perderem suas atividades diante de ferramentas de IA.
“Eu tenho uma filha de 21 anos que está fazendo animação, e ela acha que o mundo vai acabar”, afirma Cebola. Ela diz que vai desistir, “porque esse negócio de animação vai ser tudo com IA”. Ele diz olhar para o lado e ver gente com medo.
Jungle teoriza sobre isso e fala sobre um possível aumento na produção de filmes pequenos, com 100% de IA. “Vai perder o emprego? Num primeiro momento, sim, talvez. Mas posso pensar num garoto em Imperatriz do Maranhão oferecendo a um dono de açougue um filme publicitário de 30 segundos, todo com IA, por R$ 1.000. Pequenas produções podem ser feitas para clientes que hoje não têm a menor condição de ter acesso a isso.”
Para Jungle, este é o momento de quem é cineasta ou fotógrafo entrar na inteligência artificial para saber se ela pode ajudar nesse processo. Por isso, os organizadores apostam muito nos oito episódios do videocast Waiff Talks, que devem começar a ser disponibilizados a partir do fim deste mês, até dezembro.
Em cada episódio, Jungle conversa com um especialista em IA e um professor da Faap. Na estreia, os convidados foram Humberto Neiva, coordenador do curso de cinema da instituição, e Janaína Augustin, consultora na área de audiovisual e inovação, especializada em IA aplicada à produção criativa.
Num tema muito apropriado ao Waiff, Janaína comentou sobre o cinema tradicional, aquele de tela grande e que foi ganhando efeitos especiais no transcorrer da história. Ela não acredita que a IA vai tomar conta desse cinema. Prevê intervenções, que devem dar mais liberdade aos criadores que já fazem filmes hoje.
“Se o cara quiser que tudo fique rosa ou que sapos chovam do céu, é só fazer”, diz Jungle. “Fellini iria adorar, com certeza”, diz Cebola.
O festival será lançado oficialmente no dia 29 de setembro, com abertura de inscrições. A competição reúne curtas de cinco a dez minutos, longas acima de 25 minutos, categorias de animação, ação, drama, fantasia, documentário, publicidade e mídia social esses filmados na vertical, para celular. E será premiado também o melhor filme do festival, independente da categoria.
O Waiff Brasil terá cinco jurados. Além de Jungle, fazem parte Paulo Aguiar, criador do CR_IA, plataforma de educação e consultoria em IA generativa; o cineasta Heitor Dhalia, diretor de obras como o longa “O Cheiro do Ralo” e a série “DNA do Crime”; Fabiano Gullane, produtor e sócio da distribuidora Gullane Filmes, com forte presença em festivais como Cannes e Veneza; e Lyara Oliveira, presidente da Spcine, empresa da Prefeitura de São Paulo com foco no desenvolvimento do audiovisual.
Depois do sucesso da estreia do evento neste ano, os franceses vão montar no próximo ano a segunda edição, mas antes, nos meses que a antecedem, serão realizadas as versões licenciadas em outros países. Além do Brasil, Japão, China e Coreia do Sul estão preparando seus eventos. No contrato inicial com produtores do Waiff, cada festival só deve exibir filmes produzidos em seu país.
Cebola Guedes aguarda ansioso a resposta a ser dada pelas inscrições. “Quando o festival foi lançado na França, eles esperavam 4.000 inscrições. E tiveram 16 mil. Sendo muito honesto, eu não tenho ideia de quantas inscrições a gente vai ter.”
“Eu acho que um dos objetivos do festival é mostrar os filmes que as pessoas estão fazendo com IA”, afirma Jungle. “Mas tem também painéis e debates a respeito de todo esse cenário. Vamos falar sobre ética, sobre mercado de trabalho e, sim, vamos falar sobre o medo.”