SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O líder da Coreia do norte, Kim Jong-un, disse que estaria aberto a futuras conversas com os Estados Unidos se Washington abandonasse a exigência de que o país asiático renuncie às armas nucleares, mas afirmou que nunca abriria mão de seu arsenal para acabar com as sanções.

“Pessoalmente, ainda tenho boas lembranças do presidente dos EUA, [Donald] Trump”, afirmou o ditador em um discurso na Assembleia neste domingo (21), segundo a agência de notícias estatal, a KCNA. Os dois líderes se encontraram três vezes durante o primeiro mandato do republicano antes de o processo de diálogo colapsar em 2019.

“Se os EUA descartarem sua obsessão delirante com a desnuclearização, aceitarem a realidade e realmente desejarem a coexistência pacífica conosco, então não há razão para que não possamos nos reunir”, disse Kim, ainda de acordo com a agência.

A Coreia do Norte está sob sanções da ONU e embargos de armas desde seu primeiro teste nuclear, em 2006. Embora as punições tenham reduzido o financiamento de Pyongyang para o desenvolvimento militar, a nação continuou avançando na construção de armas nucleares e poderosos mísseis balísticos.

“O mundo já sabe bem o que os EUA fazem depois de obrigar um país a renunciar às suas armas nucleares e se desarmar”, afirmou, em uma possível referência ao ex-líder da Líbia, Muammar Gaddafi, cujo regime caiu em 2011 em uma revolta popular apoiada pela Otan, a aliança militar ocidental. “Nunca abandonaremos nossas armas nucleares.”

O preço dessa decisão, as sanções contra Pyongyang, foi “uma experiência de aprendizado”, segundo Kim, e ajudou o país a “se fortalecer e desenvolver uma capacidade de resistência que não pode ser esmagada por nenhuma pressão”.

Trump planeja visitar a cidade de Gyeongju, na Coreia do Sul, em novembro para o fórum da Apec (Assembléia de Cooperação Econômica Ásia-Pacífico) .”O momento das declarações, pouco antes da visita de Trump (…) parece calculado”, afirmou Lim Eul-chul, professora da Universidade Kyungnam. “Sugere a possibilidade de uma cúpula surpresa.”

De acordo com Rachel Minyoung Lee, especialista em Coreia do Norte do Centro Stimson, com sede nos EUA, é a primeira vez que Kim menciona Trump pelo nome desde a posse do americano, em janeiro. “Isso é uma abertura”, disse ela. “É um convite de Kim para Trump repensar a política dos EUA sobre desnuclearização.”

Os comentários ocorrem ainda no momento em que um novo governo progressista na Coreia do Sul, liderado por Lee Jae-myung, tenta reduzir as tensões na península e pede que Trump reabra o canal de diálogo com Kim. Apesar dos esforços, o ditador afirmou que “não há razão para se reunir com a Coreia do Sul”.

Em uma entrevista recente à agência de notícias Reuters, Lee afirmou que a Coreia do Norte estava construindo de 15 a 20 bombas nucleares por ano e que qualquer acordo que freasse essa produção seria um passo importante para eventualmente desmantelar o programa por completo.

“Com base nisso, podemos prosseguir para negociações de médio prazo para redução de armas nucleares e, a longo prazo, uma vez que a confiança mútua seja restaurada e as preocupações de segurança do regime da Coreia do Norte sejam reduzidas, podemos buscar a desnuclearização”, disse ele. “A realidade é que a abordagem anterior de sanções e pressão não resolveu o problema; piorou.”]

Kim rejeitou categoricamente qualquer plano gradual, dizendo que as recentes aberturas de Washington e Seul para o diálogo eram falsas porque a intenção fundamental desses países era enfraquecer o Norte.

O presidente da Coreia do Sul também instou o homólogo americano a tentar se encontrar com Kim durante a visita a Gyeongju. Para Rachel Minyoung Lee, do Centro Stimson, os recentes comentários do ditador parecem tentar bloquear o envolvimento do Sul.

“Talvez [Kim] queira se antecipar ao governo Lee e dissuadir o governo Trump de cooperar com Seul, reiterando que a Coreia do Sul é um país separado e, portanto, não pode ser parte da questão nuclear norte-coreana”, disse ela.