RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Manifestantes de esquerda ocupam na tarde deste domingo (21) o mesmo pedaço da praia de Copacabana que recebe atos em defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para protestar contra o Congresso Nacional, após a votação da PEC da Blindagem e da urgência para o projeto da anistia na Câmara dos Deputados.

As frentes de esquerda do Rio, acostumadas a convocar manifestações no centro da cidade, especialmente na Cinelândia, esperam público maior do que as duas últimas mobilizações bolsonaristas.

O ato em Copacabana ocupou ao menos três quarteirões da avenida Atlântica. Parlamentares de esquerda como o deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ) e a deputada federal Jandira Feghali (PC do B-RJ) discursaram contra a PEC da Blindagem e contra a anistia aos envolvidos no ataque aos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023.

Também discursaram representantes de movimentos sociais como Ubes (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas) e Une (União Nacional dos Estudantes).

Misturado entre camisas vermelhas e amarelas, tentativa do campo progressista de ressignificar o uniforme da seleção brasileira, o público do ato começou a ocupar vagões de metrô a partir das 12h.

Com gritos de “sem anistia”, o público ouviu os discursos enquanto aguardava as presenças de Chico Buarque, Caetano Veloso e Gilberto Gil, entre outros artistas. A organização disponibilizou um carro de som para os discursos e um trio elétrico para o ato musical.

Pelo menos três pessoas que estavam perto da grade passaram mal e foram socorridas por membros da organização.

Dois bonecos infláveis que representam o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) chamavam atenção do público.

Por volta das 15h, um dos organizadores do ato disse que a manifestação estava perto de alcançar 100 mil pessoas. A Polícia Militar do Rio, contudo, não tem por hábito contabilizar público em manifestações de rua.

As apresentações musicais começaram por volta das 16h30, quando a cantora Maria Gadu subiu ao trio e cantou “Como nossos pais”. Dira Paes, Carol Castro, João Vicente de Castro e outros artistas cantaram e dançaram “Brasil”, interpretada por Marina Sena.

Um dos mais aguardados, Caetano Veloso também puxou coro de “sem anistia” dos manifestantes. “O povo elegeu Lula, por isso a democracia no Brasil resiste”, disse Caetano, antes de cantar “Desde que o samba é samba”.

Foi também na avenida Atlântica, altura do posto 5, que bolsonaristas fizeram a última manifestação do dia 7 de Setembro, durante julgamento da trama golpista no STF (Supremo Tribunal Federal).

Um mês antes, a mobilização do dia de 3 de agosto foi marcada pela ligação do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) para o pai, Jair, que saudou o público presente na praia pelo telefone. O uso das redes para comunicação com apoiadores havia sido proibido e a saudação resultou, no dia seguinte, em ordem de prisão domiciliar expedida pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF.

Foi também em Copacabana o ato do dia 7 de setembro de 2022, em que Bolsonaro, então presidente da República, elevou o tom nos ataques contra o STF e ameaçou ruptura democrática.

O ato deste domingo foi convocado por movimentos sociais de esquerda e ganhou maior tração no Rio, após o anúncio das presenças de Chico Buarque, Caetano Veloso e Gilberto Gil, o que transformou o evento em ato musical e fez estourar a bolha da mobilização política.

Ivan Lins, Paulinho da Viola, Lenine, Geraldo Azevedo, Jorge Vercillo, Maria Gadu, Pretinho da Serrinha, Zé Ibarra, Marina Sena e o conjunto Os Garotin também confirmaram presença em Copacabana.

Outros artistas se mobilizaram para participar em protestos pelo país. Chico César confirmou presença em Brasília, Marina Lima em São Paulo, Daniela Mercury em Salvador e Simone em Maceió.

Outro ato ocorreu em Copacabana neste domingo: a caminhada pela diversidade religiosa, que teve concentração pela manhã e ainda acontecia às 13h30, pouco antes da hora marcada para o ato político.

Parte das ruas do bairro foi fechada para carros por conta dos atos. As pistas da avenida Atlântica já são abertas ao público tradicionalmente aos domingos.

O acesso de moradores, hóspedes de hotéis e banhistas às ruas interditadas gerou confusão. Em uma delas, uma família com uma criança de colo discutiu com funcionários de controle de acesso.

A mobilização contra a PEC da Blindagem e a anistia aos envolvidos no 8 de Janeiro foi marcada para acontecer em ao menos 33 cidades pelo país, incluindo 22 capitais, e foi chamada às pressas pelas frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular, ligadas ao PSOL e ao PT e que reúnem movimentos como o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e o MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto).

A ideia dos protestos neste domingo é marcar posição contra a Câmara dos Deputados, especialmente parlamentares bolsonaristas e representantes do centrão.

A PEC da Blindagem, aprovada na Câmara na terça-feira (16), permite ao Congresso barrar processos criminais no STF (Supremo Tribunal Federal) contra deputados e senadores e prisões de parlamentares.

O texto agora segue para o Senado, onde precisa ser aprovado também em dois turnos para ser promulgado e entrar em vigor, não cabendo sanção ou veto presidencial.

O texto recebeu apoio maciço dos partidos do centrão, do PL de Jair Bolsonaro, e também votos favoráveis de uma minoria entre os deputados do PT.

Hoje, deputados e senadores só podem ser presos em flagrante por crime considerado grave e sem direito a fiança, como racismo, estupro ou crime contra o Estado democrático de Direito.

Eles podem ser processados criminalmente sem autorização do Congresso, e esses processos correm diretamente no STF, desde que tenham relação com o mandato e com a função política do parlamentar.

A PEC estabelece que o aval para processar criminalmente um congressista será dado pela Casa em que ele exerce mandato —Câmara ou Senado. A votação terá de ser feita em até 90 dias a partir da ordem do STF sobre o processo.

Também está na mira dos manifestantes a tramitação em regime de urgência, aprovada pelo Congresso, do projeto de anistia aos crimes cometidos entre as eleições de 2022 e o 8 de janeiro de 2023.

O relator da proposta, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), pretende mudar o foco da discussão para uma redução de penas.