SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As restrições impostas pelo governo de Donald Trump ao ministro Alexandre Padilha (Saúde) para participar da Assembleia-Geral das Nações, em Nova York, são semelhantes às que atingem delegações de ao menos outros sete países, incluindo Irã, Rússia, Venezuela, Síria, Cuba, China e Coreia do Norte.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, o ministro de Lula (PT) desistiu de viajar.
Um relatório elaborado por um comitê da ONU que supervisiona a relação entre os EUA e esses países reúne uma série de denúncias feitas pelas delegações, como discriminação, atrasos na emissão de vistos, restrições de circulação e problemas de logística.
É a primeira vez que o Brasil é afetado por uma restrição do tipo, que ocorre em meio a uma série de sanções impostas por Trump por causa do julgamento de Jair Bolsonaro (PL). Os EUA decidiram limitar a movimentação de Padilha e familiares que o acompanharem.
Segundo o relatório da ONU, datado de outubro de 2024, a delegação venezuelana relatou que, mesmo enviando pedidos com antecedência, os vistos só são liberados poucos dias antes do evento, o que gera custos adicionais de viagem e hospedagem.
“Os vistos eram aprovados e emitidos apenas em uma pequena janela de tempo antes do início das reuniões oficiais”, afirma o documento. Membros da missão do país latino-americano também têm restrições de locomoção no país.
A Rússia parece ser uma das delegações mais afetadas. O relatório cita que ao menos dois diplomatas de alto escalão tiveram seus vistos negados, e que mais de cem membros de sua missão e seus respectivos familiares aguardaram meses em alguns casos, dois anos pela renovação de vistos.
“Em média, o processo [de renovar o documento] levava mais de cinco meses, sendo que alguns casos demoravam mais de dois anos. Ele [representante russo] também disse que havia, no total, 118 pessoas aguardando a prorrogação dos vistos, impossibilitadas de viajar para a Federação Russa, inclusive por motivos humanitários, ou de convidar seus familiares para Nova York”, diz o texto.
A delegação russa também enfrenta limitações de circulação e não pode sair de um raio de cerca de 40 quilômetros da sede da ONU. Em fevereiro do ano passado, os EUA exigiram a saída de um funcionário alegando que ele “estaria supostamente envolvido em atividades incompatíveis” com o seu cargo.
A decisão de entrada e permanência de estrangeiros nos Estados Unidos é prerrogativa exclusiva do governo americano. No caso das Nações Unidas, existe um acordo internacional que, em tese, obriga os EUA a autorizarem a permanência em Nova York de autoridades que participem de atividades na ONU.
Datado de 1947, o tratado estabelece que os EUA não podem impor restrições de trânsito no distrito da ONU para agentes e membros da organização, especialistas que estejam em missão na entidade e outras pessoas convidadas.
O dossiê da ONU aponta também que membros da delegação da Síria receberam vistos de entrada única de seis meses, apesar de seus mandatos durarem quatro anos. Assim como os russos, e agora Padilha e sua família, eles também têm restrições de deslocamento.
A delegação do país do Oriente Médio citou o caso de um funcionário que não pôde comparecer ao funeral de seu pai na Síria devido a problemas na renovação do visto. “Ele enfatizou a natureza discriminatória de tais restrições”, completa o documento.
Cuba e China também denunciam problemas com emissão de visto e restrição de circulação. Para os diplomatas da ilha do Caribe, há ainda a exigência de que eles apenas podem usar o Aeroporto JFK para entrar e sair dos Estados Unidos.
A delegação do Irã ainda denuncia um episódio, ocorrido em setembro de 2023, em que membros do alto escalão do regime teriam sido “submetidos a uma revista secundária intrusiva, incluindo uma humilhante revista corporal”, no aeroporto de Nova York. Os diplomatas iranianos também relatam demora na aprovação dos vistos.
O comitê conclui o relatório pedindo que os EUA removam as restrições de viagens impostas, agilizem a emissão de vistos e assegurem o respeito às imunidades diplomáticas previstas no direito internacional. Em casos de violações, a ONU diz que o país sede deve investigá-las.
A Coreia do Norte não aparece no relatório, mas enviados de Pyongyang não têm permissão de se afastar da ilha de Manhattan o que significa que a restrição de circulação imposta a Padilha é maior.
Os EUA decidiram limitar a movimentação do ministro e familiares que o acompanharem a cinco blocos do local de hospedagem do ministro, além das rotas entre o hotel, o distrito em que fica localizada a sede da ONU, a missão do Brasil junto à organização e a residência do representante brasileiro na organização.