RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – O Brasil tinha 1,65 milhão de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos em situação de trabalho infantil em 2024.

É o equivalente a 4,3% da população total da mesma faixa etária, segundo dados divulgados nesta sexta (19) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

As estimativas sinalizam um leve aumento ante 2023, quando os números haviam registrado os menores níveis da série histórica (1,62 milhão e 4,2% do total).

Os dados integram um módulo da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua). O tema começou a ser investigado em 2016.

O contingente em situação de trabalho infantil teve acréscimo de 34 mil pessoas (+2,1%) na passagem de 2023 para 2024.

Enquanto isso, a população total de 5 a 17 anos teve redução de 213 mil (-0,6%) no mesmo período, conforme a estimativa da Pnad.

Apesar do leve aumento do trabalho infantil, o IBGE evita falar em uma reversão da tendência de queda observada na comparação com o começo da série.

Em 2016, a população de 5 a 17 anos em trabalho infantil era de 2,1 milhões, o equivalente a 5,2% do total da mesma faixa etária. Esses foram os maiores níveis já registrados na pesquisa.

“Está cedo para afirmar se é uma reversão de tendência. Pode indicar uma certa estabilidade, um leve aumento, nesse último ano”, disse Gustavo Geaquinto Fontes, analista do IBGE.

Como a Folha de S.Paulo mostrou, estudos sugerem que há subnotificação quando a pesquisa sobre trabalho infantil é feita com adultos.

Um levantamento da Equidade.info, iniciativa vinculada ao Lemann Center (na Universidade de Stanford, nos Estados Unidos), indicou que o percentual de crianças e adolescentes matriculados na escola e que dizem estar também engajados em atividades de trabalho no Brasil era de 39,4% em maio do ano passado.

O QUE É TRABALHO INFANTIL?

Nem todas as tarefas exercidas por jovens são consideradas trabalho infantil. Na Pnad, o IBGE cita definição da OIT (Organização Internacional do Trabalho).

Segundo esse conceito, o trabalho infantil é aquele perigoso e prejudicial para a saúde e o desenvolvimento mental, físico, social ou moral das crianças e dos adolescentes, interferindo na escolarização.

O IBGE leva em consideração diferenças de faixas etárias, frequência escolar e número de horas, entre outras, para estimar os resultados.

O instituto aponta que, segundo a legislação brasileira, o trabalho é proibido até os 13 anos.

De 14 a 15, é permitido apenas na condição de aprendiz. De 16 a 17 anos, é autorizado com carteira assinada, sendo vedadas atividades insalubres, perigosas e em horário noturno.

Conforme a Pnad, um contingente de 1,96 milhão de jovens realizava alguma atividade econômica ou de autoconsumo em 2024. Desse grupo, a parcela de 1,65 milhão estava em trabalho infantil.

MENINOS REGISTRAM ALTA

O IBGE não detalhou o que poderia explicar o leve avanço ante 2023, mas chamou a atenção para os dados de sexo e idade.

Conforme a Pnad, o número de meninos de 5 a 17 anos em trabalho infantil subiu 5,4%, para quase 1,1 milhão em 2024. Eles são 66% do total.

Já o número de meninas na mesma situação recuou 3,9%, para 561 mil em 2024. Elas respondem por 34% do total.

Quando o recorte considera a idade, o predomínio é dos adolescentes mais velhos.

O número de jovens de 16 e 17 anos em trabalho infantil avançou 1,4%, passando para 915 mil em 2024. Eles representam mais da metade do total nessa condição (55,5%).

Em seguida, aparecem 372 mil crianças e adolescentes de 5 a 13 anos (22,5%) e 363 mil jovens de 14 e 15 anos (22%).

O grupamento de atividades econômicas que inclui o comércio tinha a maior parcela da população de 5 a 17 anos em trabalho infantil em 2024: 30,2%.

Outras atividades (22,7%) e agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura (19,2%) vieram na sequência.

PIORES FORMAS ATINGEM MÍNIMA

A pesquisa do IBGE também traz dados sobre a chamada Lista TIP, que considera as piores formas de trabalho infantil, com mais riscos para as crianças. Fazem parte atividades como operação de máquinas agrícolas, produção de itens como fumo e cana-de-açúcar, construção civil e pesada, manuseio de produtos químicos, entre outras.

O contingente de 5 a 17 anos na Lista TIP foi estimado em 560 mil em 2024. O número mostrou nova redução, atingindo o menor patamar da série. A baixa foi de 5,1% ante 2023 (590 mil).

Ou seja, embora o contingente total em trabalho infantil tenha avançado em 2024, aquele inserido nas funções consideradas mais perigosas manteve o movimento de queda.

Dos 560 mil jovens na Lista TIP, 61,7% estavam em atividades não-agrícolas. Os outros 38,3% exerciam funções agrícolas.

O IBGE, porém, não detalhou o número de jovens em cada uma das atividades que compõem esses dois grandes grupos.

NORDESTE E SUL MOSTRAM CRESCIMENTO

De 2023 para 2024, as regiões Sul e Nordeste tiveram as maiores altas, em termos proporcionais, na quantidade de crianças e adolescentes em trabalho infantil. As variações foram de 13,6% e 7,3%, respectivamente.

O Norte, por outro lado, teve a queda mais intensa (-12,1%). Também houve leve recuo no Sudeste (-0,6%), enquanto o Centro-Oeste mostrou avanço (3,4%).

O Nordeste tem o maior contingente de moradores em trabalho infantil: 547 mil. O número, contudo, caiu 27,1% em relação a 2016.

Nessa comparação com o ano inicial da série, só o Centro-Oeste mostrou alta, estimada em 7%. O contingente local, entretanto, é o menor do país (153 mil).

PRETOS OU PARDOS SÃO MAIORIA

Do total de crianças e adolescentes em trabalho infantil, uma parcela de 66% era formada por pretos ou pardos em 2024. O percentual supera o registrado pelo mesmo grupo na população total de 5 a 17 anos (59,7%).

Os brancos, por sua vez, são 32,8% do contingente em trabalho infantil. É uma proporção menor do que a registrada na população de 5 a 17 anos (39,4%).

PROBLEMA ATINGE 5,2% EM LARES COM BOLSA FAMÍLIA

Em 2024, o trabalho infantil era uma realidade para 5,2% das crianças e dos adolescentes em lares atendidos pelo Bolsa Família.

É um patamar 0,9 ponto percentual acima do registrado na população total de 5 a 17 anos (4,3%). Essa diferença, contudo, diminuiu ao longo da série.

Em 2016, o trabalho infantil atingia 7,3% das crianças e dos adolescentes em lares com Bolsa Família. A proporção ficava 2,1 pontos percentuais acima da observada na população total de 5 a 17 anos à época (5,2%).

QUADRO AFASTA ADOLESCENTES DA ESCOLA

Um das questões associadas ao trabalho infantil é a ameaça aos estudos. Os dados do IBGE sinalizam que esse risco aumenta com a idade.

Em 2024, o percentual de estudantes foi de apenas 81,8% entre os jovens de 16 e 17 anos em trabalho infantil.

O patamar ficou 8,7 pontos percentuais abaixo do registrado na população total da mesma faixa etária (90,5%).

*

Crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil

Na população de 5 a 17 anos, em %

2016 — 5,2%

2017 — 4,9%

2018 — 4,9%

2019 — 4,5%

2022 — 4,9%

2023 — 4,2%

2024 — 4,3%

Fonte: IBGE

*Não houve pesquisa em 2020 e 2021 devido à pandemia de Covid-19

Crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil

Na população de 5 a 17 anos, em milhões

2016 — 2,1

2017 — 1,94

2018 — 1,91

2019 — 1,77

2022 — 1,90

2023 — 1,62

2024 — 1,65

Fonte: IBGE

*Não houve pesquisa em 2020 e 2021 devido à pandemia de Covid-19

Crianças e adolescentes nas piores formas de trabalho infantil

De 5 a 17 anos, em milhares

2016 — 919

2017 — 762

2018 — 763

2019 — 707

2022 — 763

2023 — 590

2024 — 560

Fonte: IBGE

*Não houve pesquisa em 2020 e 2021 devido à pandemia de Covid-19