BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O STF (Supremo Tribunal Federal) estabeleceu que planos de saúde devem cobrir procedimentos fora do rol da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) desde que tenham prescrição médica e eficácia e segurança comprovada e autorização pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

Além disso, o tratamento não pode ter sido negado pela ANS, ter a análise pendente ou uma abordagem alternativa para a condição. Assim, a corte fixou mais filtros para o oferecimento de serviços pelas operadoras.

A decisão foi tomada nesta quinta-feira (18) no julgamento sobre trechos da lei de 2022 que obriga planos de saúde a arcarem com tratamentos fora da lista de referência da ANS.

A discussão afeta milhões de usuários de planos. A lista da ANS estabelece a cobertura assistencial mínima a ser garantida pelos planos privados. É chamada de Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde.

De acordo com a decisão, ainda, procedimentos não previstos não podem, como regra geral, ser concedidos por ordem judicial.

As decisões da Justiça sobre o tema ficam condicionadas à comprovação de pedido e negativa da operadora de saúde, com demora ou omissão da na autorização do tratamento não incorporado ao rol da ANS. Ainda, quando houver o deferimento judicial do pedido, a ANS deverá ser oficiada para avaliar a possibilidade de inclusão do tratamento no rol de cobertura obrigatória.

O julgamento foi concluído com maioria de sete votos, na linha proposta pelo relator, ministro Luís Roberto Barroso. Ele foi acompanhado por Kassio Nunes Marques, Cristiano Zanin, André Mendonça, Luiz Fux, Dias Toffoli e Gilmar Mendes.

O ministro Flávio Dino abriu a divergência, formada também por Luiz Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Cármen Lúcia.

O relator defendeu a adoção de critérios por entender que o texto atual permite uma margem ampla de definição, ignorando a metodologia de avaliação de tecnologias em saúde e de medicina baseada em evidências que orienta a atuação da ANS na definição do rol de procedimentos.

Barroso afirmou que pretendeu, com o voto, apresentar uma proposta ponderada entre a necessidade do beneficiário e que se vê em momento de vulnerabilidade assim como garantir a previsibilidade sobre o que a cobertura desses contratos pode englobar.

“Não cabe ao juízo substituir a função regulatória da ANS. O Judiciário não pode se transformar na porta de entrada de demandas de saúde”, disse o relator.

Zanin afirmou, ao votar, a questão é sobre temas da iniciativa privada e a Constituição Federal prevê o caráter complementar ao sistema de saúde. “Diz a Constituição que esse caráter deve seguir as diretrizes do SUS. Não me parece adequado que a iniciativa privada tenha talvez obrigações mais amplas que a pública”, disse o ministro.

Da mesma forma entendeu o ministro André Mendonça. “O atendimento dos requisitos para a prestação desses serviços demanda uma destinação mais clara do que é obrigação do serviço público e do que é do privado”, disse.

A corrente minoritária entendeu, por outro lado, a legislação questionada constitucional. Para os ministros que ficaram vencidos, a regulamentação técnica dos serviços oferecidos pelos planos de saúde é insubstituível, e a alteração na lei foi uma opção legislativa legítima.

A análise do caso começou em abril, quando a corte ouviu apenas as sustentações orais, ou seja, as defesas das partes e interessados no tema. A ação foi apresentada pela Unidas (União Nacional das Instituições de Autogestão Em Saúde), que representa operadores de saúde sem fins lucrativos.

A entidade pedia a derrubada de parte da lei de 2022 que reconheceu a cobertura para tratamentos não previstos na lista da ANS, responsável por regular o setor, desde que sua eficácia seja comprovada cientificamente.

A prescrição também tem de obedecer às recomendações da Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde) ou de órgãos de avaliação de tecnologias em saúde de renome internacional.

A lei questionada foi aprovada pelo Congresso Nacional como reação a uma decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça), que meses antes tinha desobrigado operadoras de custear procedimentos não incluídos na lista. A primeira versão da lista foi editada em 1998 e, desde então, é atualizada periodicamente para incorporar novas tecnologias em saúde.

Até 2022, a Justiça vinha sendo, por mais de duas décadas, favorável a pacientes, a partir de demandas individuais levadas a diferentes instâncias contra negativas de atendimento.

No STJ, prevaleceu o entendimento de que o modelo mais restrito, o taxativo, protege os beneficiários dos planos de aumentos excessivos uma vez que a segurança jurídica dada às operadoras evita o repasse de custos adicionais.

Ao menos outras três ações foram apresentadas ao Supremo sobre o tema, mas sobre normas anteriores a 2022. Todas foram arquivadas em novembro daquele ano.

Nas ações, o Podemos, a Rede Sustentabilidade e o PDT (Partido Democrático Trabalhista) questionavam trechos das Leis 9.961/2000 e 9.656/1998 e da Resolução Normativa 465/2021 da ANS e pediam a declaração de inconstitucionalidade de qualquer limitação à cobertura dos planos de saúde.