BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – As investigações da Operação Rejeito, deflagrada nesta quarta-feira (17) pela Polícia Federal, apontam que o suposto pagamento de propina ao diretor da ANM (Agência Nacional de Mineração) Caio Mário Trivellato Seabra Filho teria contado com a intermediação do escritório Queiroga, Vieira, Queiroz e Ramos Advocacia, conhecido como QVQR Advogados.
Segundo as apurações, “há indícios concretos de que o provável pagamento de propina se deu por intermédio de contrato firmado entre a Aiga e o escritório Queiroga, Vieira, Queiroz & Ramos Advocacia”.
Procurado pela reportagem, o escritório declarou que não tem nenhum vínculo com o diretor.
Segundo o inquérito, a empresa Aiga Mineração, que é atendida pelo QVQR, tinha o objetivo de mudar uma regra dentro da ANM, a resolução nº 85/2021, de forma que a Aiga pudesse explorar rejeitos minerais fora da área onde tinha direito de minerar. Essa mudança, de acordo com as investigações, iria prejudicar diretamente a Vale, detentora da titularidade da área e com prioridade sobre esses rejeitos.
Para conseguir essa vantagem, segundo a Polícia Federal e o Ministério Público Federal, a Aiga teria cooptado diretores da ANM, usando o escritório Queiroga, Vieira, Queiroz & Ramos Advocacia como intermediário.
De acordo com o inquérito, o QVQR Advogados foi usado para formalizar um contrato de honorários que, na prática, servia para justificar o pagamento de R$ 2,7 milhões em propina. O destinatário final desta cifra seria Caio Mário Trivellato Seabra Filho. A Folha de S.Paulo tentou contato com Trivellato, mas não obteve retorno.
O contrato previa R$ 300 mil de pró-labore (um valor fixo, pago aos advogados), mais R$ 2,7 milhões de “êxito”. Esse êxito, no entanto, não estaria ligado a um processo judicial, como costuma ocorrer em contratos de advocacia. Ele estava condicionado, conforme a investigação, a uma decisão da própria ANM, ou seja, ao voto dos diretores no processo que interessava à Aiga.
No dia 4 de novembro, o diretor da ANM Guilherme Santana apresentou voto favorável à Aiga Mineração, contrariando pareceres técnicos da própria ANM e inclusive da Procuradoria Federal especializada. Caio Trivellato acompanhou o mesmo posicionamento. Na sequência, pediu vista do processo, manobra que, segundo a investigação, tinha como objetivo assegurar os interesses da organização criminosa, mantendo-se em contatos intensos com seus membros até a retomada do julgamento em 22 de novembro de 2024.
Em contatos frequentes com os líderes da organização, Trivellato tratava um desses líderes, João Alberto, como “chefe”, conforme a investigação.
Em 21 de novembro de 2024, véspera da sessão da diretoria da ANM, foi feita a transferência de R$ 300 mil da Aiga para o escritório. O repasse de R$ 2,7 milhões não se efetivou porque havia uma ordem para que o pagamento somente fosse realizado se a decisão partisse do colégio de diretores.
Alan Cavalcante, que aparece como um dos líderes da suposta organização criminosa, é apontado como o responsável por articular contatos, intermediar valores e elaborar os documentos para dar aparência de legalidade às transações.
Segundo a investigação, Cavalcante chegou a fazer alterações no contrato firmado com o escritório, “para que o pagamento somente fosse realizado se a decisão partisse do colégio de diretores”.
Alan Cavalcante encaminhou ao grupo “Três Amigos Mineração” a minuta de contrato entre a Aiga e o escritório.
Por meio de sua assessoria, o QVQR Advogados declarou que não tem nenhum vínculo com o diretor Trivellato e que sua citação no âmbito da apuração se dá pelo fato de ser a banca contratada pela empresa Aiga Mineração para atuação profissional em processos administrativos e judiciais, recebendo exclusivamente os valores devidos a título de honorários advocatícios.
“É importante destacar que o escritório possui mais de 15 anos de atuação em processos de grande relevância em todo o país e que os advogados estão legalmente habilitados e substabelecidos para atuar em favor de seus clientes”, afirmou.
“O QVQR Advogados reafirma seu compromisso em oferecer todo o suporte necessário às demandas do Poder Judiciário e ressalta a importância de se preservar o exercício regular da advocacia contra questionamentos indevidos.”
Segundo o QVQR, “o valor de R$ 2,7 milhões referente a pagamento de êxito advocatício nunca foi recebido pelo escritório” e o caso não foi decidido no âmbito administrativo da ANM. “Hoje, se encontra em análise em um processo judicial, no qual a Aiga é representada pelo QVQR advocacia e que tramita perante o Tribunal Regional Federal da 6ª Região”, declarou.
“Estamos preparando petição a ser apresentada ao juízo competente para esclarecimento das contradições presentes na investigação, como no caso dos valores de êxito que não foram recebidos pelo escritório, assim como das omissões das legais habilitações e atuações contratuais do escritório, especialmente nos processos judiciais”, afirmou o escritório.
Além de Trivellato, também foi preso um ex-diretor da própria Polícia Federal que atuou na cúpula da corporação no governo Lula (PT). O grupo teria obtido lucro de R$ 1,5 bilhão, além de ter projetos em andamento com potencial econômico superior a R$ 18 bilhões. A Operação Rejeito tem o apoio do Ministério Público Federal e da Receita Federal.