SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Já tem data marcada: Odete Roitman morrerá no dia 6 de outubro. Mas sua morte deve frustrar o público. Uma pesquisa do Datafolha realizada na semana passada em todo o país mostra que, embora a maioria dos espectadores acredite que a vilã de “Vale Tudo” deva ser punida, apenas 4% querem vê-la ser assassinada. O castigo mais desejado é a pobreza (47%), seguido da prisão ( 35%).
A percepção do público agora é diferente da que foi registrada por uma pesquisa do mesmo instituto, ainda que restrita à cidade de São Paulo, em 1988, ano em que a versão original da novela, escrita por Gilberto Braga, foi exibida. À época, eram 38% os que queriam assistir à morte da vilã, papel que era de Beatriz Segall e agora é de Debora Bloch.
Os pesquisadores foram às ruas nos dias 8 e 9 de setembro e entrevistaram 2.005 pessoas com mais de 16 anos em 113 municípios distribuídos entre as cinco regiões do país. A margem de erro da pesquisa é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.
O Datafolha estima que um em cada três brasileiros esteja assistindo ao folhetim, no ar desde o fim de março na faixa das nove na TV Globo, e o público tem a predominância de mulheres, das classes “D” e “E” e de pretos.
A maioria (65%) caracteriza o remake como ótimo ou bom, 25% o vê como regular e 8% como ruim ou péssimo. Para a maior parte dos espectadores, aliás, a versão original não é um grau de comparação, já que 72% não teve contato com a novela de 1988. E, mesmo entre os 25% que a assistiram, metade viu apenas trechos da obra, que está disponível no Globoplay e tem reexibições no Globoplay Novelas –o antigo Viva, canal da emissora dedicado a reprises na televisão a cabo.
O destino da heroína da trama, Raquel Acioli, algo que tem causado celeuma nas últimas semanas, também foi alvo de perguntas dos pesquisadores, e os resultados mostram um distanciamento entre os espectadores que comentam a novela nas redes sociais e o público encontrado nas ruas.
É que Raquel, interpretada por Taís Araujo, vive uma inconstância no remake. De origem pobre, ela rivaliza com a filha, Maria de Fátima, e aposta que é possível se dar bem no Brasil sendo honesta. Desde o início da trama, diz que vai crescer com fruto apenas de seu trabalho como cozinheira.
Na versão original, Raquel, que era vivida por Regina Duarte, começa vendendo sanduíches na praia e enriquece ao se tornar a dona de uma rede de restaurantes. No remake, ela seguiu um caminho parecido até o mês passado, quando de repente levou uma rasteira e voltou à estaca zero.
A surpresa desagradou o público nas redes sociais -embora a opinião popular na internet seja difícil de ser aferida, as críticas foram suficientes para acender uma luz vermelha de preocupação nos corredores dos Estúdios Globo e levar até a questionamentos sobre a presença de negros nos bastidores da novela.
Essa parcela do público viu racismo no fato de Raquel, agora uma mulher negra, ter de voltar a lutar por sua sobrevivência. A crítica na internet encontrou eco na voz de Taís Araújo, que também se voltou contra os rumos da narrativa em entrevistas que concedeu nas últimas semanas.
Mas nas ruas a percepção é outra. Embora a maioria queira ver Raquel triunfar e enriquecer, predominam também aqueles que caracterizam as mudanças de sua trajetória exibidas até agora como positivas, sob a justificativa de que elas acrescentam surpresas e torna a trama atraente.
Essa parcela do público é três vezes maior do que os que veem os novos acontecimentos como algo negativo e avaliam que eles não condizem com o rumo da personagem. Isso sem contar os 7% que dizem não se importar com nada disso e os 12% que nem souberam responder à pergunta.
A posição que cada personagem ocupa na sociedade, aliás, é um tema caro para os espectadores de “Vale Tudo”, que se tornou um dos maiores clássicos da teledramaturgia nacional ao escancarar as mazelas do Brasil pouco após o fim da ditadura militar.
Embora a autora do remake, Manuela Dias, tenha afirmado desde antes da estreia que a novela seja sobre a briga de uma mãe e uma filha, e não sobre o país, para 38% do público a realidade brasileira, a crise e a política são os temas mais importantes da trama, seguido por tópicos relacionados, como a honestidade e a dedicação ao trabalho (26%) e a corrupção, o suborno e as chantagens praticadas por personagens como Odete Roitman (24%).