BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central decidiu nesta quarta-feira (17), por unanimidade, manter a taxa básica de juros (Selic) em 15% ao ano pela segunda vez seguida e repetiu a intenção de conservar o juro alto por tempo “bastante prolongado”.

O ciclo de alta foi interrompido no encontro anterior, em julho, com a Selic estacionada em seu maior nível observado em 19 anos. Naquela ocasião, o colegiado do BC foi cauteloso ao antecipar os próximos passos, falando em “continuação na interrupção do ciclo” na reunião de setembro.

Dessa vez, demonstrou mais confiança na estratégia. Ao mesmo tempo, indicou não ter pressa em iniciar a discussão sobre cortes da Selic.

No comunicado, o comitê disse que seguirá vigilante, avaliando se a manutenção da taxa no nível atual por período “bastante prolongado” será suficiente para assegurar a convergência da inflação à meta. Afirmou também que o atual cenário, “marcado por elevada incerteza”, exige cautela na condução da política de juros.

O colegiado do BC reafirmou que as expectativas de inflação seguem distantes da meta e as projeções, elevadas. Disse também que a atividade econômica se mostra resiliente e que o mercado de trabalho continua exercendo pressão sobre os preços.

A decisão tomada nesta quarta correspondeu à visão consensual do mercado financeiro. Levantamento feito pela Bloomberg mostrava que a manutenção dos juros no atual patamar de 15% ao ano era a expectativa unânime das 36 instituições consultadas.

Ao longo do ciclo de alta de juros, que durou de setembro de 2024 a junho deste ano, a taxa básica acumulou elevação de 4,5 pontos percentuais -de 10,5% a 15% ao ano. Nesse processo, que atravessou a transição de comando do BC, foram sete aumentos ao todo.

A Selic começou a subir na gestão de Roberto Campos Neto, cujo mandato terminou em 31 de dezembro de 2024, e seguiu em alta sob a atual administração do BC, comandada por Gabriel Galípolo -indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Nas últimas semanas, o cenário econômico evoluiu da maneira esperada pelo BC, que trabalha para levar a inflação em direção à meta. O objetivo central perseguido pelo Banco Central é de 3%. No modelo de meta contínua, o alvo é considerado descumprido quando a inflação acumulada permanece por seis meses seguidos fora do intervalo de tolerância, que vai de 1,5% (piso) a 4,5% (teto).

Devido aos efeitos defasados da política de juros sobre a economia, o comitê tem hoje a inflação do primeiro trimestre de 2027 na mira.

No cenário de referência do Copom, a projeção de inflação para este ano caiu ligeiramente, de 4,9% para 4,8%, enquanto a estimativa para 2026 se manteve em 3,6%. Para o 1º trimestre de 2027, o dado permaneceu em 3,4% (acima do centro da meta).

O primeiro estouro da inflação no novo formato ocorreu em junho. Dois meses depois, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) teve a primeira deflação (recuo) em um ano com queda na conta de luz, na gasolina e em alimentos. No acumulado em 12 meses até agosto, o índice soma inflação de 5,13% –bastante acima do teto.

As expectativas de inflação de médio prazo tiveram leve melhora, mas seguem distantes do centro da meta. Segundo o último boletim Focus, os analistas projetam que o IPCA termine 2026 em 4,3%. Para 2027, a estimativa mediana do mercado para inflação recuou para 3,9%.

No cenário internacional, o Copom destacou que o ambiente continua incerto devido às questões geopolíticas e econômicas nos EUA, gerando volatilidade nos preços dos ativos.

No comunicado, não fez menção à decisão do Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA), que cortou os juros em 0,25 ponto percentual, para o intervalo entre 4% e 4,25% ao ano. A redução ocorre em meio a ataques de Donald Trump à autonomia da instituição.

Economista-chefe do Banco BV, Roberto Padovani afirma que o Copom manteve o clima do comunicado anterior, com as mesmas previsões para os próximos meses e sem sinalização de uma queda na próxima reunião. Nas projeções da instituição, os juros seguirão inalterados até o início do ano que vem.

“O Banco Central não aumentou sua projeção para o 1° trimestre de 2027 -mesmo com os juros parados em 15%, a inflação não converge para o centro da meta- e não alterou o balanço de riscos. O comunicado foi exatamente igual o último, portanto não há nenhum sinal de que mudança na estratégia”, disse.

No setor produtivo, a reclamação segue a mesma: com os juros no patamar atual, é impossível crescer de modo sustentável. A leitura geral, por outro lado, é que dificilmente o BC voltará a subir a taxa de juros.

Uma das federações mais incisivas contra as decisões do Copom, a Fiemg (Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais) afirma que a manutenção da Selic trava a economia e impacta setores dependentes de crédito, limitando o desempenho das vendas no varejo, especialmente nos produtos com tíquete médio maior.

“O tarifaço exige que as empresas invistam na abertura de novos canais de comercialização, mas os juros atuais vão na contramão desse objetivo, ao encarecer as linhas de crédito e piorar a competitividade das empresas brasileiras frente às internacionais”, diz o presidente da Fiemg, Flávio Roscoe.

O aumento da diferença entre as taxas dos EUA e do Brasil pode beneficiar os ativos brasileiros e ajudar a segurar o dólar. Na última semana, a moeda norte-americana veio operando em queda e recuou abaixo de R$ 5,30. Em julho, a cotação do dólar usada pelo Copom em suas projeções foi de R$ 5,55. Nesta quarta, o comitê considerou R$ 5,40.

Os efeitos da guerra comercial seguem no radar do Copom depois que representantes do governo Trump fizeram novas ameaças em reação à condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) pelo STF (Supremo Tribunal Federal). Mas o clima de tensão é menor do que no encontro de julho, quando o republicano confirmou a aplicação da sobretaxa de 50% a produtos brasileiros exportados aos EUA.

“O comitê segue acompanhando os anúncios referentes à imposição de tarifas comerciais pelos EUA ao Brasil, e como os desenvolvimentos da política fiscal doméstica impactam a política monetária e os ativos financeiros, reforçando a postura de cautela em cenário de maior incerteza”, afirmou.

Essa foi a única referência feita pelo colegiado do BC à trajetória das contas públicas do país.

Quanto ao cenário doméstico, o comitê afirmou que o conjunto dos indicadores de atividade econômica tem apresentado “certa moderação” no crescimento, mas ressaltou que o mercado de trabalho ainda mostra dinamismo.

A taxa de desemprego do Brasil recuou a 5,6% no trimestre até julho, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). O indicador renovou a mínima da série histórica da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), iniciada em 2012.

Os sinais de desaceleração da economia a partir do segundo trimestre deste ano levaram o Ministério da Fazenda a reduzir sua projeção de crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) em 2025, de 2,5% para 2,3%.

No balanço de riscos para inflação, o comitê reiterou que os perigos, tanto de alta quanto de baixa, estão mais elevados do que o usual.

Entre os fatores que puxariam os preços para cima, repetiu a possibilidade de as expectativas de inflação seguirem distantes da meta por período mais prolongado e a chance de maior resiliência na inflação de serviços em função de um hiato do produto mais positivo –quando a economia continua operando acima do seu potencial e sujeita a pressões inflacionárias.

Mencionou também no balanço possíveis impactos provocados por políticas econômicas dentro e fora do Brasil, como uma depreciação do câmbio de forma persistente.

Entre os vetores que levariam os preços para baixo, citou novamente a possibilidade de perda de força da atividade econômica doméstica mais acentuada do que a prevista, com impactos sobre a inflação, e de possível desaceleração global mais forte devido a um choque de comércio e ao aumento da incerteza. Falou também de novo sobre a chance de alívio se houver queda nos preços das commodities.

O Copom volta a se reunir nos dias 4 e 5 de novembro, no penúltimo encontro do ano, quando passará a olhar para a inflação do segundo trimestre de 2027.