BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Na investigação que levou à ação deflagrada em Minas Gerais nesta quarta-feira (17), a Polícia Federal identificou que servidores públicos eram cooptados por uma organização criminosa.
Segundo os agentes, em troca de propina, os servidores expediam licenças, pareceres e autorizações que permitiam ao grupo avançar com projetos de mineração em áreas de grande interesse histórico e ambiental.
Entre os servidores suspeitos de envolvimento estão Caio Mário Trivellato Seabra Filho, atual diretor da ANM (Agência Nacional de Mineração), e Rodrigo Teixeira, ex-diretor da PF, ambos indicados na atual gestão do governo Lula (PT).
No total, a PF cumpriu 22 mandados de prisão e 79 de busca. São apurados crimes ambientais, corrupção e lavagem de dinheiro. A Folha de S.Paulo tenta localizar as defesas dos citados nesta reportagem.
A operação foi batizada de Rejeito e é uma continuação das investigações da Operação Poeira Vermelha, que já havia apontado um esquema de extração ilegal de minério na Serra do Curral, em Nova Lima (MG). Ela teve o apoio do Ministério Público Federal e da Receita.
COMO FUNCIONAVA A ORGANIZAÇÃO
Investigação da Polícia Federal identificou uma organização com estrutura hierárquica e nítida divisão de tarefas. Através de propinas e fraudes, o grupo avançou com projetos de mineração em áreas de grande interesse histórico e ambiental. O grupo teria obtido lucro de R$ 1,5 bilhão, além de ter projetos em andamento com potencial econômico superior a R$ 18 bilhões.
Segundo as investigações, Alan Cavalcante do Nascimento, Hélder Adriano de Freitas e João Alberto Paixão Lages são os principais líderes da organização criminosa.
A investigação aponta Nascimento como o “coordenador geral”, responsável por pagamentos de propina e articulações estratégicas. Freitas, engenheiro de minas, cuidava da parte operacional, identificando novas áreas para exploração, diz a PF. Lages, ex-deputado estadual, era o “homem das relações institucionais”, encarregado de contratos, lobby e contato com políticos, de acordo com os agentes.
COMO ATUAVAM OS AGENTES PÚBLICOS
Servidores públicos suspeitos de integrarem o esquema praticavam atos favoráveis às empresas da organização em troca de vantagens indevidas, expedindo licenças, pareceres e autorizações fraudulentas, segundo a PF. Entre os alvos está Seabra Filho, um dos diretores da ANM, que foi alvo de mandado de prisão.
Segundo a investigação, o diretor atuou diretamente para favorecer a empresa Aiga ao pedir vista de um processo e assumir a relatoria, apresentando um voto previamente combinado com líderes da organização criminosa.
A rede criminosa contou com apoio de servidores em diferentes níveis da ANM, que vão desde diretores nacionais em Brasília até regionais em Minas Gerais. Os projetos viabilizados ficam em diferentes cidades mineiras, como Belo Horizonte, Nova Lima e Ouro Preto.
Outro alvo foi Teixeira, ex-diretor da Polícia Federal, que atuou na cúpula da corporação no governo Lula (PT). De acordo com as investigações, ele é suspeito de negociar direitos minerários com uma organização criminosa que atuava em Minas Gerais. Um dos interlocutores dele era o lobista Gilberto Henrique Horta de Carvalho, que também foi alvo de mandado de prisão.
Fazem parte da lista de cooptados servidores de órgãos como Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), ANM, FEAM (Fundação Estadual do Meio Ambiente de Minas Gerais) e Semad (Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Minas Gerais).
COMO A ORGANIZAÇÃO OPERAVA
Após a Operação Poeira Vermelha, o grupo criou pelo menos 42 novas empresas, a maioria sociedades anônimas, para ocultar os verdadeiros donos, dificultar o rastreamento de dinheiro e lavar o capital ilícito, aponta a investigação. Muitas dessas empresas eram de fachada, registradas em endereços que não correspondiam a operações reais. A Fleurs Global Mineração é apontada como o centro financeiro do esquema, movimentando mais de R$ 4,3 bilhões entre 2019 e 2024.
Para dissimular a origem do dinheiro, a organização realizava transações em três ou quatro camadas, usando múltiplas empresas de fachada. O dinheiro passava por várias contas antes de chegar aos beneficiários finais, tornando o rastreamento extremamente difícil.
A organização desenvolveu vários projetos minerários. Entre eles, um que visava a exploração em larga escala da Serra do Curral, uma área tombada e protegida por lei. Para isso, o grupo adquiriu direitos minerários na região e contou com a atuação de servidor da ANM, que aprovou cessões de direitos e alvarás de pesquisa em troca de propina.