BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O centrão prepara uma manobra para ressuscitar a votação secreta que estava prevista na PEC da Blindagem e avalia retaliar o governo Lula após a maioria do PT se posicionar contra a proposta de emenda à Constituição.

O voto sigiloso sobre investigações de deputados e senadores constava da PEC, mas acabou sendo derrubado em plenário na noite de terça (16), em uma vitória de partidos de esquerda e do Novo.

Nesta quarta-feira (17), quando a votação da PEC terá continuidade, o relator do texto, deputado Claudio Cajado (PP-BA), recolhe assinaturas para protocolar uma emenda que recoloca essa votação secreta na proposta, algo que é contestado por deputados contrários à medida.

Cajado foi designado relator da PEC pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), na segunda-feira (15) à noite, e é aliado do ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL).

Após a Câmara concluir a votação, a proposta segue para o Senado, onde precisa ser aprovada também em dois turnos para ser promulgada e entrar em vigor, não cabendo sanção ou veto presidencial.

O texto, chamado pelos deputados de PEC das prerrogativas, tem como objetivo dar ao Congresso o poder de barrar processos criminais no STF (Supremo Tribunal Federal) contra deputados e senadores ao exigir licença prévia do Legislativo. Essa autorização terá de ser deliberada pela respectiva Casa em até 90 dias a contar do recebimento da ordem do Supremo.

O texto original previa que essa votação fosse secreta, mas, quando esse ponto foi deliberado separadamente em plenário, acabou retirado. Foram 296 votos a favor da votação secreta e 174 contrários, mas era necessária uma maioria de 308 deputados para manter o trecho.

Depois da derrota, Motta suspendeu a sessão para evitar novos reveses, adiando para esta quarta a análise de mais dois destaques que poderiam alterar o texto. O presidente da Câmara minimizou a reviravolta ao deixar o plenário, atribuindo a falta de votos ao quórum baixo dado o horário tarde da noite.

Agora, a emenda aglutinativa de Cajado engloba os dois destaques que ainda precisam ser apreciados e volta a estabelecer a votação secreta.

A PEC da Blindagem prevê ainda votação secreta do Legislativo para autorizar a prisão em flagrante de deputados federais e senadores. A emenda aglutinativa une em um só parágrafo as duas possibilidades de votação secreta —a que havia sido derrubada, para autorizar investigações, e a que não havia sido derrubada, para autorizar as prisões, o que na prática restabelece o texto da PEC.

A emenda ainda altera a maioria exigida para o aval à prisão em flagrante —de maioria simples (maioria dos presentes) para maioria absoluta (maioria dos 513 deputados, ou seja 257).

Deputados afirmam que a manobra é imoral e contraria o regimento, já que a análise no segundo turno permite apenas supressão de texto e não alteração. Essa tática de ressuscitar trechos de textos já derrubados em votações separadas, embora controversa, já foi utilizada nas gestões de Lira e de Eduardo Cunha na Câmara.

De acordo com relato de mais de um deputado, Motta se empenhou pessoalmente para aprovar a PEC —ligando para cada um por mais de uma vez ao longo da votação. Ele afirmou a aliados que a aprovação da proposta seria uma demonstração de sua força junto aos deputados, consolidando sua autoridade enquanto presidente da Câmara, e também um aceno aos parlamentares.

Patrocinada pelo centrão como um recado ao STF, que conduz dezenas de investigações sobre desvio de emendas parlamentares, a PEC contém uma blindagem mais ampla do que a original estabelecida na Constituição de 1988 e que havia sido derrubada em 2001 devido à pressão popular contra a impunidade.

INSATISFAÇÃO COM O GOVERNO

Há uma insatisfação entre integrantes do centrão com a atuação do PT na votação da PEC na terça e, por isso, além da emenda aglutinativa, há outras reações contra o governo Lula em curso.

O PT votou majoritariamente contra a PEC, irritando os líderes da Casa. O governo, por sua vez, liberou a bancada e afirmou que não iria interferir na tramitação da proposta.

Uma das alternativas discutidas por cardeais do centrão para dar um recado político ao governo federal passa pela votação da MP (medida provisória) que amplia a isenção do pagamento da conta de luz para até 60 milhões de brasileiros. A medida precisa ser votada nesta quarta-feira na Câmara e no Senado, sob risco de perder a validade.

A MP tem muito apelo popular e, diante disso, o centrão não deve derrubar a proposta, sob o risco de ser criticado na opinião pública. Uma das possibilidades discutidas está na votação de um destaque apresentado pelo Solidariedade, mas patrocinado pelo centrão, segundo relatos.

Esse destaque busca constranger o governo federal, uma vez que ele amplia a quantidade de beneficiários da medida, mas encarece a tarifa a ser paga por consumidores da classe média e de setores da indústria.

A CNI (Confederação Nacional da Indústria) divulgou posicionamento contrário à votação do destaque, afirmando que isso prejudicará setores “fundamentais para a economia brasileira e os custos do novo encargo poderão ser repassados ao consumidor final, com efeitos em cascata”.

A possibilidade de avançar com esse destaque foi discutida em reunião na noite de terça entre Motta e líderes da Câmara após a votação da PEC no plenário, de acordo com relatos.

Além disso, integrantes do centrão defendem alterar trecho do texto, transferindo competências que seriam do Ministério de Minas e Energia para a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica). Esse movimento mira enfraquecer o ministro Alexandre Silveira, que virou desafeto de parlamentares da cúpula da Câmara e do Senado.