FOLHAPRESS – “Animais Perigosos”, de Sean Byrne, é um suspense com predadores do mar, garotas jovens e um psicopata dono de um barco. Fosse dos anos 1980, seria mais um daqueles filmes vagabundos que cinéfilos jovens ou sem preconceitos adoram.

De cara, temos um prólogo que nos coloca frente a frente com Tucker, papel de Jai Courtney. É um vilão de respeito que golpeia um homem com facadas e o joga para servir de almoço dos tubarões.

Antes disso, esse homem e sua amiga tinham sido colocados em uma gaiola e submergidos para observar os tubarões de perto. Mal sabiam eles que estavam se metendo com um fanático cuja ideia de show perfeito é o de uma pessoa sendo devorada pelos tubarões que, pelo hábito, gostam de ficar perto de seu barco.

A amiga, desesperada, é mantida em cativeiro até chegar a hora do show, ou seja, a hora que surge uma espectadora para o banquete dos predadores.

Estamos diante de um exemplar de simplicidade narrativa, que aposta numa tensão permanente, e a tempera com elementos de filmes fuleiros e algumas concessões para angariar espectadores menos despojados —um romance em nascimento, por exemplo.

Um filme vagabundo, quando cai nas graças da cinefilia, é uma ameaça à doutrinação do gosto médio, aquele que rejeita o que é muito intelectualizado, mas se afasta do que não passa por algum crivo suspeito de mínima sofisticação.

O bom cinema pode existir também nos filmes que se apresentam inicialmente como vagabundos, ou chulos, como comprovam Brian De Palma e Paul Verhoeven, dois mestres dessa arte de unir o gosto baixo ao alto sem passar pelo médio.

Vejam, por exemplo, a sequência inicial de “Carrie: A Estranha”, dirigido por De Palma, com seu jeito de propaganda de sabonete, ou o ainda subestimado “Showgirls”, de Verhoeven. São duas obras-primas. Mas os adeptos empedernidos do gosto médio os consideram vagabundos. Azar deles.

Voltemos ao caso de “Animais Perigosos”. Pelas concessões, ele não faz o que os cineastas mencionados acima faziam muito bem. Ele sobe até uma certa etapa, fazendo com que o gosto baixo seja alimentado pelo gosto médio e vice-versa.

Na verdade, é justo pensar que o gosto médio, mais palatável ao maior número de pessoas, incluindo as que têm com o cinema uma relação superficial, acabou se ajustando a alguns ingredientes do filme vagabundo, para angariar certa parcela do público. Tudo pode ser colocado em prateleiras e catalogado para venda.

Sean Byrne, com a ajuda do roteirista Nick Lepard, escolheu uma protagonista, a surfista Zephyr, interpretada por Hassie Harrison. O que ela faz em cena não deve nada aos Rambos e Conans dos anos 1980, mas une à brutalidade alguma graça e inteligência. É a heroína ideal para tempos de representatividade.

No início, Zephyr se envolve rapidamente com um jovem rico, Moses, papel de Josh Heuston. Mas ela o abandona para não ter sua liberdade ameaçada.

Pois é justamente a liberdade que ela perderá ao ter seu caminho cruzado com o de Tucker e ser obrigada a entrar num jogo que pode ser mortal. Moses, contudo, foi fisgado, e por isso começa a investigar o desaparecimento de Zephyr.

O filme é ambientado na Austrália, dirigido por um australiano, e com os dois atores principais australianos —enquanto a atriz principal é americana de Dallas, Texas.

Funciona bem a oposição entre a imensidão azul do mar e a claustrofobia do porão do barco. Esse choque entre os espaços abertos e os opressores faz bem ao filme, e é estabelecido já no começo, com a clara oposição entre o espaço aberto de alto mar e a gaiola sendo substituída pelo cativeiro insalubre.

“Animais Perigosos” passa ainda por algumas questões interessantes. Da similaridade com “Tortura do Medo”, clássico inglês de Michael Powell, retém pouco, pois o filme de Byrne não tem, nem quer ter a classe do filme de Powell.

A necessidade de uma plateia, por menor que seja —e, no caso desta trama, uma pessoa basta— remete à ideia de que uma obra de arte só nasce quando encontra seu espectador. Por isso se diz que o nascimento do cinema foi no dia da primeira exibição pública, em 28 de dezembro de 1895, de alguns curtas produzidos pelos irmãos Lumière.

Por fim, há uma comunhão entre a natureza e a protagonista Zephyr, poupada, como que por milagre, por um tubarão devorador. Talvez por seu nome significar, na mitologia grega, o deus do vento suave que sopra do oeste anunciando a primavera e o florescimento.

ANIMAIS PERIGOSOS

– Avaliação Bom

– Quando Estreia nesta quinta (18), nos cinemas

– Classificação 18 anos

– Elenco Hassie Harrison, Jai Courtney, Josh Heuston

– Produção Austrália, Estados Unidos, Canadá, 2025

– Direção Direção Sean Byrne