SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O provável ciclo de queda nos juros americanos deve aumentar a diferença entre as taxas dos Estados Unidos e do Brasil e beneficiar ativos brasileiros, segurando uma eventual alta do dólar ante o real, dizem especialistas.

Nesta quarta (17), o mercado espera que o Fed (Federal Reserve, banco central dos EUA) corte em 0,25 ponto percentual a taxa do país, levando-a à faixa de 4% a 4,25% ao ano. Considerando que o Banco Central brasileiro deve manter a Selic (taxa básica de juros do Brasil) em 15%, essa diferença de juros iria a 10,75 pontos, levando em conta o limite superior americano.

Todas as 36 instituições ouvidas pela Bloomberg sobre a Selic esperam manutenção da taxa. Nos EUA, só 3 dos 102 consultados esperam queda maior do que de 0,25 ponto percentual.

Quanto maior essa diferença, mais rentável é a estratégia de investimento conhecida como “carry trade”. Nela, pega-se dinheiro emprestado a taxas mais baixas, como a dos EUA, para investir em ativos com alta rentabilidade, como a renda fixa brasileira.

Assim, quanto mais atrativo o carry trade, mais dólares tendem a entrar no Brasil, o que ajuda a valorizar o real.

Outro fator que contribui para a valorização do real é a fraqueza do dólar ante seus pares globais, medida pelo índice DXY. Neste ano, o indicador recua 10%, com a precificação de queda de juros nos EUA e a política econômica do governo de Donald Trump, que reduz a confiança de investidores na moeda americana.

Com mais dois cortes esperados este ano, os juros dos EUA devem encerrar 2025 na faixa entre 3,50% a 3,75%. Isso elevaria o diferencial para 11,25 pontos percentuais, considerando que a maioria dos economistas brasileiros espera que a Selic se mantenha em 15% ao ano.

Esse intervalo é o maior desde 2022, quando o banco central do Brasil foi um dos primeiros a subir juros para conter a inflação vinda da pandemia de Covid-19, enquanto as taxas dos EUA seguiam em patamares baixos para evitar uma recessão.

Naquele ano, o dólar registrou uma mínima de R$ 4,61, mas voltou a subir, acompanhando a alta dos juros americanos, indo ao pico de R$ 5,50 em julho e arrefecendo em seguida, mesmo com eleições presidenciais. Ao fim do ano, estava em R$ 5,28.

Já em 2024, quando a diferença de 5 pontos percentuais foi a menor desde 2021, o dólar superou R$ 6.

Na terça (16), o câmbio fechou em R$ 5,298. Desde janeiro, a cotação do dólar recua 14% ante o real.

“Quanto mais se amplia o diferencial de juros, mais fica difícil ver uma forte valorização do dólar. Mesmo com a eleição indefinida, os juros seguram o câmbio”, diz William Castro Alves, estrategista-chefe da Avenue.

O especialista recomenda que investidores aproveitem a baixa do dólar e invistam na moeda, alocando em instrumentos como os títulos do Tesouro americano (treasury), por mais que sua rentabilidade esteja caindo, para esperar uma eventual baixa no mercado de ações americano. Assim como no Brasil, as Bolsas dos EUA seguem em patamares recorde.

“Com juros em queda, tem sido um momento mais difícil de alocação global. A Bolsa está na máxima histórica. Por outro lado, você tem um dólar [baixo] que não era visto havia um bom tempo. Então, aproveita o dólar, estaciona o dinheiro em algum investimento de baixo risco e, quando eventualmente surgir oportunidade, realoca esse capital”, diz Castro Alves.

O Ibovespa atualmente está em 144.061 pontos, máxima nominal. Com um aumento no fluxo estrangeiro para a Bolsa de Valores, analistas esperam que o índice siga renovando o recorde este ano.

O Santander prevê que o índice irá a 160 mil pontos até o fim do ano, uma alta de 11%. O Itaú, por sua vez, vê o Ibovespa a 150 mil a 165 mil pontos no médio prazo.

Após um pico de investimento no primeiro semestre deste ano, os estrangeiros seguem neutros em relação à B3. A queda dos juros americanos, porém, pode levar a um aumento na busca por ativos mais arriscados. Nesse caso, as ações brasileiras também poderiam se beneficiar, além dos títulos de renda fixa brasileiros, por terem uma alta liquidez, oferecendo uma fácil porta de saída em caso de reversão de tendência, como uma alta do dólar ante o real.

Até o fim do ano, economistas esperam que a moeda americana retome o fôlego e suba cerca de 4% —Bradesco e Itaú esperam o dólar a R$ 5,50 ao término de 2025, mesmo patamar apontado pela pesquisa Focus.

Já o Santander é mais cauteloso, com previsão de R$ 5,70. Segundo o economista do banco Adriano Valladão, a instituição ainda vê as expectativas de inflação desancoradas e a atividade econômica robusta, com espaço para cortes na Selic apenas em 2026.

“Com o corte do Fed, o diferencial de juros de curto prazo aumenta, mas a curva de juros futuros já considera isso. Então, até o fim do ano, isso já está no preço”, diz Valladão.

Ao contrário do Santander, e do Focus, a curva de juros precifica um corte na Selic em dezembro deste ano, o que levaria a taxa para 14,75%. Para o fim do ano que vem, os contratos precificam um juro de 14,25%. Considerando a precificação americana, de juro a 2% em 2026, o diferencial continuaria alto.

A pesquisa Focus, por sua vez, aponta para uma taxa Selic mais baixa ao término do ano que vem, a 12,25%.