SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Os governos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) passaram a discutir a partir desta terça-feira (16) propostas para garantir proteção a autoridades que atuam contra facções criminosas após a aposentadoria.

As movimentações vêm um dia após o assassinato do ex-delegado-geral da Polícia Civil paulista Ruy Ferraz, morto com tiros de fuzil na segunda-feira (15) após emboscada de criminosos em Praia Grande, no litoral paulista. Ele trabalhava como secretário de Administração para a prefeitura local.

Considerado um dos maiores especialistas sobre a estrutura do PCC (Primeiro Comando da Capital), Ruy estava sozinho e dirigia um veículo comum -ele possuía um blindado, mas o utilizava apenas quando viajava para São Paulo, afirmaram à Folha de S.Paulo pessoas próximas ao ex-delegado-geral.

Dois suspeitos de participar do assassinato já foram identificados, disse o secretário estadual de Segurança Pública Guilherme Derrite.

No caso de São Paulo, a necessidade de se garantir proteção a agentes depois da aposentadoria foi reconhecida nesta terça por Tarcísio durante evento no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista.

“A gente tem que pensar, sim, na proteção dessas autoridades, dessas famílias, pessoas que dedicaram uma vida ao combate ao crime organizado e que merecem esse amparo do Estado, porque a gente sabe que a memória não vai embora”, afirmou o governador.

A ideia é que a proteção seja garantida de forma automática. Hoje, disse Tarcísio, agentes públicos têm de formalizar o requerimento pela escolta -o que não foi feito no caso de Ruy , disse o mandatário.

Somente nesta terça-feira, três deputados estaduais protocolaram projetos de lei na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) instituindo programas de proteção permanente a autoridades que combatem o crime organizado e seus familiares.

Os textos dos parlamentares Delegado Olim (PP), Altair Moraes (Republicanos) e Paulo Fiorilo (PT) criam nomenclaturas distintas para o procedimento de proteção, mas todos mencionam o caso de Ruy como justificativa à apresentação do projeto.

Mais cedo, ainda nesta terça, o secretário nacional de Segurança Pública Mário Luiz Sarrubbo também disse trabalhar na elaboração de projeto para garantir proteção a agentes públicos que investigam o crime organizado no Brasil após a aposentadoria.

A medida, afirmou em entrevista coletiva, envolveria alterações na chamada Lei das Organizações Criminosas, de 2013. Ele não deu mais detalhes sobre a proposta.

A proposta que o secretário Sarrubbo diz preparar deve ser apresentada ao presidente Lula (PT) pelo ministro Ricardo Lewandowski (Justiça e Segurança Pública) nas próximas semanas. Depois, segundo ele, o texto deve ser encaminhado ao Congresso Nacional.

“É algo necessário e muito importante”, declarou o secretário, que assumiu a pasta no ministério após quatro anos à frente da Procuradoria-Geral de Justiça de São Paulo.

Promotor do Gaeco (Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado), Lincoln Gakiya afirmou à Folha nesta terça que chegava a conversar com Ruy sobre o risco em torno do PCC, que planejava atentados contra o ex-delegado-geral desde pelo menos 2006.

Em 2010, por exemplo, um plano da facção para assassinar Ruy foi desmobilizado em frente à delegacia DP, onde ele atuava. “Eu fui o responsável por comunicar a Rota [tropa de elite da PM] na época. Dois indivíduos foram presos e evitamos a morte dele”, disse o promotor.

Gakiya e Ruy conversaram pela última vez em maio deste ano em meio às investigações da operação Fim da Linha, que identificou a atuação do crime organizado no sistema de transporte público de São Paulo.

“Ele disse que estava presenciando isso também lá na Baixada Santista, estava temeroso de entrar esse tipo de influência na Praia Grande”, declarou o promotor.

A falta de proteção estatal também preocupa Gakiya, contra quem o PCC já planejou atentados. “Eu não tenho garantia nenhuma de que se eu me aposentar vou ter alguma garantia do Estado”, disse à Folha no início da tarde desta terça.