RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) aprovou nesta terça-feira (16) a correção das certidões das vítimas da chacina de Acari, em 1990, no Rio de Janeiro. A medida atende à determinação da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que responsabilizou o Brasil por violações cometidas na investigação do caso.
A chacina ocorreu em julho de 1990, quando 11 jovens desapareceram após serem levados por homens encapuzados da favela de Acari, na zona norte do Rio. Investigações apontaram que eles foram vítimas de um grupo de extermínio conhecido como Cavalos Corredores, que contava com a participação de policiais militares.
Nenhum corpo foi localizado, e os processos judiciais não resultaram em condenações. Em 2024, os acusados foram absolvidos, após anos de entraves processuais e prescrição.
As certidões deverão registrar que as mortes foram “não naturais, violentas, causadas por agente do Estado brasileiro no contexto do desaparecimento forçado das vítimas da chacina de Acari”, além de trazer a cidade de Magé como local do crime e referência à sentença da Corte e à lei estadual que prevê indenização. Os documentos serão emitidos gratuitamente, sem necessidade de ações judiciais.
Durante a sessão, o presidente do CNJ e do STF, ministro Luís Roberto Barroso, pediu desculpas públicas em nome do Estado. “Esse é um momento simbólico muito importante, mas é um momento em que o Estado brasileiro pede desculpas às vítimas dessa violência, lamenta que não tenha sido possível evitá-la e que não seja possível repará-la inteiramente”, disse.
A presidente da Associação de Mães de Acari, Aline Leite de Souza, ressaltou o impacto da medida. “Que bom que temos ainda duas mães hoje, vivas, e que puderam aguardar e receber a certidão de óbito de seu filho, porque é muito duro para uma mãe saber que seu filho desapareceu forçadamente por um agente do Estado e não ter sequer uma certidão para ter em mãos”, afirmou.
Entre os desaparecidos estão Wallace Souza do Nascimento, Hedio Nascimento, Luiz Henrique da Silva Euzébio, Viviane Rocha da Silva, Cristiane Leite de Souza, Moisés dos Santos Cruz, Edson de Souza Costa, Luiz Carlos Vasconcellos de Deus, Hoodson Silva de Oliveira, Rosana de Souza Santos e Antônio Carlos da Silva.
O caso mobilizou familiares e deu origem ao grupo Mães de Acari, símbolo da luta por justiça. Em 1993, a primeira líder do movimento, Edimeia da Silva Euzébio, foi assassinada junto com a sobrinha após denunciar a participação de policiais militares em grupos de extermínio. Sua filha, Rosângela, esteve presente na cerimônia do CNJ.
Para Alini de Souza, irmã de Wallace, a certidão de óbito representa uma reparação parcial. “O documento não apaga a dor de anos de busca por justiça. Ainda sentimos a tristeza e o vazio em nossas famílias. Estamos dando seguimento à luta que nossas mães iniciaram com tanta força, com tanta coragem. Com certeza, a certidão é um consolo”, disse.
A decisão da Corte Interamericana também prevê indenizações, apoio médico e psicológico, além de medidas de não repetição, como a tipificação do desaparecimento forçado e a realização de estudos sobre a atuação de milícias e grupos de extermínio no Rio.