SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Jonathan Santana Macedo, 35, ficou preso durante um ano e cinco meses por um crime que não cometeu, decidiu a Justiça.
Detento entre agosto de 2020 e fevereiro de 2022, ele foi acusado por três crimes de roubo e condenado por dois deles, com base em reconhecimento fotográfico. Um desses casos só foi resolvido no ano passado, quando o STJ (Superior Tribunal de Justiça) o absolveu. Agora, a Justiça de primeira instância condenou o estado de São Paulo a pagar R$ 386 mil em indenização por danos morais e materiais.
Na decisão deste ano, o juiz Fausto Dalmaschio Ferreira julga procedente o pedido de condenar a Fazenda Pública a pagar R$ 336 mil em favor de Jonathan e R$ 50 mil em favor do seu filho.
O bebê nasceu durante o período em que Jonathan estava preso e teve complicações de saúde decorrentes de uma bronquiolite. Ele recebeu a notícia por carta, sem detalhes sobre o que havia acontecido. Ao sair, descobriu que a criança chegou a passar por cirurgias e registrou falta de oxigenação no cérebro, o que gerou dano cerebral.
Jonathan diz acreditar que o desfecho poderia ser diferente caso estivesse lá para dar assistência. “Eu não acompanhei nada desse processo dele no hospital. Quando eu cheguei, não tinha mais o que fazer”, lamenta.
Procurada, a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo afirma que o roubo a residência ocorrido em janeiro de 2020 foi investigado pelo 101º Distrito Policial (Jardim Imbuias) e que seguiu todos os trâmites previstos no Código de Processo Penal, com a oitiva das vítimas, a realização de exames periciais e diligências de campo para reunir provas e esclarecer o crime.
Na ação, o juiz rememora as ações criminais dos anos anteriores, reiterando que Jonathan era réu primário quando houve o reconhecimento fotográfico, ou seja, não tinha passagens criminais que justificassem o fato de haver fotos dele nos registros policiais.
Uma das advogadas do processo indenizatório, Débora Nachmanowicz, afirma que o fato de a prova ser ilícita foi essencial para o caso. “Não havia outro elemento. Pelo contrário, o álibi dele foi desconsiderado em duas das três situações, ele estava trabalhando nos dias dos roubos, e isso foi desconsiderado pelo juiz de primeira instância nos dois casos”, afirma.
Jonathan trabalhava em uma lanchonete antes de ser preso. Morador da zona sul de São Paulo, ele foi abordado na rua por policiais sem que houvesse uma justificativa, diz. Ele conta que, durante a abordagem, os agentes tiraram fotos dele e do seu documento. As imagens, depois, foram mostradas para vítimas dos roubos, que disseram o ter reconhecido.
“Os advogados criminais tentaram muitas vezes habeas corpus no Tribunal de Justiça, na segunda instância, e só depois de muita luta conseguiram ganhar esse habeas corpus no STJ, para reconhecer a ilegalidade desse reconhecimento pessoal e então absolver o Jonathan”, diz Nachmanowicz.
Newsletter FolhaJus A newsletter sobre o mundo jurídico exclusiva para assinantes da Folha *** O juiz aponta para indícios de irregularidade na conduta de agentes estatais que o prenderam, dentre eles o sargento Sérgio Batista, que chegou a ser alvo de investigação na Corregedoria da Polícia Militar.
A Polícia Militar, no entanto, nega que o sargento tenha participado da prisão, diz que as denúncias citadas foram apuradas em inquérito administrativo já concluído, “o qual não apontou qualquer indício de envolvimento do policial com organizações criminosas.”
“Se ao Estado, em benefício da coletividade, é dado privar o cidadão de sua liberdade, a mesma coletividade poderá ser obrigada a reparar os danos causados ao indivíduo que foi privado de sua liberdade para garantia da ordem pública e, ao fim do processo, foi absolvido, mediante a análise do caso concreto”, decidiu Fausto Dalmaschio Ferreira.
Hoje, Jonathan diz que tem tentado recobrar-se da situação e seguir com a vida. Trabalhando como manobrista, tem cuidado do filho e de uma nova bebê, que está com dois anos.
“O que eu não consigo falar é a revolta. Querer se revoltar com uma coisa que já passou, já tem 5 anos. Eu acho que aquela maldade que ficou no coração, não tem o que fazer. Mas já passou.”