SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Após 33 edições, a maior conferência sobre residências artísticas desembarca pela primeira vez na América Latina. De 18 a 23 de setembro, na Fundação Armando Álvares Penteado, a Faap, a Res Artis mistura palestras, mostras e outras ações, tendo a diversidade do hemisfério sul como norte da vez.
Uma residência artística consiste na viagem de artistas a outros lugares, onde ficam hospedados em espaços de produção de obras e em contato entre participantes. Os programas envolvem atividades culturais, duram meses ou anos e são, geralmente, internacionais.
Sob o título “Outras Primaveras: Florações do Sul Global”, a programação se inspira no livro “Primavera para as Rosas Negras”, de Lélia Gonzalez -grande voz brasileira em debates raciais, de gênero e de classe. Entre países como Angola, Argentina, México e Vietnã, as conversas estudam casos diversos e eventos paralelos oferecem uma ida à Bienal de São Paulo e uma exposição sobre a residência da Faap.
A ideia principal deste ano é “amefricanidade”. O conceito diz respeito à formação das Américas, com raízes sufocadas pela colonização. “As culturas africanas e de povos originários têm muita influência sobre a latina. Quando propus o projeto, muitos estranharam a noção de uma primavera em setembro. Estamos habituados à perspectiva do norte global. Nosso objetivo é mostrar outras formas de se pensar o mundo”, diz Marcos Moraes, diretor do Mab Faap, o museu da instituição.
Entre os seminários, o tunisiano Ahmed Mourad Khanfir fala sobre residências artísticas em regiões da África e do Oriente Médio, a mexicana Alicia Marvan discute descolonização e sustentabilidade e a haitiana Tâmara Isaac faz uma oficina de poesia, que trabalha o elo entre a linguagem e o pertencimento.
Radicada no Brasil, Isaac vê o evento como forma de reforçar as relações entre a arte e a imigração. “Vejo hoje uma tendência crescente de participação ativa, com formas mais democráticas e participativas de criar, que reduzem a hierarquia entre o artista e o público”, diz ela.
Chama também a atenção o debate com o brasileiro Felix Toro. Ele é diretor executivo do Instituto Sacatar, na Bahia, residência artística mais antiga do país. Toro descreve um momento de expansão das residências pelo Nordeste e põe a conferência como possível resposta à ascensão de autoritarismos.
Moraes destaca o papel da Faap no histórico das residências artísticas. A instituição tem um programa específico para universitários, que acontece há vinte anos no edifício Lutetia, no centro de São Paulo.
Na programação paralela da Res Artis, o Mab traz 135 obras de ex-participantes. Os destaques são nomes como o libanês Ali Cherri, vencedor do Leão de Prata na Bienal de Veneza, e o artista suíço Guerreiro do Divino Amor. Radicado no Rio, ele junta sci-fi e arquitetura em suas obras. Em 20 de setembro, o Lutetia ainda terá um “open-studio”, que permite aos visitantes conhecer residentes.
“Hoje temos 11 artistas na residência. Eles convivem no mesmo prédio, se encontram na lavanderia, no elevador, frequentam o apartamento um do outro e saem juntos para eventos como a Bienal”, diz Moraes.
Na esteira da Temporada França-Brasil, também são celebradas as três décadas da residência Faap-Paris, que oferece aos alunos brasileiros a chance de desenvolver obras na Cité Internationale des Arts.
“A Cité foi fundada pensando em redes de solidariedade e como espaço de colaboração”, afirma a diretora Benedict Alliot. Ela participa de um painel sobre gestões no dia 19. “A Res Artis é essencial para os conturbados dias de hoje, por reunir metodologias diferentes e estender a hospitalidade aos artistas de todo o mundo.”