SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Quando se separou aos 50 anos, após seu relacionamento esfriar e parecer algo entre irmãos, Angela Dippe disse que ia aproveitar enquanto ainda tinha “lenha para queimar”, pois achava que se aposentaria sexualmente aos 60. “Eu acreditava que desejo tinha prazo de validade”, diz.

Hoje, aos 63 anos e em um novo relacionamento, a atriz vê o quanto estava errada. “Para mim, sexo sempre foi e, para minha surpresa, ainda continua sendo muito importante”, afirma. Mas, até ter essa constatação, ela passou por uma jornada de experimentação e quebra das próprias crenças.

Na televisão, a mulher na faixa dos 60 anos tem se transformado e se mostrado sexualmente ativa. Enquanto, por exemplo, a sexualidade da personagem Odete Roitman, vivida pela atriz Beatriz Segall na novela “Vale Tudo”, de 1988, era tratada com suspeita e polêmica, a nova versão, de 2025, interpretada por Debora Bloch, apresenta camadas inesperadas, como uma sexualidade empoderada, mesmo se relacionando com homens mais jovens, o que ainda é considerado um tabu.

“Ela não está nem aí. Ela vai em busca do próprio prazer. E com rapazes mais novos. É o que ela gosta. Esse tipo de mulher liberada é um ótimo estímulo para mulheres que ainda estão travadas”, diz Regina Racco, escritora e professora da técnica de pompoarismo (prática de fortalecimento do assoalho pélvico).

Odete aparece se entregando ao amor e explorando sua sexualidade com César, papel de Cauã Reymond. As cenas entre eles têm forte carga erótica e de atração -ainda que ele tenha um interesse financeiro, afinal ela é uma mulher rica e influente.

Ao se tornar uma “cinquentona solteira”, Angela percebeu que o sexo nem sempre precisava ser acompanhado por paixão ou amor. “Foi ali que vivi minha sexualidade de forma intensa, plena e criativa, como nunca antes, com inúmeros parceiros incríveis”, diz. Ela afirma ser de uma geração em que tudo era tabu: a menstruação, virgindade, maternidade.

A mulher atual com 60 anos foi criada em uma época em que o prazer sexual era reprimido, associado à sujeira ou à promiscuidade, explica a psicóloga e sexóloga Sheila Reis. Assim, a vivência sexual das mulheres maduras é influenciada pela história de vida de cada uma.

“A mulher, quando vai transar, precisa que as tarefas estejam todas organizadas para poder entrar no prazer. O prazer não vem de graça para ela. Enquanto o menino é criado para erotizar desde cedo”, afirma Reis.

Não dá para ignorar também os sintomas que surgem com a menopausa, como o ressecamento vaginal, ondas de calor, insônia, alteração de humor e a sensação de não ser mais desejável. Todas essas são questões que afetam inclusive a libido da mulher. Para manter a vida sexual ativa, Angela cuida do próprio corpo com reposição hormonal, laser, cremes, boa alimentação, suplementos, exercícios e também com a imaginação, a curiosidade e a disposição de experimentar.

“Descobri que desejo é menos sobre a idade e mais sobre o contexto. Muitas vezes, quando uma mulher chega aos 50 em um casamento que começou aos 20, o problema não é a menopausa, mas a rotina, a sobrecarga, o cativeiro do cotidiano”, afirma Angela, que está em cartaz com a comédia “Da Puberdade à Menopausa” no Teatro das Artes, em São Paulo.

A psicóloga e sexóloga Sheila Reis também reforça que a queda da libido não é um destino inevitável da menopausa, mas, muitas vezes, resultado de travas mentais e culturais, da sobrecarga e falta de educação sexual. “Pode até ‘bombar’ de hormônio, se for o caso, mas a questão é mental também, é cultural”, explica. Para ela, mulheres que mantiveram uma vida sexual ativa e um diálogo erótico com o parceiro tendem a continuar tendo desejo.

É inegável, porém, como a atividade sexual muda com o passar dos anos e passa a ocupar outro lugar na vida das pessoas. A psicóloga afirma que a sexualidade e o erótico são mantidos não apenas pela relação sexual em si, mas pela proximidade, pelo toque e pela cumplicidade no casal. “Não necessariamente é só o ato sexual. É passar a mão, é beijar, é ter o erótico ali no casal”, diz Reis.

Para a professora de pompoarismo Regina Racco, é importante a mulher parar de se comparar com a versão mais jovem de si mesma e começar a descobrir e aproveitar as possibilidades do seu corpo atual. “No momento em que elas se prendem ao passado, lembrando da silhueta passada, da libido passada, do desejo passado, elas deixam de viver o momento presente, porque a libido não é estática”, explica.

Ela defende também que a mulher tem direito ao prazer, esteja ela em um relacionamento ou não, e os brinquedos adultos podem ser ferramentas válidas para explorar a sexualidade sozinha. Enquanto professora de pompoarismo, Racco destaca como o treinamento do assoalho pélvico pode ser uma solução central, com benefícios para além do sexo. Segundo ela, ele previne e trata incontinência urinária e ressecamento vaginal, além de facilitar o orgasmo, aumentar a libido e melhorar o prazer do casal.

Para Tania Celidonio, jornalista e autora de “Mistérios e Aflições da Sexualidade na Velhice”, a obrigação de ter uma vida sexual superativa diminui com o tempo. Ela descobriu, durante o processo de escrita, que se não houver sexo, não significa que não haja amor. O afeto, a cumplicidade e o cuidado tornam-se, em muitos casos, mais importantes do que o ato sexual em si, especialmente quando surgem questões de saúde e finitude.

Mas o que não desaparece com a idade é a pressão estética. Há relatos de mulheres preocupadas com as mudanças físicas, a ponto de inibir sua vida sexual e causar vergonha. “Se você for fazer sexo agora, nunca fique por cima. Porque se você ficar por cima, cai tudo. Do queixo até a barriga, até as pernas”, é um dos depoimentos registrados por especialistas.

Isso faz parte, segundo a escritora, de uma sociedade administrada por um olhar mais jovem, que causa a sensação de invisibilidade em pessoas acima dos 60 anos -e ela não é apenas social, mas profissional e sexual também. “Olham para você como alguém que se aposentou de tudo”, diz, “inclusive do sexo”.

No meio de tudo isso, Celidonio destaca que um aspecto positivo do envelhecimento é sentir-se mais em paz e menos dependente da validação externa para ser feliz. “É bom sentir que eu não dependo tanto desse julgamento para estar feliz”, diz.