(FOLHAPRESS) – Há duas maneiras diferentes de avaliar “Downton Abbey: O Grande Final”, filme que fecha uma trilogia no cinema que retomou a série britânica que encantou uma legião de fãs em seis temporadas, de 2010 a 2015.
Para os admiradores fiéis de uma história contada com cenários deslumbrantes, figurinos elegantes e diálogos com a imbatível carga de cinismo e ironia que os autores ingleses dominam tão bem, é mais uma chance de admirar seus personagens favoritos por mais duas horas.
Quem não é tão fã da produção tem chance de observar que os três filmes para cinema não avançaram em nada na narrativa da série. O conteúdo é totalmente mais do mesmo, e aí a chance de faturar mais um pouco com o título pode representar um atitude caça-níqueis.
Em respeito às multidões que tratam “Downton Abbey” com muito carinho, é possível deixar de lado a questão de ampliar a bilheteria e focar naquilo que a tela grande oferece para o encerramento da jornada da família Crawley, que chega agora à década de 1930.
O filme não é nada didático para quem não conhece a saga, e quem está nessa condição nem deve comprar o ingresso. Robert Crawley, diante dos tempos modernos, deve deixar o comando da família diante das novas características no mundo dos negócios e das relações políticas. Mas assumir o lugar do pai não vai ser fácil para Lady Mary.
O escritor britânico Julian Fellows, roteirista da série, já criou alguns arcos narrativos muito atraentes, esbanjando diálogos elegantes e ferinos que compõem histórias que são retratos das tensões entre aristocracia e classes trabalhadoras.
No entanto, talvez isso que é anunciado como “grande finale” da saga poderia ter um mote mais interessante do que as agruras de Lady Mary ao tomar as rédeas de Downton Abbey. Ela e Lorde Talbot se divorciaram, em mais um escândalo para essa família tão acostumada a eles.
Expulsa de festas e compromissos sociais, ela sente como a sociedade da época se recusa a estar na mesma sala com uma mulher divorciada. Para uma série que surpreendeu constantemente sua audiência com tramas vigorosas e carregadas de tensão, parece coisa de uma novela antiga.
Se no quesito roteiro o filme dá uma derrapada, a ambientação é impecável em todos os detalhes. Para os fãs de carteirinha, é quase um check-list de recordações do dia a dia na grande mansão. Como sempre, o trabalho dos empregados é uma atração irresistível.
Muito do charme irresistível da série vem dessa repetição de esmero e dedicação de todos. E das conversas afiadas dos Crawley. Por isso, é possível questionar se o formato de longa-metragem é adequado para desenvolver novos desdobramentos da história de “Downton Abbey”.
Porque é inegável que o grande talento do autor é uma lenta construção de um painel repleto de detalhes saborosos, que se forma em muitas relações interligando seus personagens. Um filme parece pouco para ele criar um enredo de começo, meio e fim.
Mesmo considerando os filmes para o cinema como uma trilogia conectada, com “Downton Abbey: O Filme” (2019) e “Downton Abbey: Uma Nova Era” (2022), a coisa toda parece feita apenas para provocar recordações da série e nada mais.
Resta a cada ator aproveitar todas as cenas que o roteiro oferece para deixar a marca de seu personagem. Nesse aspecto, a ausência irreparável recai sobre Maggie Smith, que morreu no ano passado, aos 89 anos. Ela interpretava Violet.
Mãe de Robert Crawley, a personagem representa a velha aristocracia, conhecendo profundamente tradições, títulos e convenções sociais. Lady Mary sente a falta da orientação de Violet, espirituosa e irônica, com suas tiradas mordazes que equilibram um fervor conservador e uma inteligência afiada. Ao longo da série, Violet encarna a tensão entre passado e modernidade.
Sem ela, provavelmente a predileção dos fãs que assistem a este último filme é dirigida a Mr. Carson, o mordomo que é chefe dos empregados de Downton Abbey. O ator Jim Carter criou um tipo inesquecível, guardião fiel da aristocracia e também figura protetora dos seus subordinados.
Este e outros personagens memoráveis se despedem num filme que preserva muitas qualidades encantadoras da série. Um roteiro melhorzinho seria a cereja do bolo.
DOWNTON ABBEY: O GRANDE FINAL
Avaliação Bom
Onde Nos cinemas
Classificação 12 anos
Elenco Michelle Dockery, Elizabeth McGovern, Paul Giamatti, Hugh Bonneville, Jim Carter
Produção Reino Unido, 2025
Direção Simon Curtis