BELO HORIZONTE, MG (FOLHAPRESS) – A chegada da inteligência artificial à busca do Google não muda a receita para aparecer nos resultados: oferecer conteúdo relevante para os usuários. Isso quem diz é Pandu Nayak, cientista-chefe da busca da empresa, onde trabalha há 20 anos.

A empresa lançou nesta segunda-feira (8) o Modo IA no Brasil em português. Anunciado em maio, o recurso expande o AI Overviews, de resumos gerados por IA, para uma aba dedicada, em ferramenta similar ao que fazem o ChatGPT e o próprio Gemini da empresa.

Para o pesquisador, da mesma forma que a empresa desenvolve produtos pensando nos usuários, criadores de conteúdo e empresas de mídia —que dependem do tráfego do buscador dominante— também devem pensar no que a audiência quer.

“Isso [é relevante] em um contexto em que as preferências dos usuários, especialmente para usuários mais jovens, da geração Z, estão mudando para mais conteúdo de pessoas como eles. E estamos vendo esse tipo de mudança de comportamento acontecendo, portanto é importante que os editores reconheçam isso e encontrem os usuários onde eles estiverem”, disse Nayak à Folha.

As mudanças no produto de maior rentabilidade da big tech preocupam setores que dependem dos cliques gerados pela inclusão dos seus sites nos resultados. A posição dos links nas páginas geralmente está relacionada a critérios como relevância da página, qualidade do conteúdo e utilidade ao usuário. Agora, o Modo IA responderá a consultas em texto corrido, similar aos robôs populares de IA generativa, com links ao longo da resposta.

Segundo Nayak, embora as discussões tenham se voltado para como os veículos de notícia podem perder audiência por conta dos recursos de IA, os dados do Google mostram que o nível de tráfego que o buscador envia para a internet continua estável e praticamente o mesmo.

“Isso não significa que durante esse mesmo período um publisher específico não possa ter perdido tráfego, mas isso não tem nada a ver com AI Overviews ou algo assim”, disse.

“Os usuários podem buscar um tipo de conteúdo em vez de outro à medida que suas preferências mudam, e esse é um fator importante aqui. Minha recomendação para os editores é garantir que estejam sempre inovando de maneira a atrair o público mais amplo possível”.

A visão do Google de que o tráfego permanece estável é contestada por pesquisadores e veículos jornalísticos. Pesquisa do Pew Research Center publicada em julho mostra que usuários do Google que encontram um resumo de IA na resposta têm menor probabilidade de clicar em links para outros sites do que usuários que não veem um resumo.

Segundo o artigo, usuários cujas consultas geraram um resumo de IA clicaram em um link tradicional (abaixo do resumo) em 8% das visitas. Aqueles que não receberam um resumo de IA clicaram em um link quase duas vezes mais, em 15% das visitas. A empresa contesta a metodologia.

Em publicação no blog oficial em maio, a vice-presidente global da Busca, Elizabeth Reid, afirmou que nos Estados Unidos e na Índia o AI Overviews foi responsável por um aumento de 10% no uso da plataforma.

Bruno Pôssas, brasileiro que lidera a divisão de engenharia para busca no Google, disse em entrevista a jornalistas no evento de 20 anos da big tech no Brasil que oferecer respostas mais diretas de forma imediata não significa que a necessidade de informação em relação a outros assuntos será menor.

“Se o usuário perguntar qual foi o placar do último jogo do Atlético [e receber o resultado], ele ainda poderá pesquisar os melhores momentos da partida e tudo mais. Então uma coisa não necessariamente implica a outra”, disse.

Outra preocupação ainda ecoa o lançamento do AI Overviews no ano passado. Nos primeiros meses no ar, a ferramenta viralizou ao sugerir incluir cola em uma receita de pizza e dizer que o ex-presidente dos EUA Barack Obama é muçulmano.

“Essa é uma questão da mais alta importância para nós porque o Google sempre se orgulhou da qualidade das informações que produz. Mesmo com nossas experiências de IA, estabelecemos um padrão muito alto, o que não significa que não haverá erros”, disse Nayak.

O cientista-chefe, ex-professor da Universidade Stanford, disse que resultados problemáticos e desinformação também foram comuns ao longo do desenvolvimento da busca, mas a empresa trabalhou por anos para corrigir e melhorar o serviço.

“Todos os nossos experimentos mostram que a qualidade das informações que estamos apresentando agora [no AI Overviews], é tão boa que está no nível de serviços que temos há muito tempo”, disse.

Para o futuro da internet, o pesquisador afirmou que os usuários continuarão a querer ouvir o que outras pessoas têm a dizer, seja em sites com alta reputação, em empresas ou em redes sociais, e essa diversidade de vozes só está disponível na rede.

“Isso significa que tudo na web terá sucesso? Talvez não, mas essa é apenas a natureza das coisas. Mas a web continuará existindo e sendo algo muito importante. As pessoas querem ouvir outras pessoas”, disse.