SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Apesar do crescimento econômico acima do esperado, baixo desemprego e recente queda na expectativa de inflação, o Brasil ainda segue longe de uma melhora na sua nota de crédito, diz Shelly Shetty, diretora de riscos soberanos para Ásia e Américas na Fitch Ratings.

“Há algumas coisas que podem elevar a classificação: consolidação fiscal, com ganho de confiança de que o Brasil pode alcançar uma ampla estabilização da dívida, crescimento econômico e políticas que ajudam a dinâmica de investimento e crescimento”, disse Shelly, nesta terça-feira (9), durante sua passagem semestral pelo Brasil.

Entre 2008 e 2015, o país teve o selo de bom pagador. Atualmente, o país tem nota BB com perspectiva estável, dois degraus abaixo do grau de investimento.

A economista diz que países levam em média seis anos para recuperar o grau de investimento perdido. No caso do Brasil, já se passou uma década (o grau foi perdido em 2015) e, segundo Shelly, a melhora no status não está perto.

Ela compara o cenário atual com o de 2008, quando o Brasil obteve o selo de bom pagador, e aponta que as perspectivas de crescimento estão mais fracas, enquanto o déficit fiscal está muito maior.

“Não vemos o Brasil atingindo grau de investimento no curto prazo. O governo deve cumprir a meta de déficit primário este ano, mas há desafios: previsões de crescimento mais baixas que o previsto pelo Orçamento, receitas que dependem de medidas no Congresso, e 2026 é ano eleitoral.”

Em 2008, o crescimento do real do PIB (Produto Interno Bruto) foi de 4,8% e o esperado pela Fitch para este ano é de 2,5%. Já o percentual da dívida em relação ao PIB era de 56% e a expectativa é que termine 2025 em 79,3%.

A analista de riscos diz que mudanças são necessárias para melhorar ambiente de negócios e dinâmica de investimentos para maior crescimento, como a flexibilização dos gastos obrigatórios, que comprometem quase todo o Orçamento.

De acordo com Shelly, o Brasil precisaria promover corte de gastos e aumento na arrecadação de modo a gerar um superávit primário de 2% a 3% do PIB para estabilizar a dívida.

O México é um dos países da região que tem grau de investimento, com nota BBB- estável. Segundo Shelly, apesar da forte exposição aos EUA, a solidez fiscal do país segura o selo de bom pagador.

“O México demonstrou capacidade de controlar déficits fiscais ao longo de décadas, mesmo durante crises. Dívida em torno de 45-60% do PIB, contra quase 80% do Brasil. O México tem perspectivas de estabilização da dívida quando o seu crescimento econômico retornar, enquanto Brasil tem trajetória ascendente da dívida.”

Segundo a economista, as tarifas promovidas pelos Estados Unidos ao Brasil não devem ter impacto significativo na economia brasileira, dada a baixa exposição aos EUA (apenas 2% do PIB em exportações). Além disso, ela destaca a boa capacidade que o Brasil tem de absorver choques devido às grandes reservas internacionais e ao regime cambial flexível.

Com relação ao trabalho do Banco Central brasileiro, a diretora da Fitch vê determinação da autoridade em perseguir a meta inflacionária diante de uma demanda doméstica resiliente. Nos últimos 12 meses, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) acumulou alta de 5,13%, acima do teto da meta, de 4,5%.

“É uma meta que os países estabeleceram para si mesmos. O que queremos é que os bancos centrais ao redor do mundo demonstrem determinação para que os números da inflação se aproximem dessa meta. Inflação baixa e estável é boa para estabilidade macroeconômica”, diz Shelly.

A economista defende a independência dos bancos centrais para perseguir metas de inflação e diz que trabalha com um cenário base no qual o Fed (BC dos EUA) segue independente, apesar das críticas do presidente Donald Trump. Atualmente, o governo americano trava uma batalha judicial para demirir Lisa Cook da diretoria do Fed.

“A nossa expectativa base é que o Fed tome medidas que ancorem a inflação ou levem a inflação à sua meta e ancorem a estabilidade macroeconômica.”