SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A desnutrição infantil na Faixa de Gaza atingiu novos níveis recordes em agosto, segundo um novo relatório publicado pelo Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância e Adolescência) nesta quinta-feira (11).

À medida que a ofensiva militar de Israel no território palestino avança, quase 20% das crianças da Cidade de Gaza, a maior do território, foram internadas com algum caso de desnutrição em agosto. Em todo o território palestino, situações mais graves, com desnutrição aguda, atingiam 8,3% das crianças em julho. O número saltou para 13,5% no mês seguinte.

A porcentagem de menores de idade nessa situação aumentou apesar do fato de o Unicef ter contabilizado menos crianças em agosto do que havia conseguido fazer em julho. Durante o mês de agosto, foram identificadas ao menos 12,8 mil crianças gravemente desnutridas, um número absoluto ligeiramente menor que o registrado em julho, de 13 mil.

O relatório atribui a diferença e a menor base de amostras não em uma melhora na situação, mas sim à menor capacidade de triagem em postos de saúde, devido à destruição desses locais por bombardeios israelenses.

No fim de agosto, a ONU declarou oficialmente um cenário de fome no território —a primeiro vez que a classificação foi atribuída a um local no Oriente Médio—, após meses de alertas de especialistas e da própria organização de que 500 mil pessoas estavam em uma situação humanitária catastrófica.

Segundo a diretora-executiva do Unicef, Catherine Russell, um em cada cinco bebês na Faixa de Gaza já nasce prematuro ou abaixo do peso. Ela alertou que mulheres grávidas e lactantes também enfrentam riscos extremos diante da escassez de alimentos.

Quase não há terras agrícolas disponíveis em Gaza, devido à destruição causada pelos bombardeios, e isso dificulta o acesso a espaços para cultivar alimentos. Segundo as agências internacionais, esta é outro fator significativo que contribui para a desnutrição generalizada.

Em julho, um porta-voz do Unicef falou à Folha de S.Paulo sobre a situação no território palestino e, desde então, corroborou as críticas às ações do primeiro-ministro Binyamin Netanyahu e à Fundação Humanitária de Gaza —organização apoiada por Israel e Estados Unidos que, desde fim do bloqueio do início do ano, é a responsável oficial pela distribuição de ajuda na região.

Ricardo Pires afirmou que “o sistema extenso e a coordenação entre diversos parceiros [da ONU] estavam sendo deixados de lado”. Com a instauração da FHG, Israel cerceou a possibilidade de órgãos internacionais atuarem. Desde então, Ricardo afirmou que as equipes continuavam em Gaza “prontas para retomar a entrega em larga escala de suprimentos e serviços essenciais”.

O Unicef se reafirmou, desde aquele momento, preocupado com a proposta do uso de reconhecimento facial como pré-requisito para o acesso dos civis à ajuda. Segundo Pires, “isso vai contra os princípios humanitários por utilizar o monitoramento de beneficiários para fins de inteligência e militares”. O objetivo da medida, de acordo com Israel, seria evitar que membros do Hamas se infiltrem e roubem mantimentos, o que a facção nega fazer.

No relatório desta quinta, o fundo da ONU disse trabalhar para ampliar o envio de suprimentos para crianças em estado grave —inclusive para casos de deficiências físicas causadas pelo conflito—, mas reafirmou que a disponibilidade de alimentos e insumos para bebês e gestantes segue insuficiente.

O Unicef cobra um aumento imediato da entrada de ajuda humanitária, a reabertura de serviços de saúde e a proteção de hospitais, abrigos e centros de nutrição dos ataques de Tel Aviv. Também pede o restabelecimento de um cessar-fogo e o respeito ao direito internacional humanitário, incluindo a liberação de reféns pelo Hamas e o acesso seguro e contínuo para trabalhadores humanitários em Gaza.