SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Pela primeira vez na história, a obesidade superou a desnutrição entre crianças e adolescentes no mundo, segundo um estudo do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância). O marco mostra que a insegurança alimentar não foi superada, mas sofreu uma mudança frente ao aumento do consumo de alimentos ultraprocessados, dizem especialistas.

Segundo o estudo, em 2025, a prevalência global de obesidade entre crianças e adolescentes de 5 a 19 anos foi de 9,4%, enquanto a de desnutrição foi de 9,2%. As regiões mais afetadas são América Latina e Caribe, Oriente Médio, Norte da África e a América do Norte.

O relatório “Alimentando o Lucro: como os Ambientes Alimentares Estão Falhando com as Crianças”, divulgado nesta quarta-feira (10), usou dados de pesquisas do Unicef fornecidos por mais de 190 países com crianças e adolescentes de 0 a 19 anos. As classificações excesso de peso, sobrepeso, obesidade e desnutrição são definidas com base nos critérios da OMS (Organização Mundial da Saúde).

Bruno Halpern, Vice-presidente da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica), diz que o marco não deve ser considerado um avanço e que a obesidade deve ser considerada como nova forma de insegurança alimentar.

“A desnutrição e a obesidade são duas faces da mesma moeda. O grande ponto é que o crescimento maior da obesidade é em crianças de países de baixa e média renda”, diz Halpern.

Segundo o estudo, 20% das crianças e adolescentes entre 5 e 19 anos estão em excesso de peso, classificação que considera pessoas com sobrepeso ou com obesidade. A porcentagem representa um aumento de cerca de 50% de 2000 a 2025.

O crescimento se comporta de forma diferente entre países de baixa, média e alta renda. Segundo o relatório, enquanto nos países ricos o aumento foi de 1,2 vezes, nos países pobres ele cresceu 50%.

O estudo mostra que a mudança está relacionada ao aumento do consumo dos alimentos ultraprocessados que, segundo Halpern, são baratos e calóricos, mas não nutritivos: “A gente precisa oferecer calorias, sim, para que as pessoas não tenham desnutrição e fome, mas com qualidade nutricional para que elas tenham saúde”.

O relatório ainda traz dados que responsabilizam a indústria de alimentos como impulsionadora do crescimento da obesidade. “Eles inundam os mercados de varejo, eles se infiltram nas escolas e eles têm um lobby muito grande na elaboração de políticas públicas, que mina a ação do governo para apoiar a alimentação saudável”, diz Stephanie Amaral, oficial de Saúde e Nutrição do Unicef no Brasil.

O Unicef destaca o Brasil como referência mundial pelas ações de rotulagem dos alimentos e pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar.

Amaral, no entanto, diz que ainda é preciso proibir anúncios e a presença de ultraprocessados em todas as escolas. Ela diz é preciso ter um maior monitoramento da alimentação dos colégios municipais e estaduais, que continuam flexíveis à entrada destes alimentos.