SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A 6ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão de primeira instância que determinou que escola de samba Vai-Vai e duas construtoras suspendam as obras da futura sede da agremiação no Bixiga, na Bela Vista, região central de São Paulo. A decisão foi unânime.
Também foi fixada indenização de R$ 50 mil, referentes aos danos morais coletivos. A ação foi movida pelo Ministério Público de São Paulo. O julgamento ocorreu no último dia 1º.
A escola de samba afirma em nota que não pretende recorrer e que respeita o Poder Judiciário. Ela negocia uma nova sede.
Segundo os autos, a construtora Acciona comprou um imóvel em três terrenos da rua Almirante Marques Leão por causa da desapropriação da sede da Vai-Vai nas imediações da praça 14 Bis, onde atualmente está sendo construída uma das estações da futura linha 6-laranja do metrô.
A escola, assim, deixou o endereço entre as ruas São Vicente e Lourenço Granato em 2021, onde estava havia 50 anos.
Desde então, a escola, maior campeã do Carnaval de São Paulo, com 15 títulos, segue sem uma sede.
A indenização, conforme a Justiça, foi de R$ 9,3 milhões, para compra e reforma do imóvel.
A ação também envolve uma segunda construtora, a Art. Real Eireli.
De acordo com a sentença, no lugar da futura sede havia um galpão que foi demolido sem autorização da prefeitura.
“Houve fiscalização no local, que acarretou o embargo da obra”, diz a juíza Rebeca Uematsu Teixeira, de primeira instância.
“Apesar do embargo, as rés concluíram a demolição do galpão e iniciaram a construção de um novo imóvel, o que acarretou em nova fiscalização e a lavratura de outro auto de embargo”, completa a magistrada.
Em outro trecho, a juíza reforça que era pré-requisito indispensável ao início das obras de demolição e construção a emissão dos alvarás pela Prefeitura de São Paulo. “Sem esses documentos, as obras não poderiam sequer ter sido iniciadas.”
A Acciona diz em nota que não é responsável pela construção da nova sede ou quadra da Vai-Vai e que não teve nenhum envolvimento na escolha e compra do local da nova sede, assim como em qualquer questão que envolve sua reforma.
O argumento é o mesmo apresentado na ação judicial, mas, segundo o Ministério Público, a empresa teve participação nas obras de demolição. Nos autos, a magistrada afirma que houve legitimidade passiva da empreiteira.
De acordo com a Justiça, a construtora Art Eireli foi responsável pelas obras sem alvará.
A reportagem não conseguiu contato com a construtora, que na ação apresentou contestação, em que alegou sua ilegitimidade passiva. Também disse que as obras emergenciais foram realizadas de maneira legal.
No processo, a Promotoria lembra que a escola de samba informou em suas redes sociais que o local a ser construído comportaria 2.500 pessoas e que lá seriam realizados eventos sociais, culturais, feijoadas, festas em ensaios menores (para os desfiles de Carnaval).
“Quando conjugada tal afirmação [trata-se de quadra, não apenas de um prédio administrativo, que pretende reunir ensaios e eventos sociais] ao tamanho do imóvel a ser construído, podemos verificar que haverá concentração de grande número de pessoas no local, o que pode ocasionar relevantes impactos no alvará a ser expedido pelo poder público”, diz outro trecho da sentença.
Na ação, o Ministério Público anexou documentos que apontam que os terrenos estão, segundo o Plano Diretor do município, em uma zona considerada ZEIS 3. Isto é: trata-se de zona “especial de interesse social” e, por isso, “60% da área construída deve ser destinada para habitação à população com renda entre zero e três salários mínimos”, conforme a Promotoria.
Segundo a Vai-Vai, a opção pelo imóvel entre as ruas Rocha com a Marques Leão foi a única viável diante da desapropriação para a realização das obras do metrô.
Com a inviabilidade da construção de uma sede na área, a Vai-Vai tentou fazer uma permuta com a prefeitura para construção de moradia popular no local.
Em troca, a escola de samba pleiteava os prédios onde funcionou o Teatro Zaccaro e da antiga fábrica Eln, ambos na rua Rui Barbosa, também no Bixiga.
Nos locais, além da nova sede social, a Vai-Vai buscava construir um centro cultural comunitário do bairro.
Conforme a prefeitura, porém, a proposta de permuta foi indeferida por falta de amparo legal em abril passado.
Não cabe mais recurso. Mesmo assim, a escola diz que continua em negociação, tanto nas esfera municipal, quanto nas estadual e federal.
“A proposta é que os terrenos da rua Rocha e Almirante Marques Leão sejam utilizados pela prefeitura para construção de moradia social, preferencialmente para permanência da população negra, conforme determina o Plano Diretor sobre o TICP [Território de Interesse da Cultura e da Paisagem] do Bixiga”, afirma a escola.
“Vale ressaltar que a escola segue lutando para preservar suas raízes ancestrais no bairro em que nasceu e se consolidou como um patrimônio cultural da cidade”, diz a Vai-Vai.