BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A Primeira Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) retomará às 9h desta quarta-feira (10) o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) sob pressão ainda maior do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Falta um voto para o colegiado formar maioria pela condenação do político brasileiro.
Na terça (9), enquanto os ministros Alexandre de Moraes e Flávio Dino davam os primeiros votos para condenar Bolsonaro e aliados pela trama golpista, o governo americano ameaçava aumentar as sanções econômicas contra o Brasil e mencionava até um possível uso de força militar para proteger a “liberdade de expressão”.
Trump tem pressionado o Brasil por causa do julgamento. Em julho, quando anunciou as novas taxas sobre produtos brasileiros, o presidente dos Estados Unidos enquadrou a medida como uma retaliação pelo que chamou de “caça às bruxas” contra Bolsonaro, seu aliado na política internacional.
Além disso, o governo americano proibiu parte dos ministros do Supremo de entrar nos Estados Unidos e aplicou sanções financeiras a Moraes.
O julgamento do núcleo principal da trama golpista será retomado com a apresentação do voto do ministro Luiz Fux, que nos últimos meses tem exposto divergências com o relator do processo, Alexandre de Moraes.
A expectativa é que Fux dê um voto longo. Ele sinalizou que deve votar contra o Supremo julgar o caso por entender que os principais réus não têm mais foro privilegiado e, portanto, deveriam ser julgados na primeira instância.
Fux também tem ficado isolado na Primeira Turma do Supremo ao defender a tese de que o crime de abolição do Estado democrático de Direito deve ser absorvido pelo crime de golpe de Estado. Ele entende que os crimes são comuns, e o resultado prático da absorção seria a fixação de uma pena menor para o condenado.
O ministro passou a adotar essa visão no meio deste ano, após anunciar sua insatisfação com o processo contra a cabeleireira Débora Rodrigues, a mulher que pichou a estátua “A Justiça” durante os ataques de 8 de janeiro. Antes, Fux votou em centenas de casos pela condenação por todos os crimes sem nunca divergir de Moraes.
Nos bastidores, o ministro indicou que não pedirá vista (mais tempo para analise) no julgamento, o que atrasaria o caso.
Também faltam os votos da ministra Cármen Lúcia e do presidente da Primeira Turma, Cristiano Zanin. É possível que a maioria dos votos pela condenação de Bolsonaro seja atingida nesta quarta-feira.
Por ser o relator, Moraes foi o primeiro a votar. Em quase cinco horas, o ministro disse que Bolsonaro liderou uma organização criminosa que funcionou de 2021 até os ataques às sedes dos Poderes em 8 de janeiro de 2023. O objetivo do grupo seria permanecer no poder mesmo depois de perder a eleição de 2022 para o atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O ministro mencionou atos que classificou como executórios de tentativa de golpe e destacou o plano “Punhal Verde e Amarelo”, que, segundo a denúncia, previa os assassinatos de Lula, do vice-presidente, Geraldo Alckmin (PSB), e dele próprio.
“Não há nenhuma dúvida de que houve tentativa de abolição ao Estado democrático de Direito, tentativa de golpe e atuação de uma organização criminosa”, afirmou o ministro ao defender a condenação dos oito réus. Para ele, Bolsonaro usou a estrutura do Estado para implementar um “projeto autoritário de poder”.
Bolsonaro poderá ser condenado a mais de 40 anos de prisão se receber a pena máxima. Os réus em julgamento são:
– Jair Bolsonaro, ex-presidente da República e capitão reformado do Exército;
– Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-diretor da Abin;
– Almir Garnier, ex-comandante da Marinha e almirante da reserva;
– Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal;
– Augusto Heleno, ex-ministro do GSI e general da reserva;
– Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro, tenente-coronel do Exército e delator do processo;
– Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa e general da reserva;
– Walter Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil e da Defesa e general da reserva.
A PGR (Procuradoia Geral da República) os acusou dos crimes de organização criminosa armada, abolição violenta do Estado democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado ao patrimônio público e deterioração de patrimônio tombado.
Tanto Moraes quanto Dino votaram pela condenação dos oito réus em todos os crimes apontados pela PGR. Dino, porém, afirmou que Heleno, Paulo Sérgio Nogueira e Ramagem têm menos provas contra si e merecem punições menores que os demais.
Além do movimento de Trump, o julgamento causou reações na política interna do Brasil. O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho de Jair Bolsonaro, disse, enquanto os ministros discutiam o caso na terça-feira, que Moraes votava com raiva.
“Fala com tanta raiva, fala com tanto ódio. Parecia o líder do governo do PT no Supremo proferindo palavras sem embasamento jurídico”, disse Flávio.
O julgamento terminará na quinta (11) ou na sexta-feira (12). Até lá, ministros podem mudar seus votos. A condenação de Bolsonaro, porém, é dada como certa. Como mostrou a Folha, militares pediam ao STF para que o ex-presidente não seja detido em um quartel, e a defesa do político planeja pleitear a prisão domiciliar.