SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Suprema Corte dos Estados Unidos concordou nesta terça-feira (9) em analisar a legalidade das tarifas globais impostas por Donald Trump, abrindo caminho para a decisão que definirá o futuro de uma peça central da agenda econômica do presidente republicano.

Os juízes aceitaram o recurso do Departamento de Justiça contra a decisão de um tribunal inferior que considerou que Trump extrapolou sua autoridade ao adotar a maioria das tarifas com base em uma lei federal destinada a situações de emergência.

O caso, que envolve trilhões de dólares em tarifas alfandegárias na próxima década, foi colocado em tramitação acelerada, com audiências orais agendadas para a primeira semana de novembro.

A Corte também aceitou avaliar uma ação separada contra as tarifas movida pela fabricante de brinquedos Learning Resources, de propriedade familiar.

Em 29 de agosto, o Tribunal de Apelações do Circuito Federal, em Washington, decidiu que Trump foi além de sua competência ao invocar a Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional (IEEPA), de 1977, para aplicar as tarifas.

A interpretação enfraqueceu uma prioridade do presidente em seu segundo mandato. Apesar da decisão, as tarifas seguem em vigor até o julgamento final da Suprema Corte.

As medidas fazem parte da guerra comercial iniciada por Trump desde seu retorno à Casa Branca em janeiro. O confronto tarifário tem gerado atritos com parceiros comerciais, aumentado a volatilidade nos mercados financeiros e alimentado a incerteza econômica global.

Trump transformou as tarifas em instrumento central de política externa, usando-as para renegociar acordos comerciais, extrair concessões e pressionar adversários.

Em abril, ele aplicou tarifas sobre bens de países específicos para reduzir déficits comerciais, além de impor em fevereiro novas taxas a produtos da China, Canadá e México como forma de pressionar no combate ao tráfico de fentanil e outras drogas ilícitas.

O Brasil foi um dos alvos da sobretaxa recíproca de 10% anunciada em abril. A tarifa restante de 40%, estabelecida em julho, também foi invocada com base na IEEPA (Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional), mas ela não é objeto da ação atual.

A IEEPA concede ao presidente poder para lidar com uma “ameaça incomum e extraordinária” durante emergências nacionais. Tradicionalmente, a lei vinha sendo usada para aplicar sanções contra inimigos estrangeiros ou congelar ativos -nunca para impor tarifas.

O Departamento de Justiça argumenta que a lei autoriza tarifas sob suas disposições emergenciais, permitindo ao presidente “regular” importações. Em documento à Corte, a pasta afirmou que “as apostas neste caso não poderiam ser maiores”. Rejeitar o poder de Trump, sustentou, deixaria o país vulnerável a retaliações comerciais e próximo a uma “catástrofe econômica”.

Trump disse que, se perder a causa, os EUA poderiam ser obrigados a desfazer acordos comerciais, o que faria o país “sofrer enormemente”. Segundo o Escritório de Orçamento do Congresso (CBO), os aumentos tarifários poderiam reduzir o déficit nacional em US$ 4 trilhões ao longo da próxima década.

As ações judiciais contra Trump partiram de vários setores. Cinco pequenas empresas importadoras -incluindo uma distribuidora de vinhos e destilados de Nova York e uma varejista de pesca esportiva da Pensilvânia- contestaram as tarifas. Além disso, 12 estados, em sua maioria governados por democratas, também moveram ação.

A Constituição dos EUA concede ao Congresso, e não ao presidente, a autoridade para criar impostos e tarifas. Qualquer delegação desse poder, segundo as ações, deve ser explícita e limitada. O Tribunal de Apelações concordou, afirmando que dificilmente o Congresso pretendia, ao aprovar a IEEPA, conceder ao presidente poder ilimitado para impor tarifas.

O tribunal também apontou que a interpretação ampla da lei pela administração viola a chamada “doutrina das grandes questões” da Suprema Corte, que exige autorização clara do Congresso para ações do Executivo com grande impacto econômico e político.

Antes dessa decisão, o Tribunal de Comércio Internacional, em Nova York, já havia declarado ilegais as políticas tarifárias de Trump, em 28 de maio. Outro tribunal, em Washington, também decidiu que a lei não autoriza as tarifas impostas pelo republicano. Pelo menos oito processos questionam a legalidade da estratégia, incluindo uma ação movida pelo estado da Califórnia.