FLORIANÓPOLIS, SC (FOLHAPRESS) – As 16 unidades de pesquisa ligadas ao MCTI (Ministério da Ciência Tecnologia e Inovação) podem fechar as portas por falta de recursos. Algumas já paralisaram ações, desligaram maquinário básico e serviços, e reduziram equipes.
O alerta foi soado pela SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) e pela ABC (Academia Brasileira de Ciências). Algumas ações, como o monitoramento de desastres climáticos, correm risco de interrupção, e equipes inteiras estão em aviso prévio, alertaram as entidades.
“Não se vislumbra a paralisação das atividades de qualquer vinculada”, diz o MCTI em nota, afirmando também acompanhar o orçamento diariamente.
Mas as suspensões já estão em curso, segundo apurou a reportagem.
Levantamento feito pela SBPC e pela ABC constatou que estão ameaçados as infraestruturas de dados e conectividade, a preservação de acervos científicos e culturais, a manutenção de laboratórios, a operação de relógios atômicos, os telescópios internacionais e o cumprimento de compromissos externos.
As importações feitas pelo CBPF (Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas), por exemplo, foram bloqueadas no dia 2, “em razão da atual criticidade orçamentária que compromete a manutenção da equipe responsável por essa atividade”, aponta a entidade em nota.
Alguns centros científicos já desligam aparelhos estratégicos para reduzir o consumo de energia. Também diminuíram as jornadas dos funcionários, cortaram contratos e suspenderam serviços básicos.
O CBPF encurtou 25% do expediente de terceirizados com redução proporcional de salários. O órgão também concedeu férias coletivas e parciais aos empregados.
“Estamos com dificuldade para pagar a conta de luz”, diz o pesquisador e vice-diretor da CBPF, João Paulo Sinnecker. “Se tiver interrupção severa de energia, pode afetar o parque de equipamentos, que foi conquistado com investimento do ministério e vale mais de R$ 100 milhões.”
“As pesquisas serão afetadas”, diz Sinnecker. Isso sem falar dos laboratórios que são disponibilizados para o uso por outras entidades. “Se são paralisadas as atividades de equipes de apoio, prejudica o ecossistema de pesquisa em física do país inteiro”, afirma.
A dívida com a provedora de luz Light está acumulada em R$ 540 mil. Questionado pela Folha, o MCTI declarou que “atua para sanear a pendência com a maior brevidade possível”.
Dados das unidades de pesquisa apontam que o esgotamento de recursos poderia ocorrer já em agosto para duas instituições (Mast e Inpa), em setembro para 11 (CPF, Insa, CTI, Cetem, Cemaden, ON, MPEG, IBICT, Inpe, Inma e LNCC), em outubro para uma (LNA) e em novembro para outras duas (INT e Cetene). Para o cálculo, foi considerado apenas o mínimo para a manutenção em funcionamento das instituições.
A diretora do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), Regina Alvalá, informou que a liberação de créditos restante está prevista para acontecer de forma escalonada ao longo dos próximos meses.
“Estamos monitorando a situação orçamentária com vistas a minimizar o máximo possível os impactos das restrições dos recursos. Realizamos ajustes possíveis nos contratos. Não obstante, o centro continua monitorando e emitindo alertas para mais de 1100 municípios prioritários”, disse ela por WhatsApp.
O cenário para 2026 preocupa ainda mais. O PLOA (Projeto de Lei Orçamentária) prevê R$ 150 milhões a menos do que o necessário para a execução de tarefas, segundo avaliação das unidades de pesquisa.
À reportagem, a assessoria do MCTI afirmou desconhecer a cifra. “Cumpre ressaltar que o MCTI tem conhecimento das demandas das Unidades de Pesquisa e atua visando o atendimento dentro das regras e limites fiscais do governo, tanto no que se refere ao orçamento do presente exercício quanto ao PLOA 2026.”
Em nota, a SBPC e a ABC recomendaram a concessão de créditos adicionais e suplementares em 2025, execução prioritária e não-contingenciada do FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) para apoio emergencial, articulação interministerial entre MCTI, Planejamento, Fazenda e Casa Civil, planejamento plurianual de financiamento e criação de mecanismos de estabilidade.
As organizações também solicitaram a revisão do PLOA. O governo enviou o texto ao Congresso Nacional no dia 29. “É importante que o parlamento entenda que, se não houver reforço orçamentário discricionário do MCTI, algumas unidades de pesquisa irão parar de funcionar em 2026”, alerta Garcia.
“É desastroso”, reclama Sinnecker, do CBPF. “Vivemos esse quadro com o orçamento de 2025, que é maior do que o previsto para o ano que vem. Sei que o Ministério tem tentado dialogar com o Planejamento, Fazenda, enfim. Mas não tem surtido efeito.”
O MCTI teve aumento de 12,65% no PLOA 2026 se comparado a este ano, porém o valor é consequência do crescimento de 19,8% no FNDCT. Segundo a SBPC, apenas 17,45% das demandas das unidades de pesquisa foram incluídas no texto apresentado pelo Executivo.
O levantamento produzido pela entidade mostra que a instituição que teve maior parcela de seu pedido orçamentário atendido foi o Observatório Nacional, com somente 48,3% do valor foram solicitados R$ 13,99 milhões e a destinação pode ficar em R$ 6,75 milhões.
O caso mais grave é do próprio CBPF citado durante a reportagem, que pediu R$ 19,05 milhões e poderá receber somente R$ 1,16 milhão 6,1% da demanda. O Inpe (Insituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e o IBCIT (Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia) podem receber só 6,5% do solicitado.