BERLIM, ALEMANHA (FOLHAPRESS) – Bastião da política ambiental e da redução de emissões provocadas pelos gases de efeito estufa, a União Europeia ainda não conseguiu definir suas metas climáticas, a dois meses da COP30.

Segundo reportagem do jornal britânico The Guardian, que teve acesso a um documento das negociações, “espaços em branco” ocupam o lugar dos números das chamadas NDCs (contribuições nacionalmente determinadas, na sigla em inglês).

A indefinição reflete uma disputa de vários lados entre os países-membros do bloco, descolada do cotidiano violento da crise climática no continente: mais de um milhão de hectares consumidos por incêndios florestais, marca inédita, no terceiro mês de agosto mais quente da história do planeta.

O número faz parte da última análise do Serviço de Mudanças Climáticas Copernicus, da própria União Europeia, divulgada na noite desta segunda-feira (8).

A temperatura global em agosto, 16,6°C, ficou 1,29°C acima do nível pré-industrial, e a marca para os últimos 12 meses está 1,52°C acima da média estimada para o período da Revolução Industrial (1850-1900), usado como parâmetro para as metas do Acordo de Paris. Pelo tratado, os países se comprometem a limitar o aumento da temperatura global idealmente a 1,5°C.

“Agosto de 2025 foi o terceiro mais quente registrado globalmente. No sudoeste da Europa, o mês trouxe a terceira onda de calor do verão, acompanhada de incêndios florestais excepcionais”, declarou Samantha Burgess, líder climática do Copernicus, em comunicado.

“Com a manutenção incomum do aquecimento dos oceanos, esses eventos sublinham a urgência na redução de emissões e a necessidade crítica de adaptação aos extremos climáticos.”

Na média europeia, o agosto deste ano não está entre os dez mais quentes registrados, notadamente pelo fato de regiões mais ao norte terem experimentado temperaturas abaixo da média no período. Inclusive a Fino-Escandinávia, região geográfica que abrange Noruega, Suécia e Finlândia, que paradoxalmente havia ganhado 2°C extras nos termômetros durante uma onda de calor fora dos padrões em julho.

No sudoeste do continente, porém, o calor ficou acima da média em Portugal e Espanha, palco dos incêndios florestais recordes da temporada. Na França, também assolada por queimadas, o serviço meteorológico local constatou o terceiro verão mais quente já registrado desde 1900, quando começa a série histórica.

O apelo por um pacto de Estados do primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, caiu no vazio, assim como seu alerta sobre manter a União Europeia na transição ecológica.

A UE ainda não ter fixado suas metas climáticas, como mostra o Guardian, é um sinal preocupante, segundo especialistas. Demonstra que a discussão está longe de um consenso na Europa, cuja NDC, se fosse antecipada, poderia estimular a até aqui pífia publicação de metas: apenas 29 dos 197 países que fazem parte da convenção do clima da ONU já entregaram seus objetivos.

A ideia inicial das Nações Unidas era a de que as NDCs fossem entregues a tempo de permitir discussões paralelas à Assembleia Geral da entidade, em 24 de setembro.

A discussão na UE não é apenas sobre números, mas também de como e quando alcançá-los. Pela meta atual, o bloco se compromete a reduzir em 55% a emissão de gases do efeito estufa até 2030, em relação aos níveis registrados nos anos 1990.

A nova NDC, para 2035, deveria projetar emissões líquidas zeradas para 2050, ou seja, alcançar uma redução de 74% a 78% daqui a dez anos, a depender da forma como é calculada; em 2040, a diminuição seria de 90% a 95%.

Como uma meta depende da outra, Bruxelas planejava publicar o corte de 2040 para só então determinar a nova NDC de 2035, necessariamente uma extrapolação do primeiro objetivo. Alguns países, como a França, porém, defendem que os objetivos sejam definidos separadamente, o que ambientalistas veem com preocupação. A mudança implicaria provavelmente em uma redução tanto da NDC quanto da meta para 2040.

Seria mais um entrave às discussões da COP30, em novembro, em Belém, que já precisa esgrimir a ausência dos EUA de Donald Trump, a disputa geopolítica em torno da Rússia e a resistência dos países produtores de petróleo, entre outros desafios.