PARIS, FRANÇA (FOLHAPRESS) – A Assembleia Nacional da França confirmou nesta segunda-feira (8) a esperada queda do gabinete do primeiro-ministro François Bayrou, o que faz o país entrar em um período de incerteza, sem governo e prestes a enfrentar uma paralisação nacional, convocada para quarta-feira (10).
O premiê foi derrubado por uma moção na Assembleia com 364 votos a favor e 194 contrários à sua saída. O próprio Bayrou havia convocado a votação no fim de agosto, diante da resistência a seu projeto de austeridade orçamentária para 2026.
Votaram contra o premiê os deputados da extrema-esquerda, da esquerda moderada e da ultradireita. O governo contou apenas com o centro e a direita. O resultado obriga Bayrou a entregar o cargo ao presidente Emmanuel Macron, o que deve ocorrer formalmente nesta terça-feira (9).
Terminada a votação, as atenções se voltam para a atitude que Macron tomará. Ele pode indicar um novo primeiro-ministro para formar um gabinete com o Parlamento atual; dissolver a Assembleia e convocar novas eleições; ou renunciar, o que anteciparia a eleição presidencial prevista para 2027. No Palácio do Eliseu desde 2017, Macron não pode concorrer a um terceiro mandato de cinco anos.
Em discurso na Assembleia, a líder da sigla de ultradireita RN (Reunião Nacional), Marine Le Pen, disse que convocar novas eleições legislativas “não é uma opção, mas uma obrigação” para Macron. “Este momento marca o fim da agonia de um governo fantasma”, disse Le Pen. Ela previu que a crise atual servirá para “preparar a grande alternância” de poder.
Ainda não se sabe que dimensão terá a paralisação de quarta-feira, batizado como Bloquons Tout (“Vamos bloquear tudo”). A incerteza se deve à descentralização do movimento e a outra convocação de greves, para 18 de setembro, reflexo das divisões entre centrais sindicais e partidos de oposição.
Seja como for, a insatisfação da população com a crise é palpável. Segundo pesquisa publicada pelo jornal La Tribune du Dimanche, 46% dos franceses apoiam a Bloquons Tout, 28% são contra, e 26% dizem estar indiferentes.
Bayrou, político centrista de 74 anos, ficou apenas nove meses no cargo de premiê, sucedendo o direitista Michel Barnier, ainda mais efêmero -três meses de governo. Os mandatos curtos são reflexo da falta de uma maioria parlamentar clara na França desde as eleições legislativas de 2024.
Desde que Bayrou anunciou o voto de confiança, visto como suicídio político -sua coalizão, com pouco mais de um terço dos deputados, tinha chance quase nula de vitória–, começaram as articulações para a formação de um novo governo.
Sobre a aposta arriscada, Bayrou disse que “o maior risco é deixar as coisas continuarem sem mudar nada”. Apreciador de analogias, em seu discurso comparou a França a um paciente com grave hemorragia e a um barco que ruma para o naufrágio. “Se quisermos salvar o navio, temos que agir sem demora. Há 51 anos, todos os anos gastamos mais do que os recursos disponíveis para o ano”, argumentou. Foi interrompido algumas vezes por gritos do plenário. “Isso me permite beber água, boa ideia”, ironizou.
Uma das alternativas pós-Bayrou para Macron seria indicar outro nome de centro ou de direita. Entre os nomes cogitados estavam os atuais ministros da Economia, Éric Lombard; da Justiça, Gérald Darmanin; do Trabalho e Saúde, Catherine Vautrin; e dos Exércitos, Sébastien Lecornu. O problema desses cotados é que seriam vistos como mais do mesmo e teriam a mesma dificuldade de Bayrou para obter uma maioria.
Uma nova possibilidade seria a indicação de um político da esquerda moderada. Olivier Faure, 57, líder do Partido Socialista (PS), declarou aceitar o cargo, desde que algumas concessões fossem negociadas na busca do equilíbrio orçamentário, como um aumento do imposto para os mais ricos. Porém, parte da direita já anunciou que não apoiará um governo comandado pelo PS. Em sua fala, Bayrou ironizou a proposta da oposição de taxar os mais ricos. Disse ser “pensamento mágico” inconstitucional e que geraria fuga de capital. “O 1% dos contribuintes mais ricos assume uma grande parte dos investimentos privados.”
Como pano de fundo da crise há a possibilidade da chegada ao poder da RN, o partido de ultradireita que lidera as pesquisas tanto para as eleições legislativas quanto para uma eventual eleição presidencial. Marine Le Pen tenta se livrar de uma pena por desvio de fundos do Parlamento Europeu, que a torna inelegível. O recurso será julgado em janeiro do ano que vem. Ela afirma que é elegível enquanto não houver condenação definitiva. Caso Le Pen não possa concorrer, o nome mais forte passa a ser o de seu pupilo e jovem presidente do partido, Jordan Bardella, que completa 30 anos neste mês.