BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Com sete meses de mandato, Hugo Motta (Republicanos-PB), o mais jovem deputado a presidir a Câmara, acumula altos e baixos e enfrenta o peso da sombra de Arthur Lira (PP-AL). O antecessor e padrinho político segue articulando nos bastidores com poder de escolha de pautas e convencimento de bancadas que alimenta dúvidas sobre a real autoridade do atual ocupante do cargo.
Em agosto, em ao menos três situações Lira esteve na linha de frente das negociações, embora apareça muito pouco em entrevistas e plenário, bem ao estilo de toda a sua carreira política.
Foi no gabinete de Lira, que fica em pavimento inferior bem próximo ao de Motta, que se articulou o fim do motim bolsonarista que ocupou a mesa do plenário da Câmara. Lá foi costurado o compromisso de duas votações que ainda não ocorreram, mas que permanecem na ordem do dia das maiores bancadas da Casa: a da anistia e a da PEC da blindagem.
A volta do recesso parlamentar foi marcada pela ocupação das mesas dos plenários da Câmara e do Senado por bolsonaristas em protesto contra a decretação de prisão domiciliar do ex-presidente.
Motta só conseguiu retornar à cadeira de presidente após o acordo costurado com bolsonaristas no gabinete de Lira, e mesmo assim, enfrentou o constrangimento de quase bater em retirada após alguns deputados de oposição se negarem a sair de seu posto.
Motta tentou articular a suspensão do mandato desses parlamentares, mas não conseguiu apoio na Mesa da Casa, órgão de comando composto por ele e mais seis deputados.
Na tentativa de resguardar a autoridade, negou-se a colocar em pauta, de imediato, os termos do acordo do qual não participou, mas a pressão sobre ele permanece.
Dias depois do motim, a Câmara tentou votar à jato a chamada PEC da blindagem, que é defendida por Lira e pelo centrão e tem como principal ponto dar ao Congresso o poder de barrar investigações e processos contra parlamentares medida que vigorou até 2001 e foi derrubada após amplo histórico de impunidade.
A proposta do PL de incluir a suspensão de todos os processos e investigações em andamento, além da resistência de alguns partidos, acabou levando Motta a adiar a votação.
Nas últimas semanas foi a vez da anistia. Após o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) liderar uma ofensiva pela votação da proposta de perdão a Jair Bolsonaro (PL) e outros acusados de envolvimento em atos golpistas, Motta admitiu em público a possibilidade de colocar o tema em votação, o que pode ocorrer após a provável condenação do ex-presidente nesta semana, no julgamento da trama golpista.
O presidente da Câmara vinha resistindo à pressão até então. Pelo menos em público, é defensor, assim como o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), de um texto mais brando do que o proposto por bolsonaristas e encampado pelo centrão.
No último dia 1º, Lira visitou Bolsonaro em sua residência em Brasília, onde o ex-presidente cumpre a prisão domiciliar. Após esse encontro, a pressão pela votação da proposta escalou, com participação de Tarcísio e do ex-presidente da Casa.
Aliados de Motta dizem que as votações expressivas na Câmara mostram que ele tem apoio do plenário, afirmam que há propostas estruturantes em discussão sendo lideradas por ele, como a reforma administrativa, e dizem que a relação com Lira é de parceria. A Folha procurou o parlamentar, mas não houve manifestação.
Eleito aos 35 anos de idade faz 36 na quinta-feira, Motta sempre teve bom trânsito entre as diversas correntes políticas da Câmara. Considerado habilidoso e eficiente cumpridor de missões, orbitou poderosos em seus quatro mandatos de deputado foi um dos principais aliados de Eduardo Cunha, que presidiu a Casa em 2015 e 2016, e também se manteve próximo aos sucessores Rodrigo Maia (2016-2021) e o próprio Lira (2021-2025).
Tanto assim que seu nome foi retirado da manga pelo alagoano e anunciado como sucessor após meses de disputa entre outros postulantes, como Elmar Nascimento (União Brasil-AP) e Antonio Britto (PSD-BA).
Motta foi eleito com facilidade em primeiro turno, com leque de apoio que ia do PT ao PL, partido a quem indicou disposição de colocar em votação a proposta de anistia assunto que o antecessor prometeu resolver, mas não cumpriu.
No primeiro semestre de mandato, e sem a resolução da questão da anistia, a confiabilidade dos acordos costurados por ele foi questionada até por aliados.
Passou por altos e baixos na relação com o governo, alternando momentos em que foi considerado mais alinhado a Lula o petista o convidou para viagens e reuniões na residência oficial, e Motta participou de atos no Palácio do Planalto com ocasiões em que marcou posição contra, chegando a virar alvo das redes petistas com sátiras como a do “Hugo Nem se Importa”.
Essa reação se deu no momento de maior estremecimento com o Palácio do Planalto, após liderar a votação que suspendeu as regras de alteração das alíquotas do IOF proposta por Lula, dias após ter discutido o assunto com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e de ter classificado a reunião como “histórica”.
No desfile de 7 de Setembro realizado neste domingo, foi a principal autoridade de fora da órbita do governo a comparecer ao palanque ao lado de Lula, na Esplanada dos Ministérios.