BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) – Na noite do último domingo (7), Javier Milei teve na província de Buenos Aires sua maior derrota eleitoral desde que assumiu a Casa Rosada, em 2023. Já o peronismo, que o presidente argentino prometia varrer do mapa, teve sua primeira grande vitória após o fracasso do governo de Alberto Fernández (2019-2023).

Com 99% dos votos apurados, o peronismo, que tem no governador da província, Axel Kicillof, seu principal expoente, obteve 47,28% dos votos totais até agora (3,82 milhões); a força política de Milei, A Liberdade Avança, que concorreu junto com o PRO (Proposta Republicana, do ex-presidente Mauricio Macri), conseguiu 33,71% (2,724 milhões de votos).

Foi a primeira vez desde a volta da democracia na Argentina que a província mais importante do país teve eleições legislativas de metade do mandato presidencial separadamente das eleições nacionais, que acontecem no próximo dia 26 de outubro, em um novo teste para a Casa Rosada.

Milei, que há dois meses prometia arrasar na província e no encerramento da campanha falou em um empate técnico, acabou quase 14 pontos atrás, um resultado que surpreendeu até os peronistas e o fez admitir a “clara derrota”.

A vantagem dos peronistas foi garantida com a vitória dos distritos 1 e 3, que compõem o chamado Conurbano Bonaerense (o agrupamento de municípios que circundam a cidade de Buenos Aires). A capital da Argentina não faz parte da província que tem o mesmo nome e já havia votado em maio.

A distribuição de cadeiras não coincide necessariamente com os votos totais, já que o mínimo necessário para ser eleito varia em cada distrito. No domingo, alguns deles escolheram apenas deputados e outros somente senadores.

Os peronistas vão passar a ter maioria no Senado e se mantêm como primeira minoria na Câmara, embora a força de Milei tenha crescido nas duas Casas. No Senado provincial, o peronismo tem atualmente 21 cadeiras e ficará com 24; a aliança de A Liberdade Avança e PRO tem 12 e passará a 15. Na Câmara, os peronistas têm 38 e ficarão com 39; mileístas e macristas têm 24 e agora ficam com 31.

A UCR – Somos Buenos Aires teve 5,26% ou 425 mil votos, perdendo nove lugares na Câmara e 4 no Senado; a Frente de Esquerda (4,37% ou 353,3 mil votos) conseguirá manter seus dois deputados.

O mileísmo teve sua imagem desgastada pouco antes da votação, por um caso de suposta corrupção envolvendo a irmã do presidente, Karina Milei, após a divulgação de áudios de um ex-funcionário do governo apontando que ela seria beneficiada por um esquema de corrupção na compra de medicamentos para pessoas com deficiência.

Milei, que esperava chegar às eleições provinciais e às nacionais, em outubro, com a bandeira da queda de inflação também chegou ao pleito com dados negativos na economia, como a estagnação e queda nos últimos meses da atividade econômica e intervenções no câmbio.

A estratégia do peronismo, por sua vez, foi concorrer com nomes que ocupam cargos importantes na província. No primeiro distrito -que agrupa municípios da zona norte da Grande Buenos Aires, como Tigre, Vicente López e San Isidro- a lista para o Senado foi encabeçada pelo ministro da Infraestrutura e Serviços Públicos de Kicillof, Gabriel Katopodis, e conseguiu cinco vagas.

No terceiro, a parte sul do conurbano e onde os peronistas são historicamente mais fortes (lá estão La Matanza, Lanús e Lomas de Zamora, onde a caravana de Milei foi recebida com pedradas durante a campanha), a vice de Kicillof, Verónica Magario, concorreu garantindo dez cadeiras.

Mesmo em distritos onde o peronismo tradicionalmente tem mais dificuldade, como o quarto (no interior do país, em cidades como Junín e Hipólito Yrigoyen), a força do governador saiu em primeiro lugar.

Os mileístas saíram na frente no quinto distrito (Tandil, Pinamar Villa Gesell), ganhando três lugares no Senado, e no sexto para a Câmara (Bahía Blanca, Salliqueló, Saavedra), conquistando cinco lugares.

“Sem dúvida no plano político hoje tivemos uma derrota clara e se alguém quiser reconstruir o que deve ser feito é aceitar os resultados, tivemos um revés eleitoral”, disse o presidente, ao reconhecer a derrota.

A decisão de separar as eleições provinciais partiu de Kicillof, que por isso entrou em atrito com Cristina Kirchner, de quem ele foi ministro. Com o resultado de ontem, o governador se impõe como um dos principais nomes da oposição. No ato de comemoração, em La Plata, ele fez um duro discurso contra Milei.

“Os números explicaram a Milei que ele não pode mais governar com ódio, com insultos. Que as pessoas com deficiência não podem ser abandonadas”, discursou o governador. “Disseram a ele que tem de parar de insultar a democracia, o federalismo e nossa Constituição.”

Cristina -que está em prisão domiciliar e planejava se candidatar a uma vaga de deputada provincial, mas perdeu seus direitos políticos com a confirmação da sua condenação a seis anos de prisão- mandou uma mensagem para a militância. “Decidiram dar um basta a um presidente que parece não entender que precisa governar para todos. Espero que este pronunciamento popular o ajude a entender que ele não pode exercer seu cargo da maneira como faz.”