BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – As oito horas de sustentações orais de defesas dos réus da trama golpista de 2022 no STF (Supremo Tribunal Federal) devem provocar pouca mudança sobre as posições dos ministros da Primeira Turma.

Depois da primeira parte do julgamento do núcleo central do processo, a tendência de conclusão para Jair Bolsonaro (PL) e boa parte dos envolvidos ainda é a condenação.

De acordo com ministros e interlocutores ouvidos pela Folha, haverá divergências entre as posições dos magistrados, mas não é possível prever suas extensões, e essas não devem alcançar as figuras-chave do caso.

A Turma tem cinco integrantes, dos quais apenas dois ficaram sensibilizados com algumas das defesas feitas da tribuna. As sustentações dos principais acusados, como Bolsonaro ou o general Walter Braga Netto, no entanto, não teriam alterado a visão dos magistrados sobre os casos deles.

O STF deu início na última terça-feira (2) ao julgamento da ação penal que tem Bolsonaro como líder de uma tentativa de golpe de Estado. Ao longo da semana, foram ouvidos o relatório do caso, a PGR (Procuradoria-Geral da República), com a acusação, e as defesas dos réus.

A partir desta semana será a primeira vez que os ministros da Primeira Turma vão se manifestar sobre o mérito do caso, ou seja, sobre a culpabilidade de cada um dos oito do grupo.

A previsão é de votos longos, a começar pelo do relator que, sozinho, deve tomar ao menos um dia de julgamento. Os demais ministros também devem precisar de boas horas para se manifestar.

Na última sexta (5), Cristiano Zanin, presidente do colegiado, atendeu a pedido de Moraes e agendou mais duas sessões para o julgamento, ambas na quinta (11). Com isso, a sessão do plenário do STF à tarde foi cancelada. A ideia é conseguir concluir o julgamento até a sexta (12).

Divergências são esperadas, devem começar já na fase de apreciação das questões processuais e seguir até a definição das penas aos condenados, que também pode gerar um debate acalorado.

Mas o destino da maior parte dos réus deve ser a condenação, de acordo com dois ministros do STF, dois assessores do tribunal e três advogados afirmaram à Folha.

No geral, os ministros analisam os questionamentos processuais feitos pelas defesas antes de se posicionarem sobre as condutas em discussão.

A primeira parte do debate em torno da delação do tenente-coronel Mauro Cid será feita nessa etapa de preliminares, já que algumas defesas pedem a anulação do acordo. Desde o início do caso, o ministro Luiz Fux manifestou reservas quanto à colaboração e pode abrir divergência com Moraes neste ponto.

A tendência é que a delação, um dos fios condutores da denúncia da PGR, seja mantida, mas há a expectativa de que suscite um debate sobre os termos e benefícios concedidos a Cid por ter colaborado com as investigações.

O advogado Jair Alves Pereira, defensor do ex-ajudante de ordens, afirmou que uma eventual redução dos benefícios da delação do militar, como sugerido pela PGR, representaria na prática o fim do instituto da colaboração premiada.

A acusação propôs, nas alegações finais, sair de um possível perdão judicial para a redução de somente um terço da pena final.

As defesas de Bolsonaro e Braga Netto focaram na tentativa de desconstrução da delação.

O advogado de Braga Netto, José Luis de Oliveira Lima, disse que há ao menos três pontos para atestar que a colaboração é viciada e deve ser anulada: o fato de os termos terem sido assinados com a Polícia Federal sem a anuência do Ministério Público, a falta de apresentação de provas para corroborar as informações e os indícios de coação do tenente-coronel.

Caso os ministros tirem força da delação de Cid, precisarão elencar as demais provas que sustentem cada um dos crimes analisados, o que é provável que seja feito por meio de mensagens, depoimentos de testemunhas e documentos, como a minuta golpista.

Na última semana, o PGR Paulo Gonet rebateu o argumento da dependência da denúncia na delação de Cid. “A denúncia não se baseou em conjecturas ou suposições frágeis. Os próprios integrantes da organização criminosa fizeram questão de documentar quase todas as fases da empreitada”, disse.

No julgamento sobre o mérito da denúncia, é baixa a chance de que os ministros tenham sido convencidos pelas defesas dos réus quanto à inocência ou baixa participação da maioria deles.

A defesa Bolsonaro afirmou ao STF que a denúncia contra o ex-presidente não tem nenhuma prova que o vincule ao plano de assassinato de autoridades ou aos ataques do 8 de Janeiro.

“O presidente não atentou contra o Estado democrático de Direito”, disse Celso Vilardi.

“Não há uma única prova que vincule o presidente ao Punhal Verde e Amarelo, Operação Luneta e 8 de Janeiro. Nem o delator, que eu sustento que mentiu contra o presidente da República, nem ele chegou a dizer de participação de Punhal, Luneta, Copa e 8 de Janeiro. Não há uma única prova.”

Bolsonaro foi defendido por Celso Vilardi e Paulo da Cunha Bueno. Vilardi usou a maior parte da uma hora de argumentação destinada a eles. É um dos advogados criminalistas mais renomados do país, professor e experiente em casos complexos e rumorosos. A sustentação dele foi elogiada, mas a denúncia contra Bolsonaro estaria robusta.

Os generais e ex-ministros Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira são os réus com maior chance de serem aliviados no julgamento.

Segundo a avaliação feita por dois ministros do Supremo e advogados ouvidos pela Folha, as acusações contra Heleno se mostraram mais frágeis em comparação com as dos demais.

No caso de Paulo Sérgio, testemunhos favoráveis e uma mudança no curso de sua defesa podem favorecê-lo. Mas ainda pesa contra ele a atuação agressiva contra o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) durante o processo eleitoral de 2022.

Após a definição sobre as condenações, os ministros passam ao debate sobre a dosimetria das penas, que deve também tomar energia.

Neste momento, o colegiado fixa quantos anos cada um ficará preso, somando as penas de cada crime. A Turma precisará chegar a um consenso. Esta decisão impacta na concessão de benefícios, como o cálculo para mudança de regime ou suspensão condicional de pena.