BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Meses após ter sido alvo de queixas e cometido uma gafe durante os depoimentos da trama golpista, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, voltou à zona de conforto ao falar no julgamento do núcleo principal do caso. Sua manifestação teve avaliação positiva entre ministros no STF (Supremo Tribunal Federal).
Gonet se posicionou na sessão da última terça-feira (2) do julgamento de forma sucinta, em que reiterou acusações sobre a trama golpista envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e refutou argumentos das defesas.
Ele falou por cerca de uma hora e dez minutos, apesar de ter um limite de tempo de duas horas para sua manifestação.
Conhecido pelo tom polido e por usar frases de difícil compreensão, Gonet usou um artifício para deixar sua fala mais didática: fez uma introdução com comentários antes de entrar na parte mais detalhada das acusações.
Ele tinha feito o mesmo anteriormente, por escrito, ao protocolar a denúncia sobre o caso, em fevereiro.
A introdução da fala de terça-feira, de tom rígido, afirmava que a ausência de uma punição à tentativa de golpe poderia incitar novas iniciativas autoritárias.
“Não reprimir criminalmente tentativas dessa ordem [golpista], como mostram relatos de fato aqui e no estrangeiro, recrudesce ímpetos de autoritarismo e põe em risco o modelo de vida civilizado”, afirmou.
O procurador-geral da República fez a manifestação em um momento em que já tinha segurança de continuar sua gestão à frente do Ministério Público. Uma semana antes, o presidente Lula (PT) assinou a indicação para mais dois anos de mandato. Gonet tem que passar por aprovação do Senado para que isso aconteça.
Poucos meses antes, em maio, ele havia sofrido com reclamações de parte de ministros do Supremo por sua atuação durante as audiências de testemunhas nos processos da trama golpista.
Em maio, sob reserva, ministros do Supremo criticaram o desempenho de Gonet durante o depoimento do ex-chefe do Exército Marco Freire Gomes.
Um dos motivos foi a maneira pela qual o procurador-geral conduziu o questionamento à testemunha, sem levantar contradições e fazendo digressões para confirmar se a resposta do general poderia ser entendida conforme está narrado na denúncia.
Freire Gomes disse, por exemplo, que não se espantou quando Bolsonaro apresentou a primeira minuta do decreto golpista aos comandantes militares. Disse que o ex-presidente tratou o texto como um estudo, embasado na Constituição, e que voltaria ao assunto após consultar outros auxiliares.
“Posso dizer, então, que ele estava preparando os senhores, com razões jurídicas, para apresentar mais a seguir medidas de intervenção que ele já estava antecipando que ia tomar?”, perguntou Gonet.
O advogado Celso Vilardi, que defende Bolsonaro, disse que a pergunta de Gonet buscava direcionar a resposta do general. O ministro Alexandre de Moraes negou a questão de ordem, e o microfone de Vilardi foi cortado.
“Doutor Paulo Gonet, não necessariamente. Talvez ele tenha nos apresentado por questão de consideração, já que alguns aspectos dos documentos se referiam à GLO [Garantia da Lei e da Ordem], estado de defesa e estado de sítio”, respondeu o ex-comandante.
Dias depois, no depoimento de Aldo Rebelo, Gonet cometeu uma gafe durante uma sessão tensa, na qual Moraes até ameaçou prender o ex-ministro da Defesa.
Com o microfone aberto enquanto Moraes falava, o PGR disse: “Fiz uma cagada agora”. A reação dele foi registrada após perguntar ao ex-ministro se ele considerava que a Marinha teria desistido do golpe de Estado porque o Exército não havia aderido às conspirações.
O questionamento foi considerado muito amplo, abrindo espaço para uma opinião em vez do testemunho sobre fatos. “Doutor Paulo, pergunte objetivamente, e a testemunha, por favor, responda objetivamente. Qual é a pergunta, doutor Paulo, por favor?”, disse Moraes antes da fala de Gonet com o microfone aberto.
Na terça-feira, após a sua fala no julgamento de Bolsonaro, Gonet chegou a ser alvo de algumas reclamações de advogados dos acusados, porque teve que se ausentar após ler a peça de acusação.
No lugar dele, o Ministério Público Federal foi representado pelo subprocurador-geral da República, Paulo Vasconcelos Jacobina, que é quem normalmente atua nas sessões da Primeira Turma.
No fim do dia, Jacobina afirmou que o procurador-geral da República tinha uma agenda marcada havia meses na Ilha de Marajó, no Pará. Ele receberia uma contribuição da rainha da Suécia ao combate aos crimes de abuso contra crianças.
Na próxima semana, segundo a PGR, Gonet voltará a participar das sessões de julgamento, quando serão apresentados os votos dos ministros.