SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Cansado de ficar parado em ruas e avenidas de São Paulo, o empresário Gustavo Fávero, 36, dono de uma empresa do ramo de alimentos em São Bernardo do Campo, desde o início do ano mudou sua rota e passou a usar o rodoanel quando precisa ir à região da Ceagesp, na zona oeste paulistana. Fazer parte do trajeto em rodovia é uma tentativa de fugir do caos urbano.

“Também costumo deixar o carro estacionado perto de alguma estação e vou de metrô quando tenho clientes na região da [avenida] Vergueiro. Está impossível dirigir por lá”, afirma.

A lentidão no trânsito da cidade de São Paulo está próxima de atingir os níveis de congestionamento de 2019, antes da pandemia.

Dados da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) mostram que, no mês passado, a média diária de lentidão foi de 421 km —o indicador mede o trânsito apenas em dias úteis.

O número é o maior do ano e para agosto desde 2019, quando o índice atingiu 475 km.

A média diária nos oito primeiros meses de 2025 foi de 364 km, a mais alta desde aquele ano (481 km). O indicador atual pode crescer, principalmente por causa dos tradicionais congestionamentos de fim de ano.

De acordo com a empresa gerenciada pela prefeitura, o índice em agosto chegou 89% do registrado antes da pandemia. Quando somado todos os meses do ano, atualmente está em 76%.

Para a CET, o aumento de lentidão no trânsito de São Paulo pode ser atribuído a uma combinação de fatores, que incluem condições climáticas adversas, especialmente no mês de janeiro, aumento da frota de veículos, eventos que impactaram a mobilidade urbana, interferências viárias, tendência à redução do home office e aumento do modelo híbrido de trabalho.

“Para mitigar os impactos, é realizado monitoramento e são feitos ajustes operacionais constantes”, diz a empresa.

Números da própria companhia mostram que por dez vezes, o índice de lentidão foi superior a 1.000 km no mês passado.

O maior engarrafamento acabou registrado às 19h do dia 7, quando o anda e para chegou a 1.335 km. Esse foi o recorde de trânsito na cidade de São Paulo, desde que a CET, em parceria com o aplicativo Waze, passou a considerar no cálculo 20 mil km de ruas e avenidas da capital, em março de 2023.

Sergio Ejzenberg, engenheiro e mestre em transportes pela USP (Universidade de São Paulo), afirma que diferentemente de 2019, quando havia dois grandes picos, pela manhã e à tarde, hoje a lentidão está mais pulverizada ao longo do dia, graças à flexibilidade de horários a partir da mudança de comportamentos desde a pandemia.

Os piores horários no mês passado foram entre 17h e 19h30. No pico da manhã, o pior índice acabou registrado às 7h30 do dia 6, uma quarta-feira, com 650 km de lentidão, bem abaixo do caos de início de noite.

“É preciso avançar nas formas de medição para entender o reflexo do trânsito hoje. Não basta informar apenas o tamanho da lentidão, mas também o tempo de viagem e comparar com o de antes”, afirma Ejzenberg.

Sem saber quando isso vai acontecer, o especialista diz acreditar que a cidade vai ultrapassar a marca de 2019, entre outros, pelo aumento na frota —o número de veículos registrados na cidade passou de 8,5 milhões em agosto daquele ano para quase 10 milhões em julho passado (dado mais recente), conforme o Ministério dos Transportes.

Também porque a queda na qualidade no transporte público tem afugentado usuários para o individual. “O trânsito é consequência de transporte público ruim”, diz. Como mostrou a Folha, multas e queixas de passageiros contra sistema de ônibus disparam no município.

O consultor de mobilidade urbana Sérgio Avelleda afirma que cidades como São Paulo perderam uma grande oportunidade de redesenhar o espaço urbano durante a pandemia, quando as ruas estavam vazias, para favorecer transporte público e ciclovias.

“Carro é eficiente quando pouco usado. Quando é muito utilizado, não há espaço para todos nas ruas”, afirma. “É preciso uma política pública decisiva que atraia as pessoas ao transporte público.”

O trânsito de São Paulo só não piorou mais, afirma, porque o efeito home office mantém pessoas trabalhando em casa às segundas e sextas-feiras.

Para a analista de inteligências de negócios Bruna Alvarenga, 29, muitos que trocaram o transporte público pelo individual na pandemia não voltaram mais. Isso, acredita, entupiu as ruas de carros e motos.

“Dirigir em São Paulo está se tornando cada vez mais desgastante e insalubre. O volume de veículos cresceu de forma expressiva”, afirma ela, que mora em Osasco, na região metropolitana, e trabalha em Pinheiros, na zona oeste da capital.

Em nota, a CET afirma que adota continuamente ações de engenharia de tráfego, fiscalização e orientação aos motoristas e pedestres, além de se integrar a outros órgãos da prefeitura para planejar melhorias no sistema viário e no transporte público.

“A reversão de quadros de maior lentidão envolve planejamento de médio e longo prazo, incentivo a modais alternativos e ajustes operacionais conforme a necessidade”, diz a empresa.

Sobre investimento em transporte público, a gestão Ricardo Nunes (MDB) tem dito que foram implantados 54 km de faixas exclusivas para ônibus entre 2021 e 2024 e que entregou novo trecho do corredor Itaquera, na zona leste.

Afirma que também estão em andamento projetos dos BRTs Radial Leste e Aricanduva, além dos corredores Celso Garcia e Itaquera.