SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Estudo da consultoria econômica Tendências, encomendado por fintechs, aponta que a agenda de transformação digital do Banco Central e o aumento de instituições financeiras digitais no Brasil contribuíram para a redução no spread bancário diferença entre os juros cobrados pelo banco e a taxa que ele mesmo paga para captar dinheiro.
Divulgado nesta sexta-feira (5), o levantamento “Mais Acesso, Menos Juros: A revolução silenciosa do Banco Central do Brasil” foi patrocinado pela Zetta, aliança multilateral que reúne fintechs como Nubank, PicPay e Wise.
“O nosso principal objetivo dessa análise é trazer evidências concretas dessa agenda, que oportunistas querem frear para manter o status quo. Ainda há muita concentração no Brasil, 65% dos depósitos estão nos cinco maiores bancos e 6% com as fintechs”, diz Eduardo Lopes, presidente da Zetta e diretor de políticas públicas do Nubank.
O trabalho da Tendências reúne diversas pesquisas sobre o efeito das recentes medidas do BC na economia. Entre eles se destacam dados do REB (Relatório de Economia Bancária, do BC) sobre a portabilidade de crédito. Em 2022, o relatório indicou que, nas localidades com mais de uma instituição financeira, a possibilidade de migrar o empréstimo entre elas gerou uma redução média de 0,8 ponto percentual na taxa de juros, o que representa uma queda de aproximadamente 5% no spread médio.
Também é citado o estudo “Credit Portability and spreads: Evidence in the Brazilian market” (portabilidade de crédito e spreads: evidências no mercado brasileiro), conduzido por Paulo Azevedo, Paulo Ribeiro e Gabriela Rodrigues e publicado em 2019 na revista Journal of Economics and Business, que identificou um spread entre 21% e 49% menor no crédito ao consumidor (que conta com portabilidade) em relação ao crédito para empresas (que não conta com essa possibilidade).
Outro trabalho destacado é mais recente, de 2025, conduzido pelo professor Marco Bonomo. Ele indica que a portabilidade de crédito no Brasil gerou aumento de bem-estar equivalente a 0,2% do consumo anual, ou seja, é como se brasileiro pudesse comprar 0,2% a mais só por causa da possibilidade de trocar sua dívida de uma instituição para outra.
De acordo com dados do BC, atualmente a portabilidade representa apenas 0,8% das concessões mensais de crédito. No consignado, onde a transferência de empréstimos é mais fácil, essa participação sobe para 12,1%.
Segundo Otávio Damaso, consultor do Nubank e diretor do BC de 2015 a 2024, esses números são ainda maiores em uma comparação com os brasileiros que já eram bancarizados antes das fintechs, visto que o risco de crédito dessa população tende a ser menor.
“Ainda há muita coisa a ser feita, com lacunas de atendimento significativas, por isso a convicção de que esse movimento [de desbancarização] está só no início”, disse Damaso.
Mesmo com a redução no custo, o spread bancário no Brasil segue um dos maiores do mundo. Dados do BC de julho apontam que a média desta diferença entre os juros cobrados e os pagos por bancos está em 20,31%.
Para Maílson da Nóbrega, sócio-fundador da Tendências, uma das explicações para o alto custo está na carga tributária, além da taxa básica de juros em dois dígitos atualmente em 15% ao ano.
“O Brasil é um dos poucos países que tributa as transações financeiras. De 20% a 30% do spread pode ser explicados por tributação. Precisamos acabar com essa isso e aumentar a concorrência bancária”, diz o ex-ministro da Fazenda.
A pesquisa da Tendências também cita estudo do BC deste ano que aponta uma redução de 3,7 pontos percentuais nas taxas de crédito pessoal não consignado entre os clientes que estão no Cadastro Positivo. Para quem conseguiu melhorar o score de crédito, essa redução no juros pode chegar a até 8,7 pontos percentuais.
Além disso, o Pix também incrementou o orçamento do brasileiro, por não ter custo para pessoas físicas. Considerando uma cobrança de R$ 10 por TED (média com base em dados do Banco Central para transferências eletrônicas realizadas por pessoa física em canais digitais), o estudo calcula que o Pix gerou uma economia de R$ 26 bilhões à população entre 2021 e 2024.
O estudo destaca que tal impulso na economia foi bem maior do que o custo de desenvolvimento total do Pix, que ficou em torno de US$ 4 milhões (cerca de R$ 20,8 milhões, considerando a cotação da época).
Outro dado citado vem do relatório mais atualizado do FMI (Fundo Monetário Internacional) sobre a economia brasileira, que aponta que a competição de fintechs reduz as taxas de empréstimo em 2,9 pontos percentuais e a margem líquida de juros em 1,3 ponto percentual.
O trabalho aponta ainda que no Brasil 58% dos clientes de fintechs tiveram acesso a serviços financeiros antes indisponíveis, o maior patamar da América Latina. Isso beneficiou cerca de 47% dos municípios brasileiros que não têm agências bancárias, segundo dados do BC.
Dessa forma, entre janeiro de 2018 e maio de 2025, o total de usuários ativos no Sistema Financeiro Nacional e no Sistema de Pagamentos Brasileiro mais do que dobrou. Em contas PJ, que incluem os microempreendedores individuais, o crescimento foi de 312%, para 13,7 milhões de empresas. No caso das pessoas físicas, a alta foi de 114%, para 163 milhões de usuários.
As fintechs pequenas foram alvos de críticas na última semana, após a Operação Carbono investigar algumas instituições menores por suposto envolvimento com o crime organizado graças a brechas na regulação as maiores fintechs já seguem as mesmas regras que bancos tradicionais e prestam informações à autoridade monetária. Após a operação, a Receita Federal igualou o tratamento de todas as fintechs ao dos bancos
No entanto, ainda há instituições financeiras que não precisam passar pelo crivo do Banco Central, o que está previsto para mudar apenas em 2029, quando todas as instituições em funcionamento, incluindo as de pagamento (IPs) precisarão ter esse aval.