SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O projeto de lei que regulamenta o mercado de fidelidade no país, como o de milhas aéreas e troca de pontos em produtos, ganhou adesão das empresas do setor após uma queda de braço que travou a tramitação do texto na Câmara dos Deputados ao longo do mês passado.

Nessa quinta-feira (4), a Abemf (Associação Brasileira das Empresas do Mercado de Fidelização) anuncia publicamente o apoio ao novo relatório do projeto, assinado pelo deputado Jorge Braz (Republicanos-RJ) e costurado após debate com representantes do setor.

O texto propõe o fortalecimento do mercado de compra e venda, com fiscalização sobre as empresas, proteção dos consumidores e a proibição de práticas predatórias, como a venda de milhas aéreas por intermediadoras com a promessa futura de aquisição dos pontos —caso exposto na crise da 123Milhas.

Caso o texto seja aprovado, as empresas serão obrigadas a comunicar mudanças no regulamento dos programas com mínimo de três meses de antecedência e a transferência de pontos será feita seguindo regras estabelecidas previamente nos programas.

Uma das premissas da regulação é que todas as informações dos programas sejam claras aos consumidores, bem como a facilitação do acompanhamento de pontos acumulados pelos clientes.

“Seguir com o projeto da forma como está hoje é garantir que esses benefícios continuem chegando aos consumidores brasileiros. Qualquer retrocesso nesse sentido significaria prejuízos principalmente para o consumidor, mas também óbvios danos ao mercado como um todo, que sofreria com o baixo engajamento do participante e a perda de receitas”, disse em nota o diretor executivo da Abemf, Paulo Curro.

A associação defende que a venda indiscriminada de pontos, sem uma regulamentação, seria oposta ao que o setor propõe, que é a fidelização de marcas. Para contornar essa lacuna, o texto atual propõe que as empresas terão o controle de indicação sobre parceiros e intermediadores dos pontos e milhas de determinado programa.

“Essa prática, além de desvirtuar o conceito original dos programas —que é a fidelização construída por meio do relacionamento do cliente com a marca— expõe os programas e seus usuários a operadores e agências de viagens que atuam de forma informal e, muitas vezes, à revelia dos regulamentos dos próprios programas. Essa atuação paralela traz insegurança ao sistema e abre margem para fraudes”, diz Curro.

Dados da Abemf apontam que 15 milhões de passagens aéreas são emitidas anualmente com o resgate de pontos e milhas. Por outro lado, mais de 16 milhões de produtos e serviços, incluindo descontos ou uso de pontos para pagamentos diversos deixam de ser resgatados pelos consumidores.

DISCORDÂNCIAS

Criado pelo deputado Amom Mandel (Cidadania-AM), o texto original estabelecia regras somente para a oferta de programas de milhagem e proibia a venda de pontos para terceiros. O deputado defende que os interesses dos clientes devem ser maiores do que os das companhias aéreas, que promovem mudanças nas regras de seus programas sem transparência.

Ao longo de sua tramitação, no entanto, o projeto deixou de enquadrar somente milhas aéreas e se tornou uma regulamentação do setor de fidelização, que abrange programas de instituições financeiras e fornecedores de bens e serviços.

Um dos pontos de embate que Mandel temia era a transformação das milhas em ativos financeiros, a abertura de brechas para a taxação dos consumidores e o possível aumento no valor das passagens para quem fosse resgatar milhas.

Além de reconhecer as milhas como ativos, o projeto sequer discute uma possível taxação, deixando caminho aberto para aplicação de valores pelo governo. E como esses pontos e milhas são ativos, o projeto também prevê que eles poderão ser transferidos em caso de falecimento do detentor dos pontos.

Nos bastidores, comenta-se que, diante da possibilidade de uma nova frente de arrecadação, o governo não quis renunciar a uma possível taxação das milhas. A queda de braço, no entanto, foi deixada de lado para que as discussões do projeto avancem.

“A priori, sou favorável, participei da articulação, porém ainda tenho preocupações quanto à possibilidade de taxação sobre as milhas aéreas”, disse Mandel à reportagem.

Outro ponto que não está claro envolve a precificação das milhas. O texto de Mandel estipulava uma pontuação máxima para o resgate de passagens, indicando que ela não poderia ser superior ao dobro da pontuação cobrada na baixa temporada para o mesmo trecho.

Com o novo texto, esse limite deixa de existir e a flutuação de preços tende a seguir a livre determinação das companhias, o que é visto como positivo para a Abemf.

O texto deve ir ao plenário nos próximos dias e passar por uma nova bateria de discussões antes de sua votação final.