FORTALEZA, CE, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Pesquisadores da Universidade Federal do Ceará descobriram uma forte presença de cobalto nas reservas de manganês em uma mina do estado, o que pode alçar o Brasil a um dos maiores produtores do metal. O cobalto é um mineral crítico para o desenvolvimento de baterias, inclusive de carros elétricos, além de equipamentos de defesa e aeronaves.

A descoberta é incomum, porque geralmente o cobalto é encontrado em minas de cobre e níquel, como acontece na República Democrática do Congo e na Indonésia, países que controlam quase 90% da produção mundial desse mineral. Mas os pesquisadores brasileiros encontraram presença significativa do metal também acoplado ao manganês, mineral em abundância no Brasil.

Para o estudo, foram consideradas amostras de rochas de cinco depósitos de manganês no Brasil localizados em Ocara (CE), Conselheiro Lafaiete (MG), Serra do Navio (AP), Marabá (PA) e Parauapebas (PA), além de outros três no continente africano: na República Democrática do Congo, Gabão e Gana. O maior índice de ocorrência foi encontrado no Ceará, chegando a 0,1% do minério de manganês, numa escala de 800 a 1.000 partes do minério por milhão (ppm).

“Isso é muito alto. O teor médio dele na natureza é 0,002% de ocorrência”, diz o professor Felipe Holanda –a pesquisa também foi feita pelo doutorando Evilarde Uchoa, do Serviço Geológico do Brasil.

Em comparação, o minério de níquel extraído na Indonésia tem geralmente um teor de cobalto que varia entre 0,05% e 0,2%; já na RDC, a concentração pode superar 1% do minério de cobre. No Brasil, onde a extração de cobalto era feita até 2016 a partir da mineração de níquel em Goiás, o teor do metal era de 0,04%.

“O Ceará contém muitas minas de manganês e, partindo dessa descoberta, nós começamos a olhar para esse minério com outros olhos”, diz Holanda. “Estamos tentando criar um método eficiente para separar o cobalto do minério de manganês e, uma vez feito isso, há possibilidade de novos rendimentos em cima de muitas minas de manganês subexploradas ou pouco rentáveis. Essa pesquisa deve ser feita em parceria com o Instituto Federal do Rio Grande do Norte.

A reserva total confirmada de manganês no Ceará supera 900 mil toneladas, sendo 300 mil toneladas somente na Lagoa do Riacho, mina de onde veio o minério de manganês analisado. Mas, segundo os pesquisadores, ainda não é possível identificar o tamanho exato dos depósitos de cobalto.

“Para saber o tamanho do depósito de cobalto, só com trabalho de detalhe com folha de sondagem e análise química para saber o teor médio e a distribuição na mina para calcular a reserva com segurança”, afirma Uchoa. Apenas a partir dessas análises mais detalhadas será possível detectar a viabilidade econômica da separação dos metais.

A mina de manganês pesquisada é operada pela Libra Ligas Brasil, que produz ligas metálicas no Ceará. Segundo o presidente da empresa, Cândido Quindere, a jazida passará por um processo de caracterização a partir de janeiro de 2026 para identificar a presença de outros minerais nas rochas. O processo terá duração de um ano e será decisivo para a empresa dar sequência ao investimento.

MERCADO DE COBALTO

Apesar de ter uma das maiores reservas de cobalto do mundo (10º lugar, empatado com os EUA), o Brasil não produz cobalto desde 2016, quando a Votorantim Metais encerrou sua operação de níquel em Goiás. Hoje, o mineral é extraído nas minas de níquel da Anglo American em Goiás –recentemente vendida para os chineses– e da Vale no Pará, mas na rota dessas empresas o cobalto atua como impureza do ferroníquel, produto comercializado pelas mineradoras. Ou seja, atualmente não há comercialização direta de cobalto no Brasil.

Uma empresa britânica, no entanto, quer começar a construir já no ano que vem uma planta de níquel e cobalto no Piauí direcionada para a cadeia de baterias. Do total da produção da Brazilian Nickel, 5% será de cobalto, que será vendido para refinarias acoplado ao minério de níquel. O governo americano já demonstrou interesse em apoiar o projeto com US$ 550 milhões, 40% do orçamento necessário, e o BNDES também mantém conversas com executivos da empresa.

Assim, como acontece com vários outros minerais críticos, as maiores reservas de cobalto estão em países em desenvolvimento (como RDC e Indonésia), mas quase todo refino do cobalto está concentrado na China, ainda que o país venha diminuindo proporcionalmente a produção de baterias feitas com o metal. Além disso, as maiores minas na RDC pertencem à europeia Glencore, à chinesa CMOC e à cazaque ENRC. Na Indonésia, os chineses mandam.

“Hoje em dia, a maior parte do cobalto vai para baterias de todos os tipos, incluindo aquelas que estão em celulares e outros dispositivos eletrônicos, bem como baterias de carros”, diz Dinah McLeod, diretora geral do Instituto Cobalto, que reúne as principais empresas do setor. Mas o metal ainda pode ser encontrado em células de combustível e turbinas de avião, incluindo nos caças F-16.

McLeod pontuou à Folha nunca ter visto cobalto acoplado a manganês em uma escala economicamente viável, mas pontua que há espaço para o setor crescer para fora da China. “Você pode encontrar cobalto apenas em algumas partes do mundo, mas é possível processar em muitos outros lugares, e aí que achamos que há um elo perdido. E sei que há algumas empresas brasileiras que estão começando a pensar sobre isso”, diz.