BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O ex-assessor de Alexandre de Moraes Eduardo Tagliaferro afirmou que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) forjou relatórios para justificar uma operação contra empresários bolsonaristas por mensagens de teor golpista, em agosto de 2022.

Como revelou a Folha de S.Paulo, a ação da Polícia Federal à época teve como único embasamento uma reportagem do portal Metrópoles. Quando o sigilo da operação foi suspenso, porém, havia nos autos um relatório como base da decisão do ministro.

Em audiência na Comissão de Segurança Pública do Senado Federal nesta terça-feira (2), Tagliaferro, que chefiou a Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação do Tribunal Superior Eleitoral, apresentou prints e documentos que demonstrariam que o ministro sequer tinha acesso, à época, às mensagens dos empresários.

O ex-assessor diz que o laudo técnico que embasou aquela operação, datado do dia 22 de agosto de 2022, um dia antes da operação, foi produzido, no dia 28 daquele mês, seis dias depois, o que seria provado pelos metadados do documento.

A data, diz, foi fraudada para dar a impressão de que a operação autorizada por Moraes contra os empresários bolsonaristas não havia se baseado apenas na reportagem.

As conversas entre os empresários no grupo, reveladas pelo site Metrópoles, traziam afirmações como a do empresário José Koury, do Barra World Shopping, que dizia preferir um golpe à volta do PT e que “ninguém vai deixar de fazer negócios com o Brasil” caso o país vire uma ditadura. Os empresários negaram qualquer intenção golpista nos diálogos privados.

Nesta terça, Tagliaferro disse que os laudos foram elaborados por ele mesmo a pedido do gabinete do ministro, após a operação.

Uma série de reportagens da Folha mostrou em agosto do ano passado, com base em conversas de Tagliaferro, que, nas investigações do inquérito das fake news, Moraes agiu fora do rito, adotando atitudes que, em um processo normal, são atribuições da Polícia Federal (o órgão que investiga) e da Procuradoria-Geral da República (o órgão que faz a acusação).

As reportagens mostraram que o gabinete de Moraes ordenou por mensagens e de forma não oficial a produção de relatórios pela Justiça Eleitoral para embasar decisões do próprio ministro contra bolsonaristas no inquérito no Supremo Tribunal Federal durante e após as eleições de 2022.

Diálogos aos quais a reportagem teve acesso mostram como o setor de combate à desinformação do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), presidido à época por Moraes, foi usado como um braço investigativo do gabinete do ministro no Supremo.

A Folha teve acesso a mais de 6 gigabytes de mensagens e arquivos trocados via WhatsApp por auxiliares de Moraes, entre eles Tagliaferro e o seu principal assessor no STF, o juiz instrutor Airton Vieira.

A sessão desta terça foi comandada pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e foi realizada ao mesmo tempo do primeiro dia do julgamento pelo Supremo Tribunal Federal da trama golpista durante o governo Bolsonaro.

Flávio afirmou que vai enviar toda a documentação ao presidente do Supremo, Luís Roberto Barroso, e que vai pedir que ele suspenda o julgamento.

Ele também afirmou que irá encaminhar essas informações ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que promove um tarifaço contra o Brasil em pressão contra o julgamento do ex-presidente.

Também na sessão, Tagliaferro disse que o atual procurador-geral da República, Paulo Gonet, atuou ao lado de Moraes fora do rito processual correto nas investigações que têm como alvo bolsonaristas.

O ex-diretor do TSE apresentou prints de conversas de aplicativo de celular que, segundo ele, se referem a conversas com Gonet (na época em que este era vice procurador-geral eleitoral, em 2022) e com um assessor, de nome Lucas.

Essas conversas provam, de acordo com Tagliaferro, a participação de Gonet em procedimentos que extrapolaram as regras jurídicas.

De acordo com os prints apresentados à comissão, Gonet, à época vice da PGE (Procuradoria-Geral Eleitoral), teria pedido a Tagliaferro uma lista de decisões sobre remoção de conteúdo nas redes.

“Se houver registro das [publicações] que foram mantidas, seria ainda melhor”, diz o então vice-PGE.

Pouco depois, o assessor teria enviado uma planilha e dito: “Levantamos os processos, agora vamos pegar as decisões para o senhor”.

Em outro print, Lucas (que seria secretário-executivo da PGE à época) envia uma mensagem a Tagliaferro a pedido de Gonet para falar “sobre um assunto que o Dr. Paulo tratou com o Ministro Alexandre [de Moraes] hoje mais cedo”. À época, Moraes era presidente do TSE.

As trocas entre os dois assessores, segundo os prints, seguiram até março de 2023. Na sessão transmitida pelo Senado, Tagliaferro chegou a exibir para a câmara o número de telefone de Gonet.

A assessoria do procurador não se manifestou até a publicação deste texto, assim como a assessoria do ministro, que relata o julgamento de Bolsonaro nesta terça.