PEQUIM, CHINA (FOLHAPRESS) – O governo do Japão teme por seus cidadãos vivendo na China. Segundo o Ministério de Relações Exteriores do país, o desfile desta quarta-feira (3) que comemora a vitória da China sobre o Japão na Guerra da Resistência e o fim da Guerra Mundial Antifacista, como é chamada a Segunda Guerra Mundial por Pequim, tem sentido “antijaponês”.

A orientação é para que os cidadãos vivendo no país vizinho tenham cuidado especial no período.

“Ao sair, esteja extremamente atento ao seu entorno, incluindo a aproximação de indivíduos suspeitos, e faça todos os esforços para garantir sua segurança. Em particular, se estiver viajando com crianças, tome precauções suficientes, como viajar em grupos de várias pessoas”, afirma a pasta.

O site da embaixada do país na China orienta ainda que os cidadãos sejam discretos, o que inclui evitar falar japonês em voz alta, comportamentos chamativos com concidadãos, usar roupas que mostrem a nacionalidade e espaços públicos lotados e com grande circulação de japoneses.

“Se vir indivíduos ou grupos suspeitos, não se aproxime e saia imediatamente”, afirma o órgão.

Há ainda uma série de documentos da embaixada e dos consulados distribuídos pelo país que apresentam, além de orientações gerais e de segurança, casos em que instituições e cidadãos japoneses foram vítimas de ataques.

Em resposta, o regime chinês afirma que é um país aberto e seguro e que saúda pessoas de todos os países, incluindo o Japão, para estudar, trabalhar, fazer negócios e viver. “Nós continuaremos a ter ações efetivas para garantir a segurança de cidadãos chineses e estrangeiros na China sem discriminação”, disse Pequim.

No último dia 26, o porta-voz do regime chinês Guo Jiakun pediu que o Japão prestasse esclarecimentos sobre uma reportagem que afirmou que o governo japonês estava usando canais diplomáticos para pedir que outros países asiáticos não comparecessem ao desfile militar.

“Se o Japão realmente deseja virar esta página em relação às questões históricas, deve encarar e refletir sobre sua história de agressão com sinceridade”, afirmou Jiakun.

O evento que acontece na praça Tiananmen, em Pequim, celebra a vitória chinesa nos conflitos que ocorreram entre as décadas de 1930 e 1940, com foco na guerra com o país vizinho que começou graças às tentativas de expansão territorial do Império Japonês.

O saldo de mortos, feridos e destruição dos combates é controverso. O Museu Nacional da Segunda Guerra Mundial nos Estados Unidos estima 20 milhões de mortes, enquanto o regime chinês contabiliza 35 milhões de óbitos militares e civis, considerando como início o incidente Mukden de 1931, quando o Japão invadiu a Manchúria e deu início a uma ocupação que duraria quase 15 anos.

Durante a presença japonesa na China, o Exército imperial cometeu uma série de crimes de guerra contra a população local —um dos mais conhecidos é o chamado massacre de Nanjing, quando soldados japoneses mataram mais de 200 mil civis e prisioneiros de guerra chineses em um período de seis semanas, com milhares de casos de estupro.

Na celebração desta semana, o líder Xi Jinping receberá mais de 20 lideranças, entre eles o russo Vladimir Putin e o norte-coreano Kim Jong-un, e fará uma revista das tropas chinesas, além de um discurso. Entre os preparativos para a comemoração estão inúmeros ensaios no centro da capital, um robusto esquema de segurança e a inauguração de memoriais.

Segundo o professor Edward Vickers, docente na Universidade de Kyushu (Japão), há um forte sentimento antijaponês na China e o risco de incidentes são maiores perto de eventos como o desfile militar.

“Portanto, se você é um japonês na China, por favor, seja particularmente cuidadoso nessas datas”, diz ele, que também é titular da cátedra Unesco em Educação para a Paz, Justiça Social e Cidadania Global na mesma instituição. “Basicamente, mantenha-se discreto.”

Uma questão maior, afirma Vickers, é que muitos japoneses nem sequer sabem a razão das comemorações desta semana, uma vez que os eventos lembrados por eles sobre a Segunda Guerra são os embates com os EUA, especialmente as bombas atômicas.

“Quer dizer, mesmo com a maior parte dos combates tendo ocorrido na China, e a maior parte do sofrimento tendo sido infligido aos chineses”, afirma. “E, claro, um dos principais motivos pelos quais ela [a guerra] é lembrada dessa forma aqui é porque foram os americanos que derrotaram o Japão.”