BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A espera para receber precatórios (dívidas de sentenças judiciais) devidos pela prefeitura e pelo Estado de São Paulo pode demorar até quatro vezes a mais com a aprovação da PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que deve ir à votação nesta terça-feira (02), no Senado Federal.
O cálculo foi feito pela Comissão Especial de Precatórios da OAB (Ordem de Advogados de São Paulo) e leva em conta simulações, obtidas pela Folha, feitas com precatórios alimentares. Esse tipo de dívida trata de valores considerados essenciais para o sustento do credor, como salários atrasados, pensões, aposentadorias e benefícios previdenciários. Esses precatórios têm prioridade no pagamento em relação aos de natureza comum.
A OAB estima que o prazo de um precatório alimentar devido pelo governo do estado de São Paulo expedido para o Orçamento de 2017, que levaria dois anos para ser depositado, pode demorar dez anos caso a PEC seja aprovada. Nesse exemplo, o volume dessas dívidas que precisaria ser pago antes desse credor receber é de R$ 6 bilhões.
Já o tempo estimado de pagamento de um precatório da Prefeitura de São Paulo do Orçamento de 2011 subiria de três para 12 anos.
“O tempo para quitar a fila de precatórios aumenta drasticamente para os precatórios de todos os entes”, afirma o presidente da Comissão Especial de Precatórios da OAB-SP, Vitor Boari. Ele cita que um precatório do Estado da Bahia do Orçamento de 2016 pode demorar 15 anos, ante um prazo estimado hoje em quatro anos.
Segundo ele, o aumento do prazo será consequência de medida incluída na PEC que reduz o volume de recursos que estados e municípios são obrigados a destinar para o pagamento dessas dívidas.
No caso do governo, o repasse cairia de 3,64% para 1% da RCL (Receita Corrente Líquida), o que representaria uma redução do repasse atual de R$ 8,59 bilhões para R$ 2,65 bilhões. Na prefeitura, o repasse cairia de 5% para 2,5% da RCL de R$ 4,88 bilhões para R$ 2,44 bilhões.
A votação da PEC em segundo turno entrou na pauta do Senado. A proposta já foi aprovada pela Câmara. “O maior risco é o Senado aproveitar a distração do julgamento no STF para aprovar a PEC, quando ninguém estará atento ao tema”, diz Boari, numa referência ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro da trama golpista.
“Demonstramos como a proposta reduz os pagamentos, aumenta o tempo de espera e, por fim, corrói o valor final a ser recebido pelo credor”, afirma ele.
A PEC também altera a forma de correção do valor devido. A regra atual, baseada na taxa Selic, é substituída por uma fórmula de correção de IPCA mais 2% de juros de mora. As simulações da OAB apontam para uma perda de até 30% no poder de compra do valor a ser recebido.
Para a OAB, a PEC é inconstitucional porque acaba com o prazo de pagamento e mexe na correção dessas dívidas. Já para a CNM (Confederação Nacional dos Municípios), que negociou a proposta, a medida equaciona o pagamento de precatórios.
“Com a situação atual, os municípios precisam equacionar uma verdadeira bomba fiscal até 2029”, diz a confederação, em nota. De acordo com a CNM, entre 2023 e 2024, o volume de precatórios aumentou de R$ 89 bilhões para R$ 105 bilhões, crescimento de 18%. “Os municípios estão fazendo um tremendo esforço fiscal para o pagamento dos precatórios e ainda sim o seu estoque só cresce”, diz a entidade.
O governo federal tem interesse na aprovação da PEC porque ela retira as despesas de precatórios do teto de gastos e prevê um mecanismo de transição de dez anos para que a União incorpore o estoque desses valores na meta fiscal de resultado das contas públicas.
A transição começa em 2027. A cada ano, 10% do total de precatórios passará a ser incorporado à meta de resultado primário prevista na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias). Assim, ao final de dez anos, o valor total estará dentro da meta.
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ENTENDA O QUE MUDA COM A NOVA PEC DOS PRECATÓRIOS
Como ficam os precatórios de estados e municípios?
– Desvinculação da Receita Corrente Líquida para o pagamento de precatórios, que hoje varia de acordo com o valor necessário para quitar o estoque em 2029
– Entes terão índices entre 1% e 5% da RCL fixados a partir do estoque de precatórios em 31 de dezembro
– Percentual será revisto em 2036
– Valores serão corrigidos por IPCA (inflação oficial) mais 2% ou taxa Selic, o que for menor
Como ficam os pagamentos de precatórios (dívidas decorrentes de decisão judicial) da União?
– A partir de 2026, as despesas com precatórios saem do teto de gastos do arcabouço fiscal (a regra para as contas públicas)
– A partir de 2027, precatórios passam a contar na meta fiscal de resultado primário das contas públicas maneira escalonada
– A regra de transição prevê 10% dos precatórios na meta a cada ano
– Correção monetária passa a ser pelo IPCA mais 2% ou Selic, o que for menor
O que muda na Previdência Social?
– As dívidas dos estados, municípios e do Distrito Federal com o Regime Geral da Previdência Social poderão ser parceladas
– Parcelamento em até 25 anos
– Correção considera IPCA mais juros reais de 0% a 4%
– Parcela limitada a 1% da RCL mensal média
– Redução de 40% de juros e encargos legais e 25% dos honorários advocatícios da União
O que muda no PIS e Pasep?
– Receitas dos regimes próprios de previdência não entram na base de cálculo de PIS e Pasep
O que muda para os fundos públicos e o BNDES?
– De 2025 a 2030, até 25% do superávit de fundos públicos da União poderão ser usados para o financiamento de projetos estratégicos ou financiamento reembolsável a projetos de enfrentamento à mudança climática. O BNDES é o principal beneficiário porque é o banco responsável pela gestão do Fundo Clima