SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Estado de São Paulo vai ter que pagar o traslado do corpo de Jefferson de Sousa Santos —morto a tiros de fuzil após ser rendido por dois policiais militares no Brás, na região central de São Paulo— para Craíbas, em Alagoas. Ele foi morto em 13 de junho.

A decisão liminar é da juíza Renata Yuri Tukahara Koga, da 11ª Vara de Fazenda Pública, de 29 de agosto. No texto, a magistrada reconhece a responsabilidade objetiva do Estado no caso, que deverá reparar o dano pela morte, incluindo o pagamento de despesas com o funeral e o transporte do corpo do jovem, que estava em situação de rua. A ação foi movida pela Defensoria Pública de São Paulo.

“Entendo que há elementos suficientes para configuração da suposta responsabilidade civil estatal ação de um agente público, dano e nexo causal entre eles, a ensejar o dever de reparar o dano”, diz trecho da decisão.

Dois policiais militares foram presos pela Corregedoria após terem matado Jefferson, que tinha 23 anos. O porta-voz da Polícia Militar, coronel Emerson Massera, afirmou que os agentes mataram o homem mesmo depois de ele se render.

Segundo relato do tenente Alan Wallace dos Santos Moreira e do soldado Danilo Gehrinh, denunciados sob acusação de homicídio doloso, a vítima teria tentado pegar a arma de um deles. A versão relatada por eles no boletim de ocorrência, no entanto, foi desmentida por imagens das câmeras corporais.

Em nota, a SSP (Secretaria da Segurança Pública) de São Paulo afirmou que os policiais seguem presos no Presídio Militar Romão Gomes, enquanto a Corregedoria conduz o inquérito policial militar. “A corporação reafirma que não tolera excessos ou desvios e que os agentes responderão nas esferas disciplinares e judiciais.”

Na noite de 13 de junho, por volta das 20h23, a viatura em que estavam Moreira e Gerinh estacionou ao lado do viaduto 25 de Março, no Brás. Jefferson aparece nas imagens pela primeira vez descendo de uma árvore.

Ele é questionado pelos policiais por alguns minutos e depois levado para trás de uma pilastra do viaduto, onde estaria escondido de câmeras de segurança na rua. Como mostrou a Folha, a câmera corporal do tenente Moreira, que dispara o fuzil, estava descarregada. Às 21h24, quando o jovem está sob a mira do fuzil, fica nítido que ele chora enquanto tenta conversar com os PMs. Ele morreria um minuto depois.

As imagens mostram que ele não faz movimentos bruscos no momento em que é alvejado, colocando suas mãos à frente do corpo lentamente. Vinte segundos antes de ser alvo dos tiros, ele estava com as mãos na cabeça e de costas para os policiais.

QUEM ERA JEFFERSON DE SOUSA

Há seis anos, Jefferson de Sousa Santos trabalhava descarregando caminhões e nas roças de Craíbas, em Alagoas.

Em 2019, duas semanas após a morte da mãe, Adeilda, ele deixou a cidade onde cresceu e se mudou para São Paulo, onde teria emprego garantido numa pizzaria. Em menos de um ano estava desempregado, viciado em drogas e vivendo na rua.

Como não tinha celular, o contato com a família só ocorria quando Jefferson conseguia convencer alguém na rua a deixá-lo usar um telefone. Em março, ele havia avisado a irmã que pensava em voltar para Craíbas. “Ele falou bem assim: ‘eu quero ir embora, quero sair dessa vida'”, contou a irmã dele, Micaela Soares, 20.

Ela disse que, nos últimos cinco meses, a família tentou fazer com que algum conhecido viajasse a São Paulo para encontrá-lo e levá-lo de volta a Craíbas. Devido ao vício de Jefferson, a família descartava a hipótese de depositar dinheiro em alguma conta bancária para que ele comprasse a passagem.