CURITIBA, PR (FOLHAPRESS) – A defesa da empresária Iracema Correia São Tiago, que afirma ser proprietária de 82% da Vila de Jericoacoara, conhecido destino turístico do Ceará, afirmou nesta segunda-feira (1º) que “em hipótese alguma abrirá mão de seus direitos” e contestou a ação judicial movida pela PGE (Procuradoria-Geral do Estado) na semana passada. O órgão agora argumenta que há um suposto equívoco de cartório na matrícula de um dos imóveis reivindicados por ela.

Em nota encaminhada à Folha de S.Paulo, a defesa de Iracema afirmou que, mesmo que a PGE estivesse certa em relação ao equívoco no cartório, ainda assim ela seria dona de 47% da Vila de Jericoacoara.

“Apesar da certeza da regularidade das informações constantes nas matrículas, é indiscutível que, mesmo sendo desconsideradas as áreas agora suscitadas pelo Estado, o que se admite apenas para debate, Iracema permanece, induvidosamente, como proprietária de 42,39 hectares (ou 47%) na Vila de Jericoacoara, sendo inócua a discussão”, disse trecho.

A Vila de Jericoacoara tem 88 hectares no total e ela seria dona de 73,5 hectares. Mas, na nota, a empresária também voltou a defender o acordo extrajudicial que já havia sido feito com a PGE, e no qual ela concordava em ficar apenas com as áreas não ocupadas da Vila, preservando casas e comércios já instalados há décadas no local.

As áreas desocupadas na Vila somam aproximadamente 18 hectares. “Após diversas reuniões, foi firmado o acordo destinando a ela 5 hectares do total a que ela teria direito, renunciando a 13 hectares livres e à indenização milionária, não acarretando qualquer impacto financeiro ao Estado e nem nas relações sociais da Vila de Jericoacoara”, argumentou a defesa da empresária.

Em 2024, a PGE havia reconhecido a escritura pública de compra dos terrenos apresentada pela empresária, firmando o acordo extrajudicial, mas recuou após repercussão negativa do caso.

Entidades ligadas a moradores e comerciantes de Jijoca de Jericoacoara, município que abriga a Vila de Jericoacoara, criticaram o acordo, assim como o Ministério Público do Estado do Ceará, que cobrou análise mais aprofundada da escritura pública.

Diante dos protestos, a PGE decidiu suspender o acordo com a empresária no final de 2024 e pediu que órgãos como Idace (Instituto do Desenvolvimento Agrário), Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) estudassem o caso.

Agora, a PGE afirma que na perícia realizada pelos três órgãos “constatou-se equívoco cometido pelo cartório de Jijoca de Jericoacoara no procedimento de unificação de matrículas e averbação de georreferenciamento realizados em 2007”.

“A perícia apontou que uma área de posse foi indevidamente incorporada à propriedade sem os trâmites legais cabíveis”, disse a PGE, em nota encaminhada à Folha de S.Paulo neste sábado (30).

Com base nisso, a PGE decidiu ir à Justiça Estadual. A ação judicial, protocolada na última quarta-feira (27), vai tramitar na Vara Única da Comarca de Jijoca de Jericoacoara. Já o acordo segue suspenso até análise final do caso pela Justiça Estadual.

Lucimar Marques, presidente do Conselho Comunitário da Vila de Jericoacoara, disse nesta segunda que a posição da PGE representa uma “vitória da comunidade”. “É fundamental que a verdade venha à tona e que Jericoacoara seja protegida de interesses privados que não respeitam sua história e coletividade”, disse, em nota.

Iracema sustenta que a área reivindicada tem origem na década de 1980, quando seu então marido, o empresário José Maria Machado, começou a adquirir terrenos na região com o objetivo de cultivar cajueiros e coqueiros. Ela se divorciou do empresário em 1995, e, na partilha de bens, ficou com parte desses imóveis. Machado morreu em 2008.

Iracema argumenta ainda que jamais foi notificada da arrecadação da Vila de Jericoacoara pelo governo do Ceará, entre os anos de 1995 e 1997, e só descobriu que tinha direitos sobre os imóveis há três anos.

“Em 2022, ao consultar um escritório de advocacia, a proprietária tomou conhecimento de que o processo de arrecadação possuía nulidade, não prescrevendo com o tempo, e que a própria matrícula do imóvel do Estado (Vila de Jericoacoara) ressalvava o direito de propriedade de titulares anteriores”, disse a defesa da empresária.