SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Pouco mais de dois meses após a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) pôr fim, em definitivo, às operações da Voepass, a aviação regional do país encolheu ainda mais e ficou concentrada, sobretudo, nos voos da Azul Conecta –braço da Azul que atua no segmento.

De acordo com o último relatório de demanda e oferta do órgão regulador, em julho deste ano, a Azul Conecta transportou 5.208 passageiros. Em julho do ano passado, a Map e a Passaredo, que atuavam com o nome fantasia Voepass, haviam transportado, juntas, quase 99,4 mil passageiros (em rotas que incluíam grandes aeroportos e outros menores).

O resultado da Azul Conecta em julho representa uma queda de 34,6% em relação ao mesmo período do ano passado. Entre janeiro e março deste ano, a companhia encerrou as operações em 14 cidades brasileiras, entre elas Campos (RJ), Mossoró (RN), Três Lagoas (MS) e Ponta Grossa (PR).

O fim das operações nesses municípios ocorreu pouco antes de a Azul pedir a entrada no processo de Chapter 11 (equivalente à recuperação judicial) em maio.

Desde julho, a Azul também está ajustando mais de 50 rotas com margem 17 pontos percentuais abaixo da média da companhia. O processo inclui redução da frequência de voos ou até eliminação da rota.

Segundo a companhia, os ajustes levam em consideração uma série de fatores que vão desde o aumento nos custos operacionais da aviação, impactados pela crise global na cadeia de suprimentos e a alta do dólar, até questões de disponibilidade de frota, bem como o seu atual processo de reestruturação.

Outra empresa do segmento, a Abaeté Aviação anunciou em agosto um reforço na malha para a alta temporada, que vai de dezembro deste ano a fevereiro de 2026. Serão 460 voos no período, com oferta de 4.140 assentos, alta de 16% na comparação com a última alta temporada.

De acordo com a empresa, o crescimento foi impulsionado pelo turismo na Bahia e pelo aumento da conectividade internacional a partir de Salvador. A Abaeté realiza, somente, duas rotas, que ligam Salvador a Morro de São Paulo e a Boipeba, dois tradicionais destinos turísticos do estado.

Segundo Héctor Hamada, CEO da Abaeté Linhas Aéreas, a empresa decidiu ampliar a malha porque a Bahia vive um crescimento expressivo do turismo, impulsionado inclusive pela conectividade internacional em Salvador.

“Em março registramos um aumento de 50% no número de estrangeiros em nossas rotas, por exemplo. Voos como o Paris–Salvador, da Air France, ajudam nesse resultado. O verão concentra naturalmente a maior procura por destinos como Morro de São Paulo e Boipeba, e, como única companhia 100% regional, conseguimos responder rapidamente a essa demanda”, diz.

A Abaeté Aviação transportou 556 viajantes em julho deste ano, um aumento de 43% em relação ao mesmo período de 2024, segundo a Anac. Apesar disso, o resultado representa apenas 0,006% do total de passageiros transportados no mercado doméstico no mês (cerca de 9,03 milhões).

O Ministério de Portos e Aeroportos lançou, em junho, o AmpliAR (Programa de Investimentos Privados em Aeroportos Regionais), com a promessa de fortalecer a aviação regional no país. Por meio da iniciativa, concessionárias que já possuem contrato com a União para atuação no setor aéreo poderão assumir a gestão de terminais aéreos deficitários. O programa foi criado em parceria com o TCU (Tribunal de Contas da União).

Na primeira fase do programa, o governo colocará em oferta pública, e de forma individualizada, 19 aeroportos regionais localizados na Amazônia Legal e no Nordeste. Segundo o ministério, essas regiões registram déficit acentuado de infraestrutura aeroportuária.

Por meio de um processo simplificado, as concessionárias poderão disputar os aeroportos, e vencerá quem propor o maior desconto em relação ao preço mínimo, estabelecido pelo governo com base no PAN (Plano Aeroviário Nacional).

A previsão é de que as propostas sejam abertas em novembro. Aeroportos que não receberem propostas nesta rodada permanecerão disponíveis, assim como novos lotes, que serão oferecidos em futuras etapas do AmpliAR.

Na opinião de Adalberto Febeliano, especialista em aviação civil, os esforços do governo são necessários, mas não suficientes. “É condição necessária, porque, se não tiver o aeroporto, você não pode voar. Mas não é suficiente, porque nada garante que, se tiver o aeroporto, você vai viabilizar o voo.”

Segundo ele, a aviação regional tem encolhido em várias partes do mundo, reflexo da redução no número de fabricantes e na falta de aviões pequenos, de 30 lugares. “A aviação ficou muito sofisticada”, afirma.

Febeliano diz que uma forma de fortalecer a aviação regional no país seria reduzir o nível de segurança exigido para voos de empresas do segmento, o que, consequentemente, reduziria custos, afirma.

“Isso é um problema danado. É muito difícil você dizer para as pessoas: ‘Você vai ter o voo, mas não vai ser um voo tão seguro quanto o das empresas comerciais [maiores].’ Isso deixa as pessoas muito contrariadas.”