MILÃO, ITÁLIA (FOLHAPRESS) – A Corte de Apelação de Roma decidiu que a deputada Carla Zambelli (PL-SP) deve esperar na prisão, em regime fechado, a tramitação do processo de sua extradição da Itália para o Brasil. A decisão foi comunicada nesta quinta (28) diretamente aos advogados.

No documento, ao qual a reportagem teve acesso, além de destacar o resultado da perícia médica indicada pelo tribunal, que concluiu que seu estado de saúde é compatível com o cárcere, os juízes justificam a manutenção da prisão pelo risco de nova fuga de Zambelli.

“O colégio [de juízes] entende que não se pode hoje acolher o pedido de liberdade formulado pela interessada [Zambelli], uma vez que a eventual aplicação de medida mais branda que a prisão preventiva não permitiria conter o perigo que a pessoa possa subtrair-se ao presente procedimento de extradição”, escreveram os juízes Patrizia Campolo, Marco Mancinetti e Fabrizio Suriano.

Os juízes argumentaram que a própria conduta da deputada antes de ser detida na Itália, no fim de julho, fornece elementos para a manutenção da prisão. Eles listam as “inúmeras declarações” de Zambelli sobre a “total falta de confiança no sistema judiciário brasileiro”.

“[As falas] demonstram inequivocamente a clara intenção da interessada de se eximir da Justiça brasileira e da execução da pena que lhe foi imposta”, diz o tribunal.

Também fazem referência a uma entrevista de Zambelli ao jornal italiano La Repubblica, horas antes de ser presa em Roma, no fim de julho, em que ela pede ao repórter para não publicar seu endereço e afirma que, depois de descoberta, deveria mudar de casa.

“É inquestionável que a conduta descrita, (…) longe de ser considerada insignificante ou irrelevante, constitui elemento específico e concreto para considerar a existência do mais alto nível do risco de fuga”, escreveram os juízes.

Eles também justificaram a decisão com o laudo médico que foi apresentado na audiência da última quarta-feira (27). Apesar de identificar doenças, quadro depressivo e greve de fome, a especialista concluiu que não há elementos que impedem Zambelli de continuar no presídio feminino de Rebibbia, em Roma.

“Suas necessidades terapêuticas podem ser todas atendidas dentro da estrutura de detenção”, diz o documento médico.

A decisão do tribunal contraria a defesa de Zambelli, que pedia sua transferência para a prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica, sob o argumento de que as condições de saúde da congressista eram incompatíveis com a cadeia.

O advogado Pieremilio Sammarco, que integra a equipe que defende Zambelli na Itália, disse que irá recorrer da decisão na Corte de Cassação, a última instância da Justiça italiana.

Para o advogado italiano Alessandro Gentiloni, que representa o Brasil, por meio da AGU (Advocacia-Geral da União), a decisão foi equilibrada. “Nada de diferente daquilo que esperávamos. É uma pessoa que deixou um país dizendo que não confiava na Justiça, que chegou a outro país para evitar a Justiça. Como não dizer que existe perigo de fuga? A corte simplesmente ligou os pontos”, disse à Folha.

Com essa etapa definida, a análise do pedido de extradição feito pelo governo brasileiro poderá iniciar de fato.

Nas próximas semanas, o Ministério Público de Roma deverá enviar um relatório em que se manifestará sobre o caso. Em seguida, a Corte de Apelação, equivalente à primeira instância, marcará uma audiência para discutir se existem ou não requisitos para que Zambelli seja enviada ao Brasil.

Estimada entre um e dois anos por especialistas, a tramitação pode ser mais célere com Zambelli na prisão. Segundo o advogado italiano Alessandro Gentiloni, que representa o Brasil nesse caso, a decisão da primeira instância pode sair até o fim de outubro.

Depois, eventuais recursos serão analisados pela Corte de Cassação, que, em se tratando de pessoa detida, pode levar entre três e quatro meses para decidir. Por fim, o governo italiano, após a decisão final da Justiça, tem 45 dias para dar a última palavra sobre a extradição.

Zambelli fugiu para a Itália para escapar da condenação de dez anos de prisão determinada pelo STF (Supremo Tribunal Federal). Ela foi acusada de participar da invasão do sistema do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) para emitir um mandado falso de prisão contra o ministro Alexandre de Moraes, do STF.

Sua defesa na Itália, para evitar a extradição, pretende demonstrar que o processo tem “anomalias”, como o fato de “a vítima do suposto crime ser a mesma pessoa que fez a sentença, que decidiu pela execução da sentença e que decidiu a apelação”, afirmou o advogado Pieremilio Sammarco. Zambelli se diz vítima de perseguição política no Brasil.

Na última sexta-feira (22), ela foi condenada pelo STF a outros cinco anos e três meses de prisão em regime semiaberto por outro caso, referente ao episódio em que sacou e apontou uma arma a um homem na véspera do segundo turno das eleições de 2022.